Aversão à democracia no capitalismo europeu - Portal Vermelho
A razão da queda do valor das ações foi o anúncio feito pelo primeiro-ministro grego, George Papandreou, da convocação de um plebiscito para decidir sobre o novo pacote implícito no plano aprovado pelos líderes europeus, que prevê uma redução do valor da dívida externa do país associada a novas medidas de ajuste fiscal, que significam novos sacrifícios para a classe trabalhadora.
A possibilidade da consulta popular provocou pânico nos mercados e suscitou críticas virulentas de dirigentes políticos da Alemanha, França e outros países da região. É compreensível. A oposição dos trabalhadores e trabalhadoras da nação helênica aos ajustes impostos pela chamada troika (FMI, Banco Central Europeu e União Europeia) foi demonstrada nas seis greves gerais realizadas ao longo deste ano e é igualmente confirmada por diversas pesquisas de opinião.
Laboratório de horrores
A Grécia se transformou no laboratório de horrores do capitalismo europeu, ferozmente empenhado no desmantelamento do Estado de Bem Estar Social, que bem ou mal traduz relevantes conquistas arrancadas pela classe trabalhadora num momento histórico em que a correlação de forças era mais favorável e a existência do socialismo soviético induzia a burguesia a maiores concessões no interior das potências capitalistas.
A realidade mudou, a URSS já não existe e a era dourada do pós-guerra no velho continente cedeu lugar a uma fase de notória decadência, baixo crescimento, elevação da taxa de desemprego e perda da competitividade industrial, cenário agravado pela ascensão da China, acirramento da concorrência das economias emergentes e eclosão da crise mundial.
Guerra de classes
Neste novo cenário, a burguesia europeia resolveu declarar uma verdadeira guerra de classes contra o Estado de Bem Estar Social. A Grécia é o principal laboratório da nova estratégia, mas a ofensiva contra o trabalho ocorre em maior ou menor medida em toda a zona do euro, como revelam os pacotes antissociais adotados em Portugal, Espanha, Irlanda, Itália e muitos outros países.
Sob a batuta do incorrigível FMI, o governo grego impôs o caminho do retrocesso e semeou a recessão (que sacrifica a economia pelo quarto ano consecutivo), colhendo em troca uma taxa de desemprego superior a 16%, aumento da idade da aposentadoria, corte de salários, emprego e de direitos. Mas teve de enfrentar uma reação irada e firme do povo. Acossado, inclusive por integrantes do próprio partido (que se diz socialista), Papandreou decidiu convocar o plebiscito.
Tendência à reação
Muitos críticos consideram a medida tardia, uma vez que sacrifícios inaceitáveis já foram impostos goela abaixo do povo, sem qualquer consulta. O fato é que na reação dos mercados transparece a aversão do capitalismo europeu à democracia. O cálculo é simples: não se pode pretender que medidas antipopulares, subordinadas aos interesses do capital financeiro, sejam referendadas pelas massas trabalhadoras. As instituições da democracia burguesa servem apenas de fachada para impor o projeto do capital financeiro. É quase uma certeza que o novo pacote de maldades bolado pela troika não passa pelo plebiscito.
Daí a aversão atual do capitalismo europeu à consulta popular. O desmantelamento do Estado de Bem Estar Social não combina com democracia e conduz a classe dominante a posturas cada vez mais reacionárias. O imperialismo em crise tende irresistivelmente à reação no plano político. Era o que dizia Lênin. É o que se vê hoje. A história é mestre em reviravoltas, ironias e convulsões. Lembremos que em passado não tão distante a Europa já foi palco da experiência trágica do nazi-fascismo. A paz social e a democracia dependem, mais do que nunca, da ação e da luta decidida da classe trabalhadora.
Da Redação, Umberto Martins
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