Quem pauta a agenda brasileira?
Independentemente do resultado da votação do salário mínimo, em meados de fevereiro de 2011, as centrais sindicais unidas conquistam vitórias políticas importantes neste início do governo Dilma.
Por um lado, a novidade política do Fórum das Centrais Sindicais se impõe pelo seu poder unitário, como parte destacada dos movimentos sociais brasileiros, a despeito dos prognósticos pessimistas que vaticinavam sombrio futuro de fragmentação do movimento sindical e dos trabalhadores. Essa tese foi em especial difundida quando da decisão do sindicalismo classista criar sua própria organização. À época, este campo afirmava ser fundamental a constituição de uma central classista para recuperar a unidade dos trabalhadores, unicamente possível a partir das centrais. Tal tese, dialeticamente vem se confirmando na prática.
Por outro, a partir dessa unidade, as Centrais vem seguidamente pautando a agenda com as suas bandeiras que, longe de representarem pauta específica e lateral, dialogam cada vez mais com os grandes debates sobre o presente e o futuro do Brasil. As Marchas Nacionais a Brasília prenunciaram tal fato. Porém, mais recentemente, foi a realização da Conferência Nacional da Classe Trabalhadora, havida em 2010, que preparou o cenário para esse fato transcendente que marca o início de 2011 e o governo Dilma: os Trabalhadores e as Trabalhadoras disputam a agenda do país.
“Na hora da sede você pensa em mim”
Muitos se assustaram quando viram a temperatura aumentar no debate entre centrais e governo. Primeiramente, observe-se que as expressões mais duras de tal embate não partiram das centrais sindicais. E, em segundo lugar, o que se deve ressaltar no debate foi a firmeza que tiveram as centrais ao afirmar o que não era possível ver pautado no debate nacional: que há graves problemas na política macroeconômica. E é esse o debate.
Essa é a maior vitória das centrais, pautar as agendas política e econômica. E a falta de capacidade de pautar a agenda que avulta nas movimentações do governo, que expressa indisfarçável tibieza ao tratar o PIG (Partido da Imprensa Golpista) e o setor financeiro, em contraponto à força com que arremete contra as centrais sindicais (“oportunistas”, fechando negociação, antecipando votações). Por mais força que demonstre nesta ou naquela votação, a força de um governo, sobretudo de um governo de mudança, reside na iniciativa de pautar a sua própria agenda política.
Se fosse fácil, não precisavam da gente
Mas é assim mesmo, e ainda é cedo para ser definitivo nas considerações. Afinal, os movimentos sociais aprenderam muito durante os dois mandatos de Lula, em especial a importância da dinâmica de unidade e luta quando deparados com um governo de composição heterogênea, cuja aliança vai desde os(as) trabalhadores(as) até o capital financeiro. Isto notabilizou a fórmula “governo em disputa”, muito importante quando do primeiro mandato de Lula, cujas medidas muitas vezes contraditórias fizeram muitos perderem a noção dos campos, por não entenderem que contraditória mesma era a composição política, ontem e hoje.
Longe de estimular o desespero e o desencanto de alguns que chegaram a – voluntária ou involuntariamente – servir à direita, esta percepção da disputa estimulou um profícuo aprendizado sobre a importância da agenda política. A crise de 2005 ensinou que era preciso saber defender o governo da Direita. O início de 2011 ensina que é preciso defender o governo da Direita, quando ela ataca, mas não devemos defender a direita no governo. Não nos assustemos com este ou aquele termo; é uma nova partida no campeonato e esse jogo está começando, apenas.
A Agenda da Classe Trabalhadora
Não à toa, o documento síntese da CONCLAT foi a Agenda da Classe Trabalhadora
(baixe aqui), uma das maiores conquistas nesse processo. Lá se evidencia o projeto nacional de desenvolvimento que queremos: soberano, democrático, com crescimento econômico e valorização do trabalho. A partir dessa convicção dada pela CONCLAT foi que as centrais cravaram um ponto no debate nacional, pondo em xeque os rumos da política econômica e o caminho do desenvolvimento brasileiro. CTB, CUT, Força Sindical, Nova Central e CGTB sustentam, na Agenda da Classe Trabalhadora:
“Além de um Estado forte, é preciso uma política de redução dos juros, do superávit primário e câmbio equilibrado, uma política macroeconômica que tenha como pressuposto o crescimento sustentado a um ritmo compatível com as potencialidades e necessidades do país, o pleno emprego e a distribuição mais justa da renda produzida pelo trabalho".
E defendem:
- Políticas monetária e fiscal compatíveis com metas sociais de crescimento econômico, valorização do trabalho e distribuição de renda;
- Reduzir as taxas de juros para diminuir o endividamento público e os seus encargos, estimulando os investimentos públicos e privados no desenvolvimento produtivo.
- Uma ampla reforma financeira, ampliando a oferta de crédito e redução do spread bancário;
- Política cambial orientada ao crescimento econômico e à geração de empregos.
- Democratizar o Conselho Monetário Nacional e o Comitê de Política Monetária, garantindo a representação dos trabalhadores e empregadores;
- Reduzir as metas de superávit primário (da União, Estados, DF, municípios e das empresas estatais) para ampliar a capacidade de investimentos em infraestrutura, em políticas sociais e serviços públicos de qualidade.
- Promover política adequada de “preços administrados”, evitando aumentos abusivos.
Como podemos observar, o salário mínimo é só a ponta do iceberg. Os trabalhadores anseiam por mudanças de relevo na política econômica. A parte do sistema financeiro é descabida, imensa e é essa a contradição central do Brasil há décadas. O povo merece uma fatia maior do bolo e deseja o desenvolvimento econômico. Daí a importância de destrinchar e tornar compreensível à maioria o que são esses tais “superávit primário”, “câmbio”, “regime de metas” e “taxa SELIC” que impõem tamanhos entraves à classe trabalhadora e ao desenvolvimento brasileiro.
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