Batista: Classe trabalhadora deve tomar consciência de sua força
Não foram poucos os avanços dos comunistas na área sindical em 2010. A consolidação e o crescimento da CTB, a realização de Conferência Nacional da Classe Trabalhadora e a intensa participação do PCdoB junto aos trabalhadores na luta pela eleição de Dilma Rousseff foram alguns dos fatos mais marcantes. Mas, para o secretário sindical do PCdoB, João Batista Lemos, é preciso ir além e, diante da nova realidade brasileira, fazer com que a classe desperte para o seu próprio poder transformador.Batista: classe trabalhadora precisa ter papel protagonista no processo de transformação
Segundo João Batista Lemos, os desafios serão grandes, mas extremamente importantes para fortalecer a luta dos trabalhadores brasileiros diante de um novo contexto econômico-social e com base nas novas características da classe. “Com o desenvolvimento do país e as inovações tecnológicas, está ocorrendo uma mudança muito rápida no perfil da classe trabalhadora, que hoje conta com mais jovens e mais mulheres. E isso não está ainda alterando as direções sindicais e sua forma de atuação”, diz.
Nesta entrevista, o dirigente fala sobre as vitórias e os revezes de 2010 e sobre o plano de ação para 2011. Confira.
Partido Vivo: Que avaliação você faz do trabalho sindical do PCdoB no ano de 2010?
João Batista Lemos: O balanço é positivo. Do ponto de vista político, tivemos influência decisiva na convocação da Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (Conclat), realizada em junho, e que reuniu quase 30 mil trabalhadores. Esta proposta foi feita pelos comunistas através da CTB. Durante a Conferência, foi construída uma plataforma, que chamamos de Agenda Nacional da Classe Trabalhadora, e que define um projeto nacional com base na soberania, na valorização do trabalho e na democracia. Seu conteúdo tem muita identidade com o Programa Socialista do PCdoB aprovado em seu último congresso e defende uma política macroeconômica voltada para o desenvolvimento interno e para a economia nacional, as reformas educacional, agrária, tributária, política, de democratização da mídia e o aprofundamento da democracia com o fortalecimento dos partidos. É uma agenda bastante atual, um instrumento do movimento sindical para lutar pelo êxito do governo Dilma Rousseff e fazer com que, durante sua gestão, seja posta em prática ao menos parte dessa agenda. É uma luta importante porque o governo Dilma também estará sob a pressão do mercado financeiro e a classe trabalhadora precisa ter papel protagonista nesse processo de transformação.
Partido Vivo: Mas há também algumas bandeiras prioritárias...
JBL: Sim, estamos trabalhando com cinco bandeiras que foram definidas pelas centrais para concentrarmos nossa ação: a luta pela redução da jornada de trabalho sem redução de salário; a reforma agrária com o fortalecimento da agricultura familiar, à agroindústria e à educação no campo; pelo fim do fator previdenciário – e neste caso, se for para buscar alguma negociação, tem que ser para ampliar e não para reduzir os direitos –; conquistar a valorização do salário mínimo por lei porque não existe ainda um mecanismo constitucional que garanta sua valorização e a aprovação da Convenção 158.
Outra questão que merece atenção é a da rotatividade no mercado de trabalho. O ano de 2011 será de muito emprego – há até quem fale em pleno emprego –, mas ao mesmo tempo em que é admitido 1,5 milhão de pessoas, praticamente o mesmo número é demitido. Ou seja, é preciso inibir essas demissões e fazer com que haja mais e melhores empregos. O ponto alto dessas lutas pode ser o 1º de Maio. Somada a essas bandeiras, devemos ainda lutar para mudar a política macro-econômica que deve estar voltada para o desenvolvimento interno com redução de juros, desvalorização e controle do câmbio.
Partido Vivo: E no que diz respeito à ação orgânica?
JBL: Do ponto de vista do partido, o ano de 2010 também foi importante em termos orgânicos: conseguimos construir várias frações de funcionários públicos, professores universitários, metalúrgicos, trabalhadores da construção civil, bancários etc. Mas, também tivemos um importante revés: a derrota no Sindicato dos Metroviários de São Paulo, que era dirigido pelos comunistas e pela CTB. Estamos tirando lições desse processo, mas desde já podemos levantar três questões principais que levaram a essa derrota. A primeira foi na condução política: não soubemos enfrentar o governo estadual que buscou renovar o quadro de funcionários com salários mais baixos; não conseguimos dar resposta a essa ação, nem assumir a demanda dos trabalhadores que ingressaram na empresa com salários rebaixados. Em segundo lugar, houve certo afastamento do sindicato com sua base: deixamos de fazer reuniões setoriais e debater as propostas do sindicato e não percebemos o processo de renovação da própria base. A terceira foi a subestimação do papel do coletivo: questões complexas deveriam passar pela fração do partido para serem debatidas; a fração não substitui a diretoria do sindicato, mas ela discute e poderia, assim, ter apontado rumos e colocado questões estratégicas da luta dos trabalhadores. Por outro lado, tivemos vitórias importantes nos Correios, com margem grande de diferença e outros sindicatos importantes vieram para a CTB. Vamos fechar 2010 como a terceira maior central sindical do Brasil.
Partido Vivo: E quais são as perspectivas para 2011?
JBL: Em nível partidário, estamos convocando um encontro nacional para o final de abril para discutir prática e concepção dos comunistas na frente sindical; precisamos dar uma sacudida no partido nessa área tanto do ponto de vista político como ideológico, elevar o nível de consciência dos nossos dirigentes sindicais e o seu compromisso ideológico com a luta da classe trabalhadora. Vamos fazer esse debate dentro de um quadro novo, examinando melhor o novo perfil da classe trabalhadora brasileira. Com o desenvolvimento do país e as inovações tecnológicas, está ocorrendo uma mudança muito rápida no perfil da classe trabalhadora, que hoje conta com mais jovens e mais mulheres. E isso não está ainda alterando as direções sindicais e sua forma de atuação.
Precisamos, portanto, debater como defender melhor os interesses dessa classe e ver qual linguagem devemos usar. Esse novo perfil cria um impacto nas estratégias sindicais e partidárias de relação com a classe.
Partido Vivo: Esse novo perfil dificulta a mobilização?
JBL: Dificulta na medida em resulta na desconcentração da classe trabalhadora. Por exemplo, o ABC, hoje, está mais esvaziado. A Ford de São Bernardo do Campo se desmembrou em duas ou três no Brasil. A Volks também; se há anos atrás ela tinha 42 mil trabalhadores numa mesma unidade, hoje deve ter 16 mil. Ou seja, houve deslocamento de muitos setores que, somado à desconcentração, dificulta a mobilização dos trabalhadores. O ABC Paulista ou mesmo a capital do estado não tem mais o peso relativo que tinha na década de 1980 e hoje há um grande crescimento no setor de serviços. Em 1980, quando a gente parava quatro empresas em São Bernardo do Campo, colocávamos 100 mil trabalhadores nas ruas. Hoje não.
Por outro lado, temos hoje uma classe trabalhadora mais bem informada; esses jovens vão para a universidade, usam a internet. Será que isso não vai ajudar na luta por sua emancipação? Eu acho que sim. O problema é como fazer essa classe social tomar consciência da força que ela tem. E isso é um processo. Assim como houve várias revoluções industriais e várias classes operárias foram surgindo e tomando consciência da sua exploração, acho que vamos ter, logo, uma classe mais informada, com um nível maior de escolaridade e uma juventude que pode também levar sua rebeldia para dentro da empresa porque o sujeito das transformações sociais é a classe trabalhadora. Essa classe deve ser chamada, pelo lugar que ocupa no processo de produção, a lutar de forma mais concreta pelo socialismo, por uma sociedade sem explorados e exploradores. O encontro servirá para aprimorarmos a atuação sindical dos comunistas. Outro ponto importante é o combate ao processo de burocratização e corporativismo comuns no movimento sindical.
Partido Vivo: E com relação à atuação dos comunistas na CTB?
JBL: A CTB é nosso centro, mas não é um projeto apenas dos comunistas. Por isso, estamos propondo três desafios. O primeiro é político e consiste em nos posicionarmos de forma combativa, correta e buscando o protagonismo nas lutas por essas bandeiras já mencionadas e pelo êxito do governo Dilma, mas mantendo independência de classe e autonomia. O segundo ponto é continuar fazendo com que a CTB cresça. Então, como secretário sindical do PCdoB, ressalto o papel das comissões sindicais nos estados, que devem ajudar as direções estaduais da CTB a se consolidar, a dar resposta às lutas locais, crescer e disputar hegemonia. Nesse sentido, a filiação é um desafio permanente. E a terceira questão é a formação: é preciso dedicar boa parte do orçamento da Central para formar seus dirigentes, elevando seu nível de consciência política, social e cultural, e construir um sistema de comunicação da CTB. Temos uma experiência muito positiva com os metalúrgicos de Caxias do Sul (RS). Lá, eles conseguiram criar um sistema de comunicação que possibilita ao sindicato falar com o trabalhador, mas também com a sociedade como um todo. E ainda não conseguimos isso com a CTB.
Em nível partidário, fizemos uma reunião com membros da Escola do PCdoB para estabelecermos uma semana de formação dos dirigentes sindicais comunistas, o que está sendo construído junto à Fundação Maurício Grabois. E também vamos ter um curso para os operários de base conforme seus locais de trabalho. Podemos, por exemplo, dar um curso para os operários comunistas da GM de São Caetano do Sul, do Estaleiro Brasfel em Angra dos Reis ou para os operários da Ford de Camaçari.
Partido Vivo: Há outras ações sendo planejadas?
JBL: Queremos começar a preparar o 1º de Maio com antecedência, talvez em março, fazendo debates sobre o dia e a luta dos trabalhadores, levantando as bandeiras, fazendo panfletagens, de maneira que o 1º de Maio seja o coroamento de toda uma série de atividades que eduquem e mobilizem a classe trabalhadora. Para o final de 2011, propusemos à CTB fazer um seminário para discutir a estrutura sindical no Brasil – a estrutura que temos e a que queremos – para darmos respostas a essa nova classe trabalhadora. A estrutura sindical no Brasil vem desde Getúlio, com a Consolidação das Leis Trabalhistas (1943); depois passou por uma mudança na Constituinte de 1988 e desde então, não se alterou mais, ou seja, é preciso atualizá-la. É importante ressaltar, por fim, que nossa preocupação é fazer com que os comunistas ajudem a fortalecer a CTB tendo a consciência de que ela é plural, tem sua própria institucionalidade, sua própria vida e que a atuação dos comunistas deve se dar através das defesa de nossas ideias no seio da Central .
De São Paulo,
Priscila Lobregatte
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