O ultimato, a ameaça, a estupidez e
arrogância visando acuar e render à presidenta da República da parte dos
setores dominantes conservadores e reacionários, a fim de imporem seus
sagrados interesses, a escalada do aventureirismo golpista são expressão
de que os donos do poder querem levar o país ao impasse político e ao
caos.
Por Renato Rabelo*
Ultimato à presidenta e golpismo oficializado
reafirmado na história recente do Brasil em dois plebiscitos. Mas a
trajetória desse processo representativo na nossa história republicana é
vincada muitas vezes pela incerteza e pelo abortamento do estabelecido
constitucionalmente.
Na redemocratização pós-regime ditatorial de 1964, a origem e sentido
dessa disputa política e classista para alcance da Presidência da
República não muda.
A tentativa de vitória das novas forças políticas, já ensaiada em 1989 –
quando a maioria dos setores dominantes conservadores se juntou para
barrar a vitória de Lula no segundo turno –, só foi possível alcançar 13
anos depois, em 2002.
E apesar do resultado insólito da vitória à Presidência de Lula,
representante das forças sociais populares em ascensão, note-se, que não
muda o DNA dessas forças conservadoras dominantes, que tudo fizeram
para Lula não ser eleito; sendo eleito impô-lo condições drásticas e
chegando ao governo da República instabilizá-lo, visando truncar seu
mandato.
Além do mais, de forma insólita, partindo de 2002, Lula e sua sucessora,
Dilma Rousseff, culminaram uma trajetória de quatro vitórias à
Presidência, expressão política de forças democráticas e populares, que
estão fora dos círculos de confiança da classe dominante conservadora,
seguidora das potências hegemônicas, imperialistas.
Então, para esta oligarquia predominante, diante de sucessivos reveses,
até aqui, é um resultado inaceitável e adverso aos seus interesses
fundamentais. No entanto essa situação vem acontecendo também,
considerando diferenças próprias de cada país, há mais de um decênio em
grande parte da America Latina e Caribe.
No Brasil a oposição não aceitou a quarta derrota de 2014. Desde então a
evolução do curso político tem sido marcada pela instabilidade, ameaça e
incerteza. O consórcio oposicionista coloca todas as suas garras de
fora, se aproveitando do entroncamento de uma crise mundial estrutural
do capitalismo, com maior impacto agora nos países emergentes,
interagindo com o fim do ciclo de desenvolvimento desses últimos 12 anos
no Brasil.
A evolução dessa situação objetiva, correlata com as dificuldades
políticas do governo Dilma e a incerteza e instabilidade causada pela
Operação Lava Jato em curso, tem resultado no agravamento da crise
política e econômica, transbordando para o plano social.
Apesar da breve trégua do mês de agosto, o consórcio oposicionista
relança a crise política, a qual atinge um patamar mais agudo e
extremado.
O estopim usado por essas forças conservadoras foi o envio por parte do
governo ao Congresso de um Orçamento com deficit para 2016. A senha foi a
retirada do grau de investimento do Brasil, pela agência de
classificação de risco S&P, a qual, sinteticamente, aponta que a
causa de tal procedimento é o risco fiscal e a incapacidade política do
governo de levar adiante o ajuste fiscal.
A fase constante do estado de golpe que vive o país passa agora para a
oficialização do rito e do processo a ser seguido pelo golpe. Com esse
fito é lançado no Salão Verde da Câmara dos Deputados um comitê
parlamentar do golpe já, autointitulado de “comitê pró-impeachment”.
Denotando o açodamento e o modo aventureiro desse empreendimento
inconsequente para os destinos da nação, essa peripécia, ressalte-se, é
uma exigência de impeachment já lançada, em busca de um pretexto. Sem
nenhum fato, ou base jurídica justificada na Constituição. O objetivo
mesmo é destituir a presidenta e eles ocuparem o poder central, o
“fundamento”, ora essa! Arranja-se. Sem nenhuma peça de valor jurídico,
vão se apoiar num pedido de impeachment elaborado por Helio Bicudo –
personagem há muito tempo movido pelo ânimo da vendeta.
Parte da oposição e setores dominantes que em agosto concediam uma
trégua à presidenta da República vão convergindo agora, com
pronunciamentos explícitos de alguns, para impor uma rendição à
presidenta Dilma: Editorial da Folha de São Paulo: dão um
“ultimato” e concedem uma “última chance” à presidenta, dando várias
ordens com “medidas extremas de cortes”, com radicalidade sem
precedentes, mesmo dos gastos compulsórios em saúde e educação. E
outros que afirmam ser preciso as perdas que virão e defendê-las perante
sua base política. Essa conta é da presidente, sua equipe e seu
partido, e não da oposição.
Assim, o ultimato, a ameaça, a estupidez e arrogância visando acuar e
render à presidenta da República da parte dos setores dominantes
conservadores e reacionários, a fim de imporem seus sagrados interesses,
a escalada do aventureirismo golpista são expressão de que os donos do
poder e seus quebra-facas querem levar o país ao impasse político, ao
clima de caos, não importando os destinos da nação. Tudo em proveito de
sua volta ao centro do poder.
Estamos diante do ápice de um ataque contra o Estado democrático de
direito e o mandato constitucional da presidenta da República. Exige
resposta decidida das forças democráticas e patrióticas, das
instituições, entidades e personalidades comprometidas com a preservação
e sustentação da democracia, numa ampla frente de resistência.
Apesar das dificuldades e limites políticos da presidenta e do seu
governo, inerentes ao extremado embate político e poderoso jogo de
pressões, confiamos que a presidenta Dilma, por sua trajetória, saberá
manter seu compromisso em defesa do povo, dos trabalhadores e da nação.
Às forças populares e de esquerda nesta hora é preciso distinguir de
onde vem a iminência do grande ataque. Não menosprezar a bicuda
investida das forças mais recalcitrantes que precisa ser execrada.
O diálogo e as propostas das forças populares em defesa dos direitos dos
trabalhadores e das massas populares devem ser mantidas e articuladas
para impulsionar a presidenta. Nesta hora, os reptos e as prédicas
voluntaristas, por mais bem intencionados que sejam, à esquerda,
resultam objetivamente em favorecer a carga do ataque da direita.
*Renato Rabelo é ex-presidente nacional do PCdoB
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