SIGA O COLETIVIZANDO!

Livro Kindle Textos de Combate - Venda Disponível

Textos de Combate: Sem perder a ternura, jamais - Paulo Vinícius da Silva - à Venda

O livro Textos de Combate: sem perder a ternura, jamais! já está disponível!Não precisa ter kindle, basta baixar o aplicativo ou entrar no c...

sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

#Feliz2022 - Onde a mente é livre do medo - Rabrindanath Tagore



 

 Onde a mente é livre de medo e a cabeça se mantém erguida
Onde o conhecimento é livre
Onde o mundo não foi retalhado em fragmentos
por estreitas paredes domésticas
Onde as palavras emergem das profundezas da verdade
Onde o esforço incansável estende os braços em direção à perfeição
Onde o claro rio da razão não perdeu o rumo
nas tristes areias desertas dos hábitos estagnados;
Onde a mente é impelida por ti
rumo ao pensamento e à ação cada vez mais amplos
Nesse paraíso de liberdade. Pai, permita que meu país desperte.

Rabrindanath Tagore 

#Feliz2022! CTB Bancários DF #ForaBolsonaro


 

#Feliz2022! Saúde!Muita Luta! #ForaBolsonaro #PovonoPoder


 

terça-feira, 28 de dezembro de 2021

PROFESSOR ROBSON CÂMARA LANÇA LIVRO NOVO: CONVERGÊNCIAS METODOLÓGICAS NA EDUCAÇÃO BÁSICA

 Olá, pessoal
Esperamos encontrá-los bem e curtindo o final de ano. Estamos divulgando o nosso último livro, chama-se Convergência metodológica na educação básica. Ficou curios@, então acesse o link e tenha maiores detalhes: https://pt.scribd.com/book/549075370/Convergencias-metodologicas-na-educacao-basica
Saudações
Robson Câmara
Dorisdey Rodrigues
Kattia Amin Athayde

 

Convergências metodológicas na Educação Básica, apresenta reflexões sobre os diferentes métodos vigentes na Educação Básica no Brasil. As análises e reflexões postas também consideram diferentes pontos de vista sobre o assunto, resultado de minucioso trabalho de pesquisa e investigação, e que permitem a análise de um leque de categorias educativas. Alguns dos temas analisados e discutidos ao longo da obra pelos autores são: a cultura digital, Educação de Jovens Adultos, e temas e que fazem parte da realidade do ensino atual do país como gestão escolar em e para direitos humanos, educação ambiental e o ensino remoto em tempos de pandemia.


 

Robson Câmara é Doutor em Sociologia pela UnB e Professor do GDF

Argentina - Cristina Kirchner mostra provas da perseguição de Macri aos sindicatos: queriam uma Gestapo

 No meu último Artigo Frente Ampla e Unidade Popular! descrevo como o fascismo é função do capital financeiro, do rentismo parasitário, primeiro, e do autoritarismo e da violência como consequência. Na irmã República Argentina, o fato se explicita ao finalmente se dar acesso a reunião gravada do Governo Macri, em que seus esbirros dizem claramente seu esquema de perseguição aos sindicatos, e queriam possuir uma Gestapo, diz-se-o descaradamente. E Fernanda Kirchner denuncia-o no twitter, ela que foi vítima de lawfare e perseguições, tal como Lula, Evo e Rafael Correa.

Ao final, vejam o vídeo com as falas infames

No pais que se tornou refúgio de nazistas, que teve uma ditadura fascista e genocida, cujos algozes e mandantes foram presos, avultam os vínculos naturais das finanças e do fascismo, sua identidade e a necessidade de varrer esta escumalha da política. Bom para tratar de nazista era mesmo o camarada Stalin e o povo soviético que salvou a Humanidade.

 

 







segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

"UnB 60 Anos" | Mesa solene de comemoração da assinatura da Lei de Criação da UnB

 “UnB 60 anos” – Comemoração da assinatura da Lei de Criação da UnB (15/12/1961 – 15/12/2021) e inauguração dos eventos de comemoração dos 60 anos da UnB 14h – 15h30 – Mesa solene de comemoração da assinatura da Lei de Criação da UnB 

Márcia Abrahao - Reitora 

Enrique Huelva - Vice-Reitor 

João Goulart Filho - Presidente do Instituto João Goulart 

José Ronaldo - Presidente da Fundar 

Nisia Trindade- Presidente da FIOCRUZ 

Bruna Brelaz - Presidenta da UNE 

Flávia Calé - Presidenta ANPG 

Representante da Comissão UnB 60 - José Geraldo de Souza JR 

Mediação: Decana Extensão Profa. Olgamir Amancia Ferreira

domingo, 26 de dezembro de 2021

Bravíssimo: Ricardo Guilherme - Nelson Rodrigues desnuda o complexo de vira-latas

 Saudades muitas de assistir o Ricardo Guilherme e seus monólogos hipnotizantes, de lavar a alma, de abrir os olhos, ele que - melhor que ninguém - verte Nelson Rodrigues e consegue extrair sua alma escrita para o palco. Esse trecho demonstra sua verve, brilho, e dá um átimo do grande ator brasileiro que meu conterrâneo é.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

Frente Ampla e Unidade Popular! Paulo Vinícius da Silva

 


 

 

 Óigame compay! No deje camino por coger la vereda!

De camino a vereda. Buena Vista Social Club 


Não serei o poeta de um mundo caduco
Também não cantarei o mundo futuro
Estou preso à vida e olho meus companheiros
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças
Entre eles, considero a enorme realidade
O presente é tão grande, não nos afastemos
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas

Mãos dadas. Carlos Drummond de Andrade

Avança a Frente Ampla e a Unidade Popular rumo às eleições de 2022. Um lume de esperança brilha sobre a Nação Brasileira, exausta, dessangrada, com o choro contido apesar de dois anos de morticínio incomparável, fruto da corrupção, da incúria, do genocídio premeditado do fascista que empalmou a Presidência, espalhando o luto, a miséria e a vergonha, entronizando os piores bandidos a destruir nosso país. Vemos escandalizados como não se poupam sequer as crianças, como o negacionismo, a sabotagem do país e a cara de pau não tem limites. Vemos a urgência de deter o arbítrio que invade nossas casas, ameaça nossas vidas. Isso precisa parar.

Diante de nós está a encruzilhada histórica: o aprofundamento da tragédia cotidiana, ou trilhar o caminho da libertação de nossa Nação, apequenada sob o tacão da Casa Grande, gentinha presente em nossa história, bem descrita por Darcy Ribeiro:

"Ou você leva a sério que esse povo é pra ser alfabetizado, que o que vale é criança e povo, ou você assume a atitude sacana da classe dominante, que sempre achou que o povo é espécie de negro escravo, de carvão pra queimar, e não importa o que acontece com ele. Essa é a postura do brasileiro comum, uma postura perversa e pervertida. Eu vi o mundo inteiro, eu andei no exílio anos e anos... não há lugar melhor para fazer um país do que esse. Mas tem uma classe dominante ruim, ranzinza, azeda, medíocre, cobiçosa, que não deixa o país ir para a frente."

Assim, nossa batalha é precisamente isolar este núcleo, a extrema direita fascista a serviço do capital financeiro, rentista, parasitário e apátrida, de mãos dadas com o genocídio. O central é impedir que ela coopte quaisquer setores sociais. Por isso, precisamos diferenciar o fascismo do centro, de liberais, e mesmo de conservadores. A disputa da hegemonia na sociedade é precisamente essa, e a generalização do rótulo fascista ajuda apenas ao fascismo, um desserviço que junta ignorância e mentira. Ao final, apela a um moralismo demagógico, herança da UDN, e ao complexo de vira-latas, e ambos nos impedem de entender o momento atual, a ascensão da extrema direita no Brasil e mundo afora. É o caminho para a deserção, o pessimismo, a falta de horizonte. Sob um moralismo de quinta e um pessimismo desmobilizador, é como se já tivéssemos perdido antes mesmo de ter tentado. Esconjuro, pé-de-pato, mangalô, três vezes: quem não acreditar em si, em nosso país, já foi derrotado.

Por isso, cabe pedir ajuda à História, reconhecer a complexidade de nosso país e abrir mão de ilusórias mudanças milagrosas, compreender o papel do indivíduo e dos líderes na História, entender o papel do povo, das alianças e da transição que queremos, de sentido progressista, reparador. Também cabe ouvir os que enfrentaram e venceram o fascismo, para ver o bicho do tamanho que ele é.

Assim, sem coesionar a Unidade Popular não lograremos a Frente Ampla. Esta é uma responsabilidade incontornável, formar e conduzir a Frente Ampla, única saída. Ainda bem, que ela vai se constituindo ao redor do ex-Presidente Lula. O problema não é Alckmin na vice-Presidência, como expressão dessa amplitude. O problema mais exasperante é a fragmentação do campo popular, a incapacidade de mobilizar o povo para assegurar um veto de massas e de classe à natureza de escorpião das elites e de seus pactos pelo alto. O problema é abrirmos mão do protagonismo necessário para cumprir as tarefas de quem quiser assumir o governo e bem governar, para desmontar a granada posta no bolso da Nação Brasileira.

Dimitrov, líder operário búlgaro, é um destes heróis que enfrentaram e venceram o fascismo. Preso na Alemanha Nazista, acusado do incêndio do Reichstag - o edifício do parlamento alemão - provocado pelos próprios nazistas, travou uma batalha épica nos tribunais e - assim como Lula - sagrou-se vitorioso improvável daquele embate. No tribunal, peitou Goering e Goebbels e venceu. Livre e na URSS, apresentou o Informe "A luta pela unidade da classe operária contra o fascismo" no decisivo VII Congresso Mundial da Internacional Comunista, em 2 de agosto de 1935, momento definidor da tática que virou o jogo, a linha central da resistência, que principiou por definir corretamente o fenômeno do fascismo, pois só assim foi possível tomar as medidas justas e necessárias à sua derrota.

A definição ilumina-nos até hoje: 

"O fascismo no Poder (...) é a ditadura terrorista descarada dos elementos mais reacionários, mais chauvinistas e mais imperialistas do capital financeiro." E ainda: "O fascismo é o Poder do próprio capital financeiro. (...) É preciso salientar de modo especial este caráter verdadeiro do fascismo porque a dissimulação da demagogia social deu ao fascismo, numa série de países, a possibilidade de arrastar consigo as massas da pequena burguesia desajustadas pela crise, e até alguns setores das camadas mais atrasadas do proletariado que jamais seguiriam o fascismo se tivessem compreendido seu verdadeiro caráter de classe, sua verdadeira natureza."

Essa caracterização originou a Frente Única contra o fascismo - ainda maior que a Frente Ampla que defendemos hoje. Sua precisão é surpreendente ainda, cabe a carapuça perfeitamente sobre a cabeça de Bolsonaro e sua quadrilha, assim como dos fios que os conduzem, e que vêm da classe dominante. Falta levar a sério a ascensão renovada do fascismo e assumir as atitudes acertadas para enfrentar tamanho perigo, e nisso reside o sentido vanguardista da política do PCdoB, corolário de seu Centenário e prova de sua vitalidade e das lições da História. Assim, é útil ver como se enfrentou o fascismo a partir daqueles que o enterraram.

Primeiro, buscaram a unificação do campo tão conflagrado dos trabalhadores, dando as mãos a social-democracia, esquerdistas, católicos e comunistas. Com esse primeiro passo, foi além, e uniu muito mais: Stalin, Churchill,  Roosevelt e Truman; De Gaulle e Maurice Thorez; Chiang Kai Shek e Mao Zedong; Getúlio Vargas e Prestes. Por todo o mundo podemos citar expressões dessa diferença fundamental que se afirmou para isolar com trincheiras a escumalha fascista a ser isolada e batida. A ameaça foi enfrentada por comunistas, socialistas, conservadores e liberais, unidos para escantear os que precisavam ser varridos da política, e efetivamente o foram, graças ao gênio e à energia que Stalin empreendeu nessa grande aliança que a URSS dirigiu, em nome da humanidade, contra a barbárie nazifascista, e que a enterrou bem fundo até o presente século, quando ressurgiu para espanto universal. 

Assim, quem caracteriza de fascistas - a torto e a direito - os adversários que se acercam, presta um tributo à extrema direita, e acaba pulando o cercado. Não à toa, ao trotsquismo e ao anarquismo na Guerra Civil Espanhola foi colada a definição do general fascista Queipo de Llano: "quinta-coluna". Às portas da Madri Republicana, suas quatro colunas militares preparavam-se para disseminar a morte, quando ele disse: "A quinta-coluna está esperando para saudar-nos dentro da cidade", e referia-se àqueles que estão sempre tão à esquerda que perfazem os 180 graus do círculo, passando ao serviço da direita.

Mas não é a única confusão perigosa. Ter aliados é saber-lhes o papel limitado, que precisa ser compreendido; nem menosprezado, nem superestimado. Na Revolução de 1930, ficou célebre o erro de ter considerado o movimento liderado por Vargas como "coisa de burguês". Em 1954, nossa postura  oposicionista em face da esfinge Vargas, levou a população a empastelar os jornais burgueses e também a Classe Operária, quando Getúlio deixou a Carta Testamento e a vida para entrar na História. Em 1964, a excessiva confiança no dispositivo militar de Jango e no Caminho Pacífico defendido pela URSS, acabaram por deixar-nos desarmados diante da Ditadura que infelicitou o país por 21 anos. Em 2016, não ia haver Golpe, não houve a articulação política, muito menos a confiança em nós mesmos, nem a mobilização necessária para deter o impeachment, falava-se inclusive em "cair de pé", como se houvesse virtude em termos sido atropelados pela Guerra Híbrida.

Podemos errar, é preciso sabê-lo. Mas erro garantido é juntar no mesmo saco fascistas, conservadores, liberais, as forças de centro, interesses regionais, setores minoritários das classes dominantes e toda a imprensa. Igualmente, errado é não perceber a necessidade de sermos construtores da unidade popular e do isolamento do fascismo e do rentismo parasitário e antinacional, dissociando esses deveres da sensível e ainda indefinida constituição das federações que propusemos.

O fascismo não é um fenômeno cuja origem se situe no plano das ideias conservadoras, apenas. Na verdade, o fascismo tem uma cabeça e duas pernas, pelo menos. A cabeça, a alma, o coração é o capital financeiro na época do imperialismo. Sua relevância é função do capital financeiro, figuras como Bolsonaro funcionam como cão raivoso a serviço do rentismo parasitário que domina o capitalismo e está no ápice da pirâmide de classes no Brasil do genocídio. As pernas que sustentam o fascismo são a propaganda e a violência.

O imperialismo é a era dos monopólios e oligopólios do capital financeiro. Seu poder absoluto busca prescindir da economia real, da produção e mesmo do consumo, elevando-se à estratosfera a bolha especulativa que reproduz o capital através de D->D', dinheiro gerando dinheiro, sem passar pela produção, com as "inovações" financeiras cuja "exuberância" é feita de uma volatilidade maior que o ar, cheia de nada. 

O fascismo ressurge e prospera porque é bem pago pelos 1% de semideuses que detém mais riquezas que os 99% de todos nós, pobres mortais. Esse poder sem medida que as finanças exercem sobre o capitalismo se expressa nas crises, pela necessidade do mesmo autoritarismo se impor na vida política, deixando para trás mediações que faziam sentido no passado. Isolar o fascismo é, portanto, o modo mais importante de combater essa camada cuja existência é o martírio de bilhões de seres humanos. Explorar as contradições existentes nos 99% é um dever cuja dimensão palmilhamos, contando nossos mortos e a destruição havida a partir da vitória de Bolsonaro. 

Portanto, o fascismo não é fascista porque conservador. Sua demagogia conservadora é bem paga. O autoritarismo ditatorial fascista, que Bolsonaro encarna à perfeição, é a expressão do poder que a ditadura do capital financeiro rentista e parasitário exerce no capitalismo, que não é uma sociedade "de mercado", mas sim o sistema que mata o mercado e abre caminho ao poder absoluto dos oligopólios. E se os líderes fascistas encarnam esse autoritarismo, é em função de serem os mamulengos dos verdadeiros senhores, de seu desprezo pela Vida, a Democracia, a Nação, a Natureza e a Ciência. Expressam o governo oculto, do capital financeiro, para quem nada importa, exceto a inclemente valorização e concentração do capital.

Tampouco o fascismo é um fenômeno racional, como não é racional a atitude "superior" do rancor, de quem humilha quem votou mal na eleição de 2018, esquecendo que isso o incentiva a votar mal na eleição de 2022.  É importante perceber, o fascismo foi também fruto do avanço da comunicação de massas e da indústria cultural no século XX, que permitiu se impusessem os pincípios da mentira de Goebbels, cujo gênio do mal apropriou cinema, rádio, discurso, estética, psicologia de massas, arquitetura, demonstrações monumentais, repressão e vigilância, para dar autoridade às mentiras, crueldades e insanidades que mesmerizaram as multidões que empunharam as armas e seguiram confiantes para o abismo.

Hoje, se dinheiro não falta, tampouco podemos negar o peso dos instrumentos das 3a. e 4a. Revoluções Tecnológicas. É um erro crasso tornar o fascismo um adjetivo de uso individual e indiscriminado, considerá-lo a partir de uma superioridade moral ilusória, ignorar o contexto de quem é enganado,  atribuindo-o a desvios de caráter ou a opiniões conservadoras deste ou daquela. Isso já foi percebido no passado pelo líder comunista italiano Palmiro Togliatti, que ensinou ser indispensável separar as "massas que estão inscritas nas organizações fascistas, social-democratas, católicas" das organizações respectivas: (...) as massas que aderem a elas não são nossos adversários, são massas de trabalhadores que devemos fazer todos os esforços para conquistar." E tantos acham que agem bem, ao humilhar quem deveriam ouvir e acolher, reproduzindo a própria lógica das redes sociais que engendrou os que chama de fascistas, reproduzindo a mesma prática, contentes na nossa bolha.

O contexto atual é muito mais complicado, a mentira e a verdade, como na fábula, vestem roupas que não permitem sabê-las de relance. Em vez da reflexão moral, filosófica ou racional mesmo, temos outros fenômenos que determinam a submissão às ideias toscas e vis que tem nos derrotado. Recentemente o gabinete do ódio fez uma seleção dos "melhores momentos" das disputas e declarações que no passado dividiram a esquerda e Alckmin, e vimos uma parcela combativa e ingênua dos nossos eleitores se somar aos robôs, engolindo a farsa, usando os vídeos selecionados pelos inimigos para argumentarem a favor da "pureza" nas alianças, que é a demonização da política, do mesmo modo como o lavajatismo - a corrupção da luta contra a corrupção - enganou muita gente progressista.

Em nossa época, a internet, os smartphones, avatares, a vida paralela das redes sociais tornaram "naturais" hábitos tão saudáveis quanto ir ao vaso sanitário munido de premência, gravador, câmera, GPS e computador. É a mesma universalidade do poder da orgia financeira que nos escraviza com juros gigantescos, que pagamos sem ver, dos algoritmos e do big data. Cada clique, cada escolha, cada opção é reunida em padrões que mapeiam muito mais que as ideias racionalmente formuladas. As esferas do desejo, da culpa, das pulsões e adicções, da vergonha e do medo, são a faixa preferencial que visa a calar a racionalidade. A propaganda fascista vai fundo na alma, naqueles lugares recônditos, inconfessáveis, aonde a mentira e a verdade são difíceis de distinguir, sob novas necessidades criadas, segundo aquilo que nos dói, que tememos, que cala a razão e refaz a ação como ódio e medo, numa escala jamais vista.

Desse modo, a cabeça que paga são as finanças, que têm o pé direito da propaganda que a apoia, e  alimenta de informação eficaz a máquina de alienação que retira a força, a consciência de si e o próprio uso da razão, porque opera naquelas vibrações mais sinistras da psique individual e social. E o pé esquerdo é a arma de fogo, a agressividade, a destruição das famílias, das amizades, e por fim, o ato homicida que visa a impedir a política, o diálogo, dividir a Nação, para melhor sermos submetidos, para esquecermos quem somos, para sermos nossos próprios e inconciliáveis inimigos. 

Nessa tônica, até mesmo o proletariado universal, negro, mulher, LGBTQIA+, é pulverizado e há a impossibilidade de comunicar-nos, de entender-nos, de unir-nos, mesmo que sejamos o mesmo povo, a mesma classe, que partilhemos do mesmo passado, presente e futuro. Podemos estar todos divididos em nossas cabeças, unidos apenas pelo desemprego, pela precarização, pelo medo, pela solidão que impede a solidariedade. Nessa distopia, pereceremos todos.

É essa capacidade  de mentir e enganar que dá tanto o poder de massas como as armas de que se utiliza o fascismo para o exercício da violência física e simbólica, o terror. O sentido de manada a trotar para o abismo, esconde-se atrás do medo, do ódio e da atomização, que espalha a descrença, o desânimo, a solidão e as neuroses, a ideologia de que a saída é individual, de que a verdade não existe, que a natureza humana seria a guerra, o pânico, todos contra todos. O indivíduo, surgido do trabalho, da solidariedade, do coletivo, seria a única realidade, e não entendemos porque a infelicidade é a regra. Diariamente, somos inoculados da consciência das classes dominantes reais - os 1%. Sua perspectiva se retrata fielmente nas séries e filmes que dizem que o futuro será de apenas 1% de seres humanos que sobraram, que têm de atirar na cabeça de 99% de zumbis para sobreviver a um apocalipse incontornável. 

E contra tudo isso, o fato mais exuberante é a decisão de nosso povo se unir, expressa nas intenções de voto no ex-Presidente Lula. Precisamos ouvir esse clamor que vence barreiras tão grandes contra as quais nos debatemos mal e mal. Precisamos pesar as divisões de nosso passado, como nos custaram, e compreender o papel da unidade da Nação Brasileira, da Esquerda, dos Patriotas, em tempos de guerras híbridas cuja máxima de dividir para reinar jamais esteve tão atual. 

A falha de toda opressão que se quer eterna, é a vida sofrida, que leva à consciência que se liberta. Mas esse é um momento fugidio. As poderosas armas de manipulação da burguesia trabalham dia e noite para matar no berço toda consciência de classe para si, a busca do povo brasileiro por uma saída do pesadelo que vivemos. No Chile, a campanha vitoriosa de Boric não hesitou em receber o apoio da Concertación, mas tampouco se deteve nos acordos políticos ou nas redes sociais. Foi de casa em casa, 1,2 milhão de lares, para falar olhos nos olhos com o povo chileno. E nós? Vamos ao povo? Para ouvi-lo e dialogar, ou para criticá-lo quando mostre sua fragilidade diante do discurso dominante?

A luta contra o nazi-fascismo na Segunda Guerra Mundial foi vitoriosa pela acertada tática vocalizada por Dimitrov: por um lado, unir o povo e, por outro, ir além de nós mesmos para isolar o fascismo, seguindo as lições leninistas de dividir os adversários e unificar o próprio campo. Do mesmo modo, os desafios se situam no tempo. Eleger Lula é essencial, mas nem de longe esgota os desafios que enfrentaremos para salvar o Brasil. A cada dia a sua agonia.

O PCdoB levantou a a bandeira da Frente Ampla, e o caminho das federações é a evidência do papel destacado que ocupa na cena política, em meio à encruzilhada histórica. Que Lula se utilize de cada brecha no campo adversário é exatamente o que pedimos desde antes do Golpe. Militar pela unidade da esquerda é preciso para assegurar sentido progressista à Frente Ampla. Nos estertores de 2021, é benfazeja a onda de otimismo, esperança, mas não podemos ter salto alto, nem ilusões, e nosso dever é semear caminhos de unidade que desafiem o ceticismo e a desconfiança, plantando um 2022 feliz, feito de vitória, de combate, de defesa do conquistado, de afirmação do Brasil, de sua Independência bicentenária e frustrada tantas vezes. O PCdoB cresce é na grande política, nos grandes embates, sendo protagonistas das grandes lutas. Foi essa alma guerrilheira que fez João Amazonas propor a Frente Brasil Popular quando nem o PT a entendia. Temos de nos afirmar no mar aberto para sermos maiores e mais fortes no novo século de nossa existência que inicia em 2022. Não deixemos a avenida da História para percorrer a vereda das batalhas menores, quando diante de nós está a Encruzilhada Histórica.

Em águas caudalosas de povo brasileiro devemos nos banhar para honrar o Centenário do Partido Comunista do Brasil e assegurar o nosso futuro. O rio caminha para o mar, e precisamos nos posicionar no fluxo central da mudança, da resistência, da vitória. Olhar nossa história de dolorosas divisões, ansiar pelas oportunidades e encruzilhadas que mudarão tudo. Entender o caminho para a derrota do fascismo, para resgatar o Brasil, para honrar mártires e vítimas, para vencer a força da grana, da mentira e da violência. Esse caminho construído, de verde amarelo e foice e martelo, dele não devemos nos afastar. Unidos e mobilizados, sem nos isolar, pensando nos grandes interesses de nossa gente, é assim que se afirmará nossa relevância histórica. Não nos perderemos, não nos confundiremos, mas havemos de forjar nas duras lutas de 2022 a sólida unidade necessária para resgatar o Brasil. É possível derrotar o fascismo e avançar, certamente com Lula, com Frente Ampla e Unidade Popular!

Leia também:

Frente Ampla e Unidade Popular. (1)

 Frente Ampla e Unidade Popular. (2)

quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

PV aprova federação com PSB, PCdoB e PT e amplia frente contra Bolsonaro


Para José Luiz Penna, dirigente do PV, a federação sinaliza uma frente democrática contra Bolsonaro.

 
José Luiz Penna, dirigente do Partido Verde

Os diretórios estaduais do Partido Verde se reuniram, nesta segunda (20), e concordaram sobre a formação da federação partidária com PCdoB, PSB e PT.

O presidente do PV, José Luiz Penna, também sinalizou à Folha de S. Paulo, após a reunião, um apoio à candidatura do ex-presidente Lula, considerado por ele o candidato mais viável deste campo partidário.

O presidente do PV também comentou a aproximação de Lula e Geraldo Alckmin (sem partido) consolidada no jantar do último domingo (19), em São Paulo. Para ele, é um sinal de que a candidatura desse grupo político que formar a federação é por uma frente democrática e não só do PT.“É um sinal muito positivo porque não é uma candidatura do PT, é de uma frente democrática como a gente sempre idealizou. É um engano achar que essa eleição vai ser um passeio, uma coisa fácil. Temos que criar um contingente grande de partido para derrotar essa ameaça autoritária”, disse Penna à Folha.

“É hora de unirmos quadro contra este governo que arrasa o país. A Gleisi se mostra muito favorável, com certeza marcharemos juntos”, diz ele, na semana passada, quando se discutia o assunto.

Penna também contou que se reuniu na quinta (16) com o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). O objetivo é tentar atrair uma Rede para a federação e aumentar ainda mais o grupo de partidos.No artigo “Uma escolha nada difícil“, no site oficial do PV, o secretário de Mobilização Nacional e Presidente do PV/RS, Márcio Souza da Silva, defendeu a aproximação com a “esquerda tradicional” para combater o que ele considera “um novo modelo de ditadura institucional”, com Bolsonaro.

Seu argumento principal é a defesa da democracia e a necessidade do PV não errar na estratégia num momento crucial em que “a democracia involuiu, a população mais carente ficou ainda mais pobre, direitos civis, sociais inacessíveis e trabalhistas foram suprimidos e a democracia cambaleou, bem como os índios, mulheres e minorias foram atacados e marginalizados”.

Para ele, não há outra saída para o PV, já que qualquer terceira via estaria inviabilizada, segundo observa ele. Para ele, há o risco do PV ficar como colaboracionista, em vez de resistência a “esse arremedo de ditadura da imbecilidade, da irracionalidade, do terraplanismo”.

Segundo o TSE, o PV conta com 361.452 eleitores filiados. O partido nasceu na década de 1980 baseado nas tendências ambientalistas.

domingo, 19 de dezembro de 2021

Comunista inclusive paga promessa, que nem o Diógenes Arruda - Veja a entrevista

 

Por um Natal de Jesus, sem fome.

 Precisamos ter um Natal de solidariedade e de respeito por tanta dor que nosso povo tem passado, precisamos nos engajar numa grande corrente de amor, caridade e união pelo Brasil que padece de fome, desemprego, dor e tristeza.

Aonde a gente estiver, vamos estimular uma onda de solidariedade acolha aquele menino na manjedoura, de pais migrantes, perseguidos, e que tão bem representa esse momento terrível no nosso país, tantas casas com a saudade dos seus, tanta gente sem casa, sem emprego, com fome. 

Essa sim é a atitude de um Natal Comunista, e nela, todas as fés e os ateus se unem, como dizia Ary dos Santos: 

"À voz de anticomunista

o patrão surgiu de novo

e com a miséria à vista

tentou dividir o povo.


E falou à multidão

tal como estava previsto

usando sem ter razão

a falsa ideia de Cristo.


Pois quando o povo é cristão

também luta a nosso lado

nós repartimos o pão

não temos o pão guardado."




sábado, 18 de dezembro de 2021

PCdoB lança João Vicente Goulart e Ana Prestes Pré-candidatos ao GDF e ao Senado - PCdoB DF







O Comitê Regional do Partido Comunista do Brasil do Distrito Federal, reunido de forma virtual neste sábado (18/12), decidiu promover o lançamento do nome de seu atual presidente, João Vicente Goulart, como pré-candidato ao governo do DF; e o nome de sua dirigente Ana Prestes, como pré-candidata ao Senado Federal.


João Vicente foi candidato a Presidente da República em 2018, já exerceu o mandato de deputado estadual pelo PDT do Rio Grande do Sul, é filósofo e escritor, filho do ex-presidente João Goulart, último presidente constitucional antes do golpe de 1964, e ex-vice-presidente da gestão JK, que construiu Brasília.

Ana Prestes é cientista política, professora universitária, ex-secretária de Educação de Contagem-MG e neta do comunista histórico, Luís Carlos Prestes.

Segundo a decisão do partido, “os nomes apresentados, além de larga experiência política, inclusive administrativa, e representam a união do trabalhismo histórico e da luta dos comunistas no Brasil que deram muitas e reconhecidas contribuições ao desenvolvimento econômico e social do país”.

O PCdoB assinala, ainda, que “o lançamento dos nomes de João Vicente Goulart e Ana Prestes representa uma contribuição à construção de uma ampla frente eleitoral em Brasília que seja capaz de enfrentar e derrotar a tragédia bolsonarista no Distrito Federal, sempre em busca de uma forte aliança com as forças progressistas locais que tem compromisso com a democracia e um programa desenvolvimentista e socialmente justo, voltado para toda a nossa população”.

PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL - Distrito Federal








João Batista Franco Drummond, meu professor - ACQ - Antônio Carlos Queiroz

 João Batista Franco Drummond, meu professor

A última vez que estive com o Drummond foi no final de novembro daquele ano terrível, 1976, em Anápolis, Goiás, onde eu morava. Ele havia me encarregado de acompanhar, através do jornal O Popular, de Goiânia, os resultados das eleições municipais realizadas no dia 15.

Por Antônio Carlos Queiroz*

Naquela época, a apuração dos votos, manual, levava dias. Quarenta anos depois, ainda me lembro que estávamos eufóricos. Mesmo com as restrições da Lei Falcão à propaganda eleitoral, que permitia só a divulgação do nome, partido, número, currículo e foto do candidato na televisão, o MDB de Goiás havia eleito um número razoável de prefeitos, seguindo a tendência nacional de avanços significativos do voto de protesto contra a ditadura nas médias e grandes cidades do País.

Nas eleições legislativas de dois anos antes, o PCdoB havia pregado o voto nulo, sem perceber que o fim do “milagre econômico” iria solapar as bases da ditadura. Com os ventos virados, em 1974 a oposição conquistou 16 das 22 vagas em disputa para o Senado, e 161 das 364 (44%) das cadeiras da Câmara dos Deputados. Correndo o risco de perder o controle de sua abertura “lenta, gradual e segura”, o general Ernesto Geisel tomaria providências logo no início do ano seguinte, fechando o Congresso Nacional e decretando o Pacote de Abril, com a determinação de que um terço dos senadores deixariam de ser eleitos, passando a ser indicados pelo general-presidente de plantão. Estava criada a figura do “senador biônico”. Nessa conjuntura, o PCdoB fez ajustes em sua tática e, no começo daquele ano, lançou a “Mensagem aos Brasileiros”, o famoso “documento das três bandeiras”, que conclamava o povo à luta em favor da anistia ampla, geral e irrestrita, da abolição de todos os atos e leis de exceções, e da convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte Livre e Soberana. Desde então o partido passou a apoiar os candidatos do MDB mais aguerridos no combate à ditadura.

O primeiro encontro – No final de 1976, com 20 anos, eu já havia concluído o curso científico, mas em vez de ir para uma faculdade, havia me casado, e meu primeiro filho tinha acabado de nascer. Trabalhava na Fundação Educacional de Anápolis, onde calculava a folha de pagamento das professoras e merendeiras da rede pública, dava aulas de francês na escola de idiomas Yázigi, e era vendedor do jornal Movimento, um semanário de combate ao regime militar, que tinha em seu conselho editorial intelectuais de várias tendências políticas, entre os quais, o deputado Alencar Furtado, do grupo autêntico do MDB, o sociólogo Fernando Henrique Cardoso, e o cantor Chico Buarque. Eu também era um dos organizadores do MDB Jovem de Anápolis. O Drummond, cujo nome de guerra para nós era Osvaldo, me fora apresentado uns dois anos antes por um militante da Ação Popular, Adelite Moreira dos Santos, funcionário do Banco do Brasil e ativo sindicalista. Um dia o Adelite nos chamou, a mim e a outro amigo e colega de trabalho de Anápolis, o Tauny Mendes, e nos disse que havia sido procurado por um contato do PCdoB, encarregado de organizar o partido em nossa cidade. Perguntou se topávamos conversar com ele. Topamos. A partir daí nossos encontros se tornaram frequentes.

Algumas de nossas reuniões tinham um ar bucólico e romântico. Num determinado sábado ou domingo, a gente comprava sanduíches e refrigerantes e íamos para debaixo da ponte de algum rio nas redondezas da cidade para discutir a conjuntura nacional, ler manifestos, denúncias de torturas ou capítulos de algum livro. Ali na beira da água era como se estivéssemos fazendo um piquenique. Mais de uma vez fomos parar embaixo da ponte do rio Corumbá, entre Abadiânia e Alexânia, na BR—060, a caminho de Brasília.

Volta e meia, o Drummond nos perguntava se tínhamos alguma notícia do Araguaia. É que um comerciante amigo nosso tinha parentes e negócios em Imperatriz, no Maranhão, e sempre nos relatava os comentários que corriam entre o povo da região do Bico do Papagaio sobre a guerrilha, dizimada em 1975. A maior parte das histórias aludiam à brutalidade dos militares, à coragem do Osvaldão ou às façanhas da Dina, dois dos guerrilheiros que se tornaram mitos.

O espírito e o corpo – Quando conheci o Drummond, eu já estava escolado em política, apesar de nunca ter participado do movimento estudantil, virtualmente banido de Anápolis, ainda mais depois que a cidade fora declarada, em 1973, “área de segurança nacional”, alegadamente por causa da implantação da Base Aérea dos Mirages, mas é claro que o motivo real foi a tradicional força oposicionista da cidade. José Batista Júnior, sucessor do prefeito Henrique Santillo, do MDB, teve o seu mandato cassado.

Eu também já transitava no existencialismo de Jean-Paul Sartre, graças às conversas que tinha com uma grande amiga, a Maura Helena de Oliveira Simões, uma brilhante socióloga formada na extinta Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro, meio incapacitada por causa dos surtos psicóticos que sofria. Uma vez Maura me convidou para um encontro a ser realizado no auditório da clínica de seu psiquiatra, o Dr. Neiron de Souza e Silva. Lá chegando, encontrei uma roda formada por uma dúzia de médicos aguardando a palestra de um professor francês, em francês mesmo, sem tradução simultânea. O cara era especialista na fenomenologia de Edmund Husserl. Devo ter ficado perplexo, mas, para quem andava lendo Os Caminhos da Liberdade e O Ser e o Nada do Sartre, a matéria não devia ser de todo estranha.

A essa altura, há muito havia perdido a fé, depois de receber sólida formação católica na escola primária e no ginásio, sob a direção de freiras e padres franciscanos. O engraçado é que me convenci do materialismo (sem ainda ter estudado as piruetas da dialética hegeliana nem a operação ortopédica que dela fez o Marx) não porque tivesse tomado a lição de algum manual marxista, mas graças à tese de um químico americano, que, num livro enciclopédico sobre drogas, esclarecia que uma pessoa fica atordoada quando toma uma bebida alcoólica porque as moléculas do álcool interagem com as células do cérebro, bloqueando algumas de suas conexões. Se o espírito fosse separado do corpo, argumentava o químico, o álcool não lhe faria qualquer efeito. Troquei o dualismo espírito/corpo da fé cristã pelo monismo materialista mas jamais deixei de ser fã do São Francisco, para mim ainda hoje um modelo de comunista, hippie e inspirador do naturalismo.

Oh là là! – Depois de aprender francês num curso oferecido pelo Museu Histórico que eu havia ajudado a fundar em 1972, acabei substituindo o professor e aperfeiçoei a conversação na casa de algumas famílias de técnicos franceses da Base Aérea. Daí passei a ler a revista Les Temps Modernes, que a gente comprava na livraria Ao Livro Técnico da Rua das Farmácias, em Brasília. Nessa época, eu acalentava a ideia maluca de um dia me encontrar com o diretor da revista, o Sartre, e também com o presidente Mao Zedong e com o general vietcongue Van Giap, três heróis do meu panteão, com quem eu imaginava poder conversar em francês sem o auxílio de intérpretes. A Internacional eu aprendi a cantar no original com Catherine Boissinot, uma garota de Bordeaux, integrante da juventude comunista francesa, filha de um engenheiro da Base Aérea e que passava férias em Anápolis. Oh, mon dieu! 

Conto essas intimidades para contextualizar a virada que significou na minha vida o convite para militar com o Partido Comunista do Brasil. Só com um pouquinho de exagero, tive a sensação de viver um personagem de um livro do Máximo Górki. Imaginem: com uma consciência social já bem adiantada, e sendo eu filho de uma lavadeira fã do Getúlio Vargas (até hoje!) e um padrasto que trabalhava numa fábrica de sapatos, o que mais eu podia almejar senão ser um soldado da Revolução?

Em casa a gente tinha um pôster gigante do meu padrasto de macacão, manejando uma fresadora. A foto tinha sido exposta no estande da fábrica de calçados Cosmos na Faiana, a Feira de Amostras da Indústria Anapolina, inaugurada em 72 ou 73. Depois do primeiro encontro com o Drummond, eu tratei de limpar a peça e a pendurei no ponto mais vistoso da sala de minha casa, com não disfarçado orgulho.

O pôster era fantástico, mas o meu padrasto não andava bem. Atingida pela crise, a fábrica em que ele trabalhava, de propriedade do grego Christos Papadopoulos, fechou. Meu padrasto foi obrigado a buscar emprego em Nova Hamburgo, no Rio Grande do Sul, e em Franca, São Paulo. Alcoólatra, nessas idas e vindas, ele acabou contraindo tuberculose e voltou a Anápolis para se tratar. Depois de algum tempo, ficou violento e passou a agredir a minha mãe. Um dia, num acesso de raiva, pinchou um gato numa parede. Depois da cena, chamei minha mãe, meu irmão e as duas irmãs que moravam com a gente e, sem titubear, decidimos expulsá-lo de casa. O pôster continuou pendurado na sala.

Peixe n'água – Muitos encontros com o Drummond eram feitos na minha casa, só nós dois. Minha mãe achava que ele era um professor. Meu entusiasmo comunista crescia. Uma vez me deu na cabeça escrever um artigo sobre o presidente Mao Zedong, discorrendo sobre a ideia dele de que um militante comunista deve viver entre o povo que nem um peixe n'água. Mostrei o artigo para o Drummond. Ele leu o texto rapidamente, acho que riu, mas não me lembro de seus comentários. No encontro seguinte, ele me trouxe uma biografia do presidente, séria, não hagiográfica, do historiador chinês Jérôme Ch'en, da Universidade de Leeds, Inglaterra, publicada em 1968 pela editora Mercure de France. Naquela biografia, que guardo até hoje, aprendi que Mao, ainda jovem, tinha flertado com as ideias anarquistas de Bakunin e Kropotkin antes de aderir ao marxismo. Com o Drummond eu logo aprenderia que o caminho do Brasil rumo ao socialismo jamais poderia ser igual ao da República Popular da China. Cada país faz a sua própria marcha, ensinava ele. É preciso estudar a realidade concreta do País para mudá-la. É possível que aqui tenha germinado a minha vocação de jornalista.

A memória que guardo do Drummond é a de um sujeito de mente aberta, carinhoso (certa vez presenteou meu irmão, o Sérgio, com uma gaitinha), bem informado e sintonizado nos debates intelectuais da época. Num encontro em Goiânia, provavelmente ocorrido no segundo semestre de 75, ele deu notícia do debate ainda muito acirrado em torno das teses de Ler o Capital, um livro coletivo capitaneado pelo filósofo francês Louis Althusser dez anos antes. Acho até que o Drummond fez uma piada sobre o conceito da “prática teórica”, parecida com a daquele físico teórico barrigudo zoado pela mãe por não fazer exercícios.

Em meados de 1976, o Drummond me deu de presente a peça O Rinoceronte, de Eugène Ionesco, que acabava de ser lançada na coleção Teatro Vivo da Abril Cultural. Em chave irônica, pensei com os meus botões: “Como é que um comunista sério presenteia um jovem recruta com a obra de um dramaturgo anticomunista 'insólito' como o Ionesco, que os puristas devem considerar o cúmulo da decadência da arte burguesa”? Matutando hoje, chego à conclusão de que o Drummond desafiava a caretice dos comunistas de então, apostando fichas na inteligência de um garoto que devia considerar esperto. Uma evidência disso foi o comentário que ele me fez nessa mesma época a propósito de uma entrevista do ator Juca de Oliveira, integrante do elenco da novela surrealista Saramandaia, de Dias Gomes, lançada em maio de 76 pela TV Globo. Juca fazia o papel do personagem João Gibão, cuja corcunda escondia um estupendo par de asas. “Essa novela é interessante porque educa os sentimentos artísticos do povo. Todo mundo sabe distinguir a fantasia da realidade, e diferencia as ações do ator na novela de suas ações na vida real”, ponderou o Drummond. Eu logo cogitei que ele devia estar aludindo ao efeito de distanciamento do Brecht, em oposição à catarse aristotélica, quer dizer, a identificação da plateia com o herói da peça. Dias Gomes, um comunista, era brechtiano desde os anos 60, quando trabalhou com Augusto Boal, um teórico da dramaturgia popular crítica e libertadora.

O alerta do general – Distinguir a realidade da fantasia é, por suposto, a primeira obrigação de um revolucionário. E a realidade no final de 1976 é que a ditadura estava capenga, como o próprio ditador de plantão, o general Ernesto Geisel, já havia reconhecido na virada do ano de 1974, após a derrota do partido oficial na disputa pelo Senado. Em cadeia nacional de rádio e televisão, Geisel havia dito que a Arena tinha se desgastado “com o largo período de confortável, mas emoliente posição majoritária” e que “as consequências estão agora à vista”. “Sirva isso de alerta”, concluiu. Diante desse aviso, cabia a nós acelerar a organização do partido e, com os parcos recursos disponíveis, fazer tudo o que pudéssemos para desgastar ainda mais o regime. Apoiar a ala progressista do MDB era o mínimo que podíamos fazer.

Uma das tarefas de nossa pequena célula anapolina era fazer cópias de documentos que o Drummond nos trazia. Essa atribuição cabia principalmente a mim, datilógrafo experiente, que sempre teclou com os dez dedos. Usando um papel fininho, papel-seda, quase transparente, a gente conseguia fazer cinco ou seis cópias por vez. Eu copiava artigos do jornal A Classe Operária e muitos outros materiais. Certa vez, reproduzi trechos do Livro Negro da Ditadura, publicado na clandestinidade pela Ação Popular Marxista-Leninista em 1972 para denunciar os crimes do regime militar. Assim que as cópias ficavam prontas, o Drummond as buscava em Anápolis, ou eu as levava para ele em Goiânia, menos de 60 quilômetros adiante, de ônibus. A recomendação de segurança para esse tipo de operação era a seguinte: “Nunca fique com o pacote dos documentos. Bote-o no bagageiro algumas poltronas à frente da sua, de maneira que fique à vista, para o seu controle. Se houver uma batida policial, será difícil que liguem o embrulho a você”.

Um dia, resolvemos investir em tecnologia… e compramos um mimeógrafo a álcool. Um dos trabalhos de que mais me orgulho foi ter produzido 150 cópias do “documento das três bandeiras”, provavelmente em maio ou junho de 1975. Na hora de bater o estêncil – a matriz com a tinta de reprodução -, o Adelite resolveu sofisticar: em vez de um, pediu que eu datilografasse dois estênceis, um com o texto, em cor azul, e o outro, com os títulos, em cor vermelha. O documento saiu tinindo de bonito. A primeira fase, da impressão, foi fácil. A segunda, da distribuição, é que seria complicada. Como distribuir 150 cópias de um documento do Partido Comunista em Anápolis, área de segurança nacional, cheia de milicos da Aeronáutica e de agentes da Polícia Federal? O primeiro nome da nossa lista foi o combativo deputado estadual Henrique Santillo, um neo-autêntico do MDB, que havia sido prefeito da cidade entre 1969 e 1972. Santillo era nosso amigo, dera todo o apoio da prefeitura para a fundação do Museu Histórico, e nós havíamos participado ativamente de sua campanha eleitoral em 1974, mas não confiávamos nele totalmente. Como entregar-lhe, pessoalmente, aquele documento “batata quente”, nos entregando juntos? Botamos a Mensagem aos Brasileiros num envelope e, de noite, o enfiamos debaixo da porta de entrada da casa dele. Fizemos isso com um monte de conhecidos. Para os amigos que moravam em outras cidades, e para alguns parlamentares em Brasília e Goiânia, mandamos o documento pelo correio. Um desses amigos, o Chico, mestrando de Ciências Sociais em Belo Horizonte, recebeu a Mensagem, mostrou-a a alguns colegas, e depois nos disse que, desde então, passou a ser muito mais respeitado na faculdade.

Guardar o mimeógrafo em casa era perigoso, mas o Drummond já tinha bolado uma solução. Concluídos os trabalhos de impressão, a gente embalava o aparelho, ia para a estação ferroviária, e despachava a caixa para outra cidade – Catalão, Ipameri ou Pires do Rio. Algumas semanas depois, o Drummond viajava até lá, resgatava o trambolho no depósito da estação e o redespachava. Era assim que a gente guardava o nosso cachacinha, em trânsito na estrada de ferro.

Contrafação – Se viver é muito perigoso, viver como comunista naquela época era muito mais perigoso ainda. Era preciso seguir as regras da estrita clandestinidade, sem vacilação, e é por isso que o PCdoB organizava células estanques, sem qualquer contato umas com as outras. Assumir uma outra identidade era também um recurso valioso de segurança. Por isso, mais de uma vez, surrupiei dos arquivos da Fundação Educacional algumas certidões de nascimento originais, devidamente substituídas por xerox, e as repassei ao Drummond. Depois da alteração dos dados, esses documentos serviam para que companheiros do partido pudessem obter novas carteiras de identidade ou carteiras de trabalho e, assim, sair da clandestinidade. Essa também foi uma das tarefas de que me orgulho, a despeito de sua evidente, ahn!, ilegalidade…

Comecei esse depoimento dizendo que vi o Drummond pela última vez quando estava acompanhando a apuração dos resultados das eleições municipais de 1976. Havíamos marcado um novo encontro para antes do final do ano, e tinha ficado acertado que ele teria um encontro com um amigo nosso, o professor Sílvio Costa, que depois se tornaria um dos dirigentes do partido em Goiânia. No dia 17 de dezembro, porém, fomos surpreendidos com a notícia do Massacre da Lapa. Vimos nos jornais e na revista Veja as fotos do Pedro Pomar, Ângelo Arroyo, Haroldo Lima e do Aldo Arantes, que a gente considerava um de nossos heróis, filho que é de Anápolis. Não vimos qualquer foto do Drummond. Um alívio! Também nada nos informou sobre o paradeiro de nosso companheiro a lista dos nomes dos mortos e dos presos. A gente não sabia o seu nome verdadeiro (para nós ele era o Osvaldo) e, por óbvio, não tínhamos a informação de que ele fizesse parte do Comitê Central do PCdoB. Ficamos então aguardando que ele nos procurasse ou desse notícia nos dias seguintes.



João Batista Franco Drummond


O anúncio do jornal – Passaram-se duas semanas, o ano virou e nenhum sinal dele. Passou a primeira semana de janeiro, passou a segunda, e nenhum sinal dele. As únicas notícias que tínhamos sobre o partido nos chegavam pelos boletins da Rádio Tirana, da Albânia, através do robusto Transglobe da Philco que eu havia comprado no início do ano. Pela rádio recebíamos a instrução de ficarmos quietos, de fingir que estávamos mortos, de não tentar fazer contatos com nenhum outro militante do partido. Com o passar do tempo, os boletins começaram a se repetir. O partido voltava a um estágio anterior, da mais completa clandestinidade. Foi então que, no dia 18 de janeiro, O Popular, de Goiânia, publicou um anúncio intitulado “Desaparecimento”, com uma foto do Drummond e um nome na legenda: José Edilson de Souza. O texto do anúncio dizia o seguinte: “Está desaparecido de sua residência, desde dezembro do ano passado, José Edilson de Souza. Ele tem aproximadamente 30 anos de idade, cabelo e olhos castanhos, 1,73 de altura. Trajava na ocasião calça azul US-TOP e camisa xadrez. Sua família, aflita, está solicitando a quem souber de seu paradeiro informar na 11ª Avenida, nº 677, na Vila Nova. O mesmo anúncio foi publicado no Correio Braziliense, não me lembro se no mesmo dia ou dias depois. Imediatamente, procurei o Tauny e o Adelite para discutir o significado daquele anúncio, que nos chocava mas também nos dava esperanças.

Na verdade, tudo indicava que se tratava de uma armadilha da polícia. Afinal, uma família não diz que um parente tem “aproxidamente” 30 anos. É claro que indicaria a idade do desaparecido com precisão. Mas, e se houvesse mesmo um parente agoniado? Essa dúvida e um monte de outras nos afligiram durante dias, até que eu tive uma ideia: e se eu desse um jeito de ir “casualmente” até o endereço transcrito no anúncio? E se eu fosse até lá disfarçado de vendedor? Discutimos um pouco mais, e decidimos que eu faria isso mesmo.

Comecei a me preparar, pesquisando comerciais publicados no Popular, até que achei uma oportunidade macabra, mas foi essa mesma que escolhi. Eu me disfarçaria de vendedor de um plano de saúde cujo principal produto era a cobertura das despesas do funeral do segurado. Para me habilitar tive que fazer um curso que durou uma manhã inteira numa sala localizada na Avenida Goiás, nas proximidades da Praça do Bandeirante. Ali recebi instruções de como falar com as pessoas, como negociar as prestações do plano etc. No final, recebi uma carteirinha de representante comercial, e uma pasta contendo tabelas de preços, um talão de recibos e um álbum de fotos de caixões, simples, medianos e até luxuosos. Tétrico! Tomei um lanche, respirei fundo e rumei para as imediações do endereço indicado no anúncio do Popular, na Vila Nova. Comecei a entrar de casa em casa, com jeito, tateando. Eu argumentava que a morte sempre é triste, mas inevitável. E que seria melhor que a gente se preparasse para ela com certa antecedência, sob pena de pegar a família de surpresa e desfalcar as suas economias com os custos do funeral. Na época eu era magro, usava cabelo comprido que nem hippie, e tinha um par de óculos redondos, parecidos com os do Trotsky ou do John Lennon. Parece que aquela aparência não oferecia perigo, e aquele papo de vendedor do outro mundo não deve ter ofendido ninguém.

Comércio macabro – Meia dúzia de visitas depois eu já estava craque no discurso, mas era preciso ter ainda paciência. Continuei a andar de porta em porta. Depois de bater perna por mais uma ou duas horas, alcancei a praça onde estava o meu alvo. Continuei a abordagem passo a passo, casa por casa, até chegar no número 677. Era uma residência coletiva. Na frente, uma casa maior, circundada por vários barracões. Bati na porta da casa principal e fui atendido por um casal de velhinhos. Ofereci o plano, recebi um não com os constrangimentos de praxe, e daí perguntei se não podia falar com os vizinhos. Parece que eram todos da mesma família, filhas e noras que cuidavam das crianças. Não me lembro de nenhum homem além do velhinho. Depois de conversar com todo mundo, perguntei se não havia mais alguém da família com quem eu pudesse conversar, mesmo que fosse no dia seguinte. Foi então que apareceu a informação que eu buscava: havia, sim, um outro filho do casal de velhinhos, mas ele só chegaria à noite. O indivíduo era funcionário da Secretaria de Segurança Pública, me disseram. Disfarcei o susto e me despedi, saindo dali com cautela. Respirei fundo e resolvi continuar a bater na porta de mais algumas casas da vizinhança, antes de cair fora e voltar para o escritório da empresa de seguros para devolver o material promocional como ficara combinado. Os meus esforços de vendedor naquela tarde não tiveram resultado comercial. Mas eu havia obtido uma informação de dar medo. Voltei para Anápolis e contei a escabrosa novidade para o Adelite e o Tauny. Decidimos seguir a orientação do partido de nos fingir de mortos.

Meses depois da tragédia da Lapa, continuamos no limbo, sem qualquer informação sobre o destino do Drummond. Não tínhamos contatos em São Paulo ou Belo Horizonte que pudessem nos dar notícias. Uma vez, uma conhecida comentou que “um rapaz do PCdoB que havia sido morto em São Paulo” tinha trabalhado como fotógrafo no jornal Cinco de Março, de Goiânia. Não fomos checar. Seguimos nossas vidas.

O Tauny continuou a trabalhar na Prefeitura Municipal. Exatamente no dia 31 de março de 1977, eu fui demitido pessoalmente pelo diretor da Fundação Educacional, o ex-prefeito Jonas Duarte, da Arena, depois que alguém lhe contou que eu andava “fazendo campanha política”, ao distribuir às professoras e merendeiras cartões de Feliz Aniversário e Boas Festas que o deputado Henrique Santillo costumava mandar pelos correios. “Eu sei que um dia vocês vão implantar o comunismo no Brasil, mas até lá eu estarei morto”, me disse o ex-prefeito, aos berros, antes de dizer que eu estava fora do serviço público. Seis meses depois, gastando os últimos trocados do FGTS, desisti do projeto de me mudar para Itaguaru, no interior de Goiás, para ajudar na organização do movimento sindical dos trabalhadores rurais. Rumei para Brasília, onde assumi a direção das vendas da sucursal do jornal Movimento, e onde recebi as primeiras lições de jornalismo do brilhante repórter Teodomiro Braga, chefe da redação.

Uma das minhas tarefas era datilografar os artigos do diretor da sucursal, o aguerrido ex-deputado baiano Chico Pinto, que havia sido preso em 1974 por denunciar os crimes do general Augusto Pinochet, exatamente na véspera da posse do general Geisel. Chico Pinto, que foi um dos articuladores do lançamento do Movimento, enquanto ainda estava preso no Pelotão de Investigações Criminais do Exército, em Brasília, virava a noite escrevendo seus artigos à mão, numa letra miudinha difícil de decifrar. Antes de levar as matérias, as fotos e a ilustrações do jornal para o departamento de censura da Polícia Federal, eu tinha que passar no apartamento do Chico, na SQN 402, para apanhar as folhas manuscritas e voltar para a sucursal para datilografá-las.

Vida que segue – Antes de mim, o Adelite já havia se mudado para Brasília, onde, em parceria com outra companheira de Anápolis, também professora e bancária, Elizabeth Alves Silva, ajudou a fundar o Sindicato dos Professores, na época ainda uma associação. Em 1980, os dois ajudaram a tomar o Sindicato dos Bancários da direita, quando se elegeu para a presidência da entidade o sociólogo Augusto Carvalho, então militante do Partido Comunista Brasileiro, hoje deputado federal pelo Solidariedade.

Adelite participou da reorganização do PCdoB em Brasília enquanto eu segui a carreira de jornalista. Mesmo sem voltar a militar “de carteirinha”, continuei a fazer política na chamada franja do partido. Em 79, passei a assessorar, esporadicamente, o deputado operário comunista Aurélio Peres, eleito pelo MDB em 1978, e reeleito em 1982. A gente compunha o boletim de prestação de contas do mandato, estampando na primeira página um editorial assinado pelo deputado, que se destacara nacionalmente como líder do Movimento Contra a Carestia em São Paulo. Quase sempre à esquerda da linha geral do partido, o jornalzinho não economizava críticas às políticas do presidente José Sarney, que, de “tudo pelo social”, só tinham o nome. Mais de uma vez encontrei no gabinete do Aurélio o presidente do PCdoB, João Amazonas. Ele sempre me tratava com simpatia enquanto folheava o boletim. Parece que achava graça. 

Em 1982, também participei, junto com o Adelite e a Beth, da campanha doe Aldo Arantes a uma vaga na Câmara dos Deputados, pelo PMDB de Goiás. Um dos resultados dessa campanha, em que o Aldo conquistou a primeira suplência, foi a eleição do prefeito de uma cidade do Entorno do Distrito Federal, Brasilinha, o Edenval Vaz. Durante a campanha, Adelite descobriu que estava com câncer em estágio avançado; morreu logo depois.

Por incrível que pareça, eu só tive plena certeza do assassinato do Drummond quando, ao cobrir uma manifestação dos movimentos da anistia no Salão Verde da Câmara dos Deputados, provavelmente no segundo semestre de 1978, vi um grande cartaz com a sua fotografia, entre a de outros militantes tombados na luta contra a ditadura. Só nessa ocasião a ficha caiu, e a raiva me fez mal durante dias. Em março daquele ano havia nascido o meu segundo filho, e ele foi registrado com o nome Osvaldo.

Um dos moleques que participavam conosco das atividades do MDB Jovem de Anápolis, o Egmar José, tornou-se um grande advogado e cumpriu papel importante na Comissão da Verdade. Foi justamente o Egmar que obrigou o Estado brasileiro a admitir, pela primeira vez, de papel passado, em 2014, que um militante político havia sido morto sob tortura enquanto estava sob a sua guarda, no DOI-Codi de São Paulo. O nome do militante: João Batista Franco Drummond, herói do povo brasileiro, meu professor de comunismo!

quinta-feira, 16 de dezembro de 2021

Diretório Nacional do PT por debater federações com PSB, PCdoB, PSOL e PV

 Resolve iniciar conversações sobre Federação Partidária com PSB, PCdoB, PSOL e PV, cabendo à Comissão Executiva Nacional do Partido conduzir este processo de diálogo para posterior decisão do DN, sobre eventual participação, a partir de um debate programático, esgotando o debate interno a partir da escuta às direções estaduais, municipais, observando os prazos definidos pela Justiça Eleitoral.

Brasília, 16 de dezembro de 2021.

Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores

Turma do TST tem maioria em favor do vínculo entre motorista e Uber - Marcos Aurélio Ruy


Ao formar maioria no reconhecimento do vínculo empregatício de um motorista da empresa de aplicativo Uber, a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), nesta quarta-feira (15), conforme informa o site InfoMoney, “dá uma esperança de que uma sociedade civilizada necessita de leis que regulem as relações entre o capital e o trabalho para evitar uma exploração ainda maior das pessoas que só têm a força de trabalho para vender”, diz Valdete Souto Severo, juíza do trabalho.

O processo ainda não foi definido porque o terceiro ministro pediu vistas e paralisou o processo até ele decidir pôr em julgamento novamente, nas “a formação dessa maioria dá um alento ao movimento sindical de que a Justiça do Trabalho pode mudar o posicionamento deferido pela 4ª e pela 5ª turmas em favor da empresa”, argumenta Ronaldo Leite, secretário-geral da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB).

Para Leite, “a reforma trabalhista já precarizou demais as relações de trabalho” e o “governo Bolsonaro quer aprofundar essa situação, permitindo que os patrões possam negar todos os direitos conquistados em anos de luta do movimento sindical”.

O InfoMoney informa também que dos três ministros que compõem a 3ª Turma, entre as oito existentes no TST, Maurício Godinho Delgado, relator do processo, e Alberto Luiz Bresciani votaram pela aceitação do vínculo e o ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte pediu vista, paralisando o processo, que começou a ser julgado no ano passado.

“Reconhecer o vínculo empregatício de trabalhadoras e trabalhadores de apps, é uma reivindicação importante do movimento sindical”, assegura Leite. Ele lembra, que entregadores de aplicativo, inclusive estão em greve por melhores condições de trabalho. “Até nos Estados Unidos a juventude está se sindicalizando para organizar melhor a luta por direitos”, afirma.

De acordo com um levantamento do tribunal existem ao menos 625 inquéritos civis em tramitação pelo país e outras oito ações civis públicas ajuizadas na Justiça do Trabalho sobre a obrigatoriedade do vínculo trabalhista para esses profissionais, aponta reportagem do InfoMoney.

“As empresas de aplicativo abusam da teoria do empreendedorismo para se desvincular de suas obrigações e forçar seus funcionários a jornadas abusivas, sem direito a descanso remunerado, férias, 13º salário, afastamento por problemas de saúde, entre outros direitos”, alega Leite.

Por isso, o sindicalista reforça, “precisamos de um movimento sindical forte e de uma Justiça do Trabalho atuante em favor dos direitos trabalhistas”.

Para Valdete, as trabalhadoras e trabalhadores precisam de uma legislação que garanta o trabalho decente. “As pessoas que vivem do trabalho devem ser protegidas, especialmente contra a despedida”, acentua. Além de “um salário que permita viver com decência”, e “uma jornada reduzida, para que as pessoas possam ‘existir’ e agir politicamente”.

terça-feira, 14 de dezembro de 2021

Pelo DIREITO À CRECHE - Nágyla Drumond


Me perdoem os que pensam diferente, mas, eu adorava deixar minha filha na creche às 7 horas da manhã e buscá-la às 17horas com banho já tomado e, muitas vezes, com lanche do finzinho de tarde. Adorava. Eu trabalhei, estudei e militei de maneira mais tranquila durante 9 anos. Sim, Clarice saiu da creche e ficou em tempo integral até o 4° ano. Mudou de Colégio e a distância me fez optar por transporte escolar de ida e volta, o que nos fez economizar tempo e dinheiro.
Fiz o primeiro ano de mestrado grávida e raríssimas vezes tive que levá-la ao trabalho, ou pra faculdade (mestrado e doutorado), ou mesmo pra atividades militantes. Tudo bem que só houve amamentação por 120 dias, o que nos deixou "mais independentes" uma da outra, mas, sempre tentei preservar o espaço dela e o meu, compreendendo que eu já havia parido e que não poderia carregá-la como se o cordão umbilical não houvesse sido cortado.
Sempre recebi críticas: veladas e/ou descabidas. Sempre. Piadas. Olhares tortos. Chegavam a dizer que parecia que eu nem era mãe pq parecia que Clarice não reclamava, não adoecia, não chorava.... O povo é escroto demais, né, não?
Sempre tive um suporte emocional fundamental em nossas vidas. Minha mãe assumiu Clarice como dela, tbm. Meu irmão e pai, idem. Sempre estabelecemos redes de apoio e cuidado entre minha filha e seus amigos de colégio. A escola para ela e para nós sempre foi um potente espaço de sociabilidade e formação de redes de solidariedade.
Eu tentei priorizar a qualidade de nosso tempo juntas. Há momentos exclusivamente nossos. Tentando fazer com que ela entenda, desde cedo, que somos pessoas diferentes, com necessidades diferentes, embora compartilhemos a mesma casa e os mesmos cuidados uns com os outros. Ela cresceu sabendo que assumimos tarefas conosco e consigo mesmos e que isso nâo tira a nossa individualidade, principalmente, qdo somos mulheres, este "ser" que o mundo inteiro quer frescar e dizer o que fazer.
Crianças têm o direito de brincar, de ter seu espaço. Para mães e pais que trabalham demais, não tenhamos culpa. Não fiquemos a carregar nossos meninos pra cima e pra baixo, como se eles não precisassem de uma rotina; precisam, necessitam. Construamos mais redes de solidariedade e maternagem e pensemos mais em nossa saúde mental. Cuidar é bom. Cuidar cansa demais. Cuidar é necessário demais. É tarefa de uma vida inteira. E por isso mesmo, não podemos queimar todos os nossos cartuchos de vitalidade de uma só vez, na infância de nossos filhos.

Papo Reto 2 - O BANCO CUMPRIU A LIMINAR? PROTEJA-SE, DOCUMENTE, DENUNCIE! - NÃO AO NATAL DA COVID

 




sábado, 11 de dezembro de 2021

PCdoB lança Livro de Imagens do Centenário Gratuito em PDF - Baixe no Portal Grabois

 Um centenário para se ver, sentir e impulsionar a jornada transformadora

#PCdoB

Livro de imagens retrata a história de cem anos de lutas e conquistas do Partido Comunista do Brasil. Disponível gratuitamente em versão eletrônica (abaixo) é um resgate de parte da luta do povo brasileiro. 
Veja a apresentação dos Editores no Portal da Fundação Maurício Grabois e baixe gratuitamente

Visite a Fundação Maurício Grabois




As Tarefas das Uniões da Juventude- Lênin (1920) - Arquivo Marxista na Internet




(Discurso no III Congresso de Toda a Rússia da União Comunista da Juventude da Rússia)
V. I. Lénine
2 de outubro de 1920
Transcrição autorizada


Publicado: no Pravda nº 221, 222 e 223, de 5, 6 e 7 de Outubro de 1920

Fonte: Obras Escolhidas em três tomos, Edições "Avante!", 1977, t3, pp 386-397.

Tradução: Edições "Avante!" com base nas Obras Completas de V. I. Lénine, 5.ª ed. em russo, t.41, pp. 298-318.

Transcrição e HTML: Manuel Gouveia

Direitos de Reprodução: © Direitos de tradução em língua portuguesa reservados por Edições "Avante!" - Edições Progresso Lisboa - Moscovo.

(Lénine foi acolhido com uma clamorosa ovação do congresso.) Camaradas, quereria conversar hoje sobre o tema de quais são as tarefas da União da Juventude Comunista e, em ligação com isto, sobre o que devem ser as organizações da juventude numa república socialista em geral.

Devemos deter-nos tanto mais nesta questão quanto se pode dizer, em certo sentido, que é precisamente à juventude que incumbe a verdadeira tarefa de criar a sociedade comunista. Porque é evidente que a geração de militantes educada na sociedade capitalista pode, no melhor dos casos, realizar a tarefa de destruir as bases do velho modo de vida capitalista baseado na exploração. No melhor dos casos poderá realizar a tarefa de criar um regime social que ajude o proletariado e as classes trabalhadoras a conservar o poder nas suas mãos e a criar uma sólida base, sobre a qual só poderá edificar a geração que começa a trabalhar já em condições novas, numa situação em que não existem relações de exploração entre os homens.

Pois bem, ao abordar deste ponto de vista a questão das tarefas da juventude, devo dizer que essas tarefas da juventude em geral e das uniões da juventude comunista e de quaisquer outras organizações em particular poderiam exprimir-se com uma só palavra: a tarefa consiste em aprender.

Naturalmente, isto não é mais que «uma só palavra». Ela não dá ainda respostas às perguntas principais e mais essenciais: que aprender e como aprender? E aqui toda a questão está em que, juntamente com a transformação da velha sociedade capitalista, o ensino, a educação e a formação das novas gerações, que criarão a sociedade comunista, não podem ser os antigos. O ensino, a educação e a formação da juventude devem partir do material que nos ficou da velha sociedade. Só poderemos construir o comunismo com a soma de conhecimentos, organizações e instituições, com a reserva de forças e meios humanos que nos ficaram da velha sociedade. Só transformando radicalmente o ensino, a organização e a educação da juventude conseguiremos que os esforços da jovem geração tenham como resultado a criação duma sociedade que não se pareça com a antiga, isto é, da sociedade comunista. Por isso precisamos de nos deter pormenorizadamente naquilo que devemos ensinar e como deve aprender a juventude se quiser realmente justificar o nome de juventude comunista, e como prepará-la para que seja capaz de acabar de construir e completar aquilo que nós começámos.

Devo dizer que a primeira resposta, e, ao que parece, a mais natural, é que a união da juventude e toda a juventude em geral que queira passar ao comunismo tem de aprender o comunismo.

Mas esta resposta, «aprender o comunismo», é demasiado geral. De que é que necessitamos para aprender o comunismo? Que é que necessitamos de escolher, da soma de conhecimentos gerais, para adquirir o conhecimento do comunismo? Aqui ameaça-nos toda uma série de perigos, que se manifestam a cada passo quando se coloca incorrectamente a tarefa de aprender o comunismo ou quando ela é compreendida duma maneira demasiado unilateral.

À primeira vista, naturalmente, surge a ideia de que aprender o comunismo é assimilar a soma de conhecimentos que se expõem nos manuais, brochuras e trabalhos comunistas. Mas isso seria definir de um modo demasiado grosseiro e insuficiente o estudo do comunismo. Se o estudo do comunismo consistisse unicamente em assimilar aquilo que está exposto nos trabalhos, livros e brochuras comunistas, poderíamos obter com demasiada facilidade exegetas ou fanfarrões comunistas, o que muitas vezes nos causaria dano e prejuízo, porque esses indivíduos, depois de terem aprendido e lido aquilo que se expõe nos livros e brochuras comunistas, seriam incapazes de combinar todos esses conhecimentos e não saberiam agir como o exige realmente o comunismo.

Um dos maiores males e calamidades que nos ficaram da velha sociedade capitalista é o completo divórcio entre o livro e a vida prática, pois tínhamos livros onde tudo era pintado com o melhor aspecto e estes livros, na maior parte dos casos, eram a mentira mais repugnante e hipócrita, que nos desenhava falsamente a sociedade capitalista.

Por isso seria extremamente incorrecta a simples assimilação livresca daquilo que dizem os livros sobre o comunismo. Os nossos discursos e artigos de agora não são uma simples repetição daquilo que se disse antes sobre o comunismo, pois os nossos discursos e artigos estão ligados ao nosso trabalho quotidiano e multilateral. Sem trabalho, sem luta, o conhecimento livresco do comunismo, adquirido em brochuras e obras comunistas, não vale absolutamente nada, porque prolongaria o antigo divórcio entre a teoria e a prática, esse antigo divórcio que constituía o mais repugnante traço da velha sociedade burguesa.

Seria ainda mais perigoso se começássemos a assimilar apenas as palavras de ordem comunistas. Se não compreendêssemos a tempo este perigo e se não orientássemos todo o nosso trabalho para eliminar este perigo, a existência de meio milhão ou de um milhão de jovens rapazes ou raparigas que depois de tal estudo do comunismo se chamassem comunistas apenas traria um grande prejuízo à causa do comunismo.

Aqui coloca-se-nos a questão de saber como combinar tudo isto para aprender o comunismo. Que é que devemos tomar da velha escola, da velha ciência? A velha escola declarava que queria criar homens instruídos em todos os domínios e que ensinava as ciências em geral. Sabemos que isso era pura mentira, pois toda a sociedade se baseava e assentava na divisão dos homens em classes, em exploradores e oprimidos. Como é natural, toda a velha escola, estando inteiramente impregnada de espírito de classe, só dava conhecimentos aos filhos da burguesia. Nessas escolas, a jovem geração de Operários e camponeses não era tanto educada como treinada no interesse dessa mesma burguesia. Educavam-nos para preparar para ela servidores úteis, capazes de lhe dar lucros, e que ao mesmo tempo não perturbassem a sua tranquilidade e ociosidade. Por isso, ao rejeitar a velha escola, propusemo-nos a tarefa de tomar dela apenas aquilo que nos é necessário para conseguir uma verdadeira formação comunista.

Abordarei aqui as acusações, as censuras à velha escola, que constantemente se ouvem e que conduzem não raro a interpretações inteiramente falsas. Diz-se que a velha escola era uma escola de estudo livresco, uma escola de amestramento, uma escola de aprendizagem de cor. Isto é verdade, mas é preciso saber distinguir aquilo que a velha escola tinha de mau daquilo que tinha de útil para nós, é preciso saber escolher dela aquilo que é necessário para o comunismo.

A velha escola era a escola do estudo livresco, obrigava as pessoas a assimilar uma quantidade de conhecimentos inúteis, supérfluos, mortos, que atulhavam a cabeça e transformavam a jovem geração num exército de funcionários talhados todos pela mesma medida. Mas se tentásseis tirar a conclusão de que se pode ser comunista sem ter assimilado os conhecimentos acumulados pela humanidade cometeríeis um enorme erro. Seria errado pensar que basta assimilar as palavras de ordem comunistas, as conclusões da ciência comunista, sem assimilar a soma de conhecimentos de que o comunismo é consequência. O marxismo é um exemplo que mostra como o comunismo surgiu da soma dos conhecimentos humanos.

Lestes e ouvistes que a teoria comunista, a ciência comunista, criada principalmente por Marx, que esta teoria do marxismo deixou de ser obra de um só socialista, ainda que genial, do século XIX, que esta doutrina se tornou a doutrina de milhões e dezenas de milhões de proletários de todo o mundo, que aplicam esta doutrina na sua luta contra o capitalismo. E se levantardes a questão: porque é que a doutrina de Marx pôde conquistar milhões e dezenas de milhões de corações na classe mais revolucionária - recebereis uma só resposta: isto aconteceu porque Marx se apoiava na sólida base dos conhecimentos humanos adquiridos sob o capitalismo. Ao estudar as leis do desenvolvimento da sociedade humana, Marx compreendeu a inevitabilidade do desenvolvimento do capitalismo, que conduz ao comunismo e - o que é essencial - demonstrou-o baseando-se exclusivamente no estudo mais exacto, mais pormenorizado e mais profundo dessa sociedade capitalista, por ter assimilado plenamente tudo aquilo que a ciência anterior tinha dado. Ele reelaborou de um modo crítico, sem deixar de dar atenção a um único ponto, tudo aquilo que a sociedade humana tinha criado. Reelaborou tudo aquilo que o pensamento humano tinha criado, submeteu-o a crítica, comprovou-o no movimento operário e retirou daí as conclusões que as pessoas limitadas ao quadro burguês ou atadas aos preconceitos burgueses não podiam retirar.

É preciso ter isto em conta quando falamos, por exemplo, da cultura proletária(N206). Sem a compreensão clara de que só com um conhecimento preciso da cultura criada por todo o desenvolvimento da humanidade, só com a sua reelaboração, se pode construir a cultura proletária, sem esta compreensão não realizaremos esta tarefa. A cultura proletária não surge do nada, não é uma invenção das pessoas que se chamam especialistas cm cultura proletária. Isso é pura idiotice. A cultura proletária deve ser o desenvolvimento lógico da soma de conhecimentos que a humanidade elaborou sob o jugo da sociedade capitalista, da sociedade latifundiária, da sociedade burocrática. Todos esses caminhos e atalhos conduziram e conduzem e continuarão a conduzir à cultura proletária, do mesmo modo que a economia política, reelaborada por Marx, nos mostrou onde deve chegar a sociedade humana, nos indicou a passagem à luta de classes, ao começo da revolução proletária.

Quando ouvimos com frequência, tanto entre representantes da juventude como entre alguns defensores da nova educação, ataques à velha escola dizendo que a velha escola era a escola da aprendizagem de cor, dizemos-lhes que devemos tomar dessa velha escola tudo quanto ela tinha de bom. Não devemos tomar da velha escola o método que consistia em sobrecarregar a memória dos jovens com uma quantidade desmesurada de conhecimentos, inúteis em nove décimos e adulterados em um décimo, mas isso não significa que possamos limitar-nos às conclusões comunistas e aprender as palavras de ordem comunistas. Desse modo não se criará o comunismo. Só se pode chegar a ser comunista depois de ter enriquecido a memória com o conhecimento de todas as riquezas que a humanidade elaborou.

Não precisamos da aprendizagem de cor, mas precisamos de desenvolver e aperfeiçoar a memória de cada estudante com o conhecimento de factos fundamentais, porque o comunista transformar-se-ia numa palavra vazia, transformar-se-ia num rótulo fútil, e o comunismo não seria mais do que um simples fanfarrão se não reelaborasse na sua consciência todos os conhecimentos adquiridos. Não só deveis assimilá-los, mas assimilá-los com espírito crítico para não atulhar a vossa inteligência com trastes inúteis, e enriquecê-la com o conhecimento de todos os factos sem os quais não é possível ser um homem moderno culto. Se um comunista tivesse a ideia de se vangloriar do seu comunismo na base de conclusões já prontas por ele recebidas, sem ter realizado um trabalho muito sério, muito difícil e muito grande, sem compreender os factos em relação aos quais tem a obrigação de adoptar uma atitude crítica, seria um comunista muito triste. Se eu sei que sei pouco, esforçar-me-ei por saber mais, mas se um homem diz que é comunista e que não tem necessidade de conhecimentos sólidos nunca sairá dele nada que se pareça com um comunista.

A velha escola produzia os servidores necessários aos capitalistas, a velha escola fazia dos homens de ciência pessoas que tinham de escrever e falar ao gosto dos capitalistas. Isso quer dizer que devemos suprimi-la. Mas se devemos suprimi-la, se devemos destruí-la, quer isso dizer que não devemos tomar dela tudo aquilo que a humanidade acumulou e que é necessário para o homem? Quer isso dizer que não devemos saber distinguir aquilo que era necessário para o capitalismo daquilo que é necessário para o comunismo?

No lugar do antigo amestramento, que se praticava na sociedade burguesa, apesar da vontade da maioria, nós colocamos a disciplina consciente dos operários e camponeses, que unem ao seu ódio contra a velha sociedade a decisão, a capacidade e a disposição de unir e organizar as forças para essa luta, a fim de criar, da vontade de milhões e centenas de milhões de pessoas isoladas, divididas e dispersas pela extensão de um país imenso, uma vontade única, pois sem esta vontade única seremos inevitavelmente vencidos. Sem essa coesão, sem essa disciplina consciente dos operários e dos camponeses, a nossa causa é uma causa sem esperança. Sem isto não poderemos vencer os capitalistas e latifundiários de todo o mundo. Nem sequer consolidaremos os alicerces, para não falar já da construção sobre estes alicerces da nova sociedade comunista. Do mesmo modo, rejeitando a velha escola, alimentando contra esta velha escola um ódio absolutamente legítimo e necessário, apreciando a disposição de destruir a velha escola, devemos compreender que o velho ensino livresco, a velha aprendizagem de cor e o velho amestramento devem ser substituídos pela capacidade de se apropriar de toda a soma de conhecimentos humanos, e apropriar-se deles de tal modo que o comunismo não seja em vós algo aprendido de memória, mas seja pensado por vós mesmos, seja uma conclusão necessária do ponto de vista da educação moderna.

É assim que devem ser colocadas as tarefas fundamentais quando falamos da tarefa de aprender o comunismo.

Para vos explicar isto e abordar ao mesmo tempo a questão de como aprender, tomarei um exemplo prático. Todos sabeis que agora, a seguir às tarefas militares, às tarefas da defesa da república, se coloca perante nós a tarefa económica. Sabemos que é impossível edificar a sociedade comunista sem restaurar a indústria e a agricultura, e é preciso restaurá-las não à maneira antiga. É preciso restaurá-las sobre uma base moderna, segundo a última palavra da ciência. Vós sabeis que essa base é a electricidade, que só quando todo o país, todos os ramos da indústria e da agricultura estiverem electrificados, quando realizardes essa tarefa, só então podereis edificar para vós mesmos a sociedade comunista que a velha geração não poderá edificar. Coloca-se perante vós a tarefa do renascimento tanto da agricultura como da indústria sobre uma base técnica moderna, que assente na ciência e na técnica modernas, na electricidade. Compreendeis perfeitamente que a electrificação não pode ser obra de analfabetos e que aqui não basta uma instrução elementar. Aqui não basta compreender o que é a electricidade: é preciso saber como aplicá-la tecnicamente à indústria, à agricultura e a cada um dos ramos da indústria e da agricultura. Tudo isso temos que aprendê-lo nós próprios, e devemos ensiná-lo a toda a jovem geração trabalhadora. Esta é a tarefa que se coloca a cada comunista consciente, a cada jovem que se considera comunista e que se dá claramente conta de que, ao ingressar na União Comunista da Juventude, assumiu a tarefa de ajudar o partido a edificar o comunismo e de ajudar toda a jovem geração a criar a sociedade comunista. Ele deve compreender que só sobre a base da educação moderna a poderá criar, e que se não possuir essa educação o comunismo continuará a ser apenas um desejo.

A tarefa da geração precedente reduzia-se a derrubar a burguesia. Criticar a burguesia, desenvolver nas massas o ódio contra ela, desenvolver a consciência de classe e saber unir as suas forças eram então as tarefas essenciais. A nova geração tem à sua frente uma tarefa mais complexa. Não deveis apenas unir as vossas forças para apoiar o poder operário e camponês contra a invasão dos capitalistas. Isso deveis fazê-lo. Compreendeste-lo admiravelmente, como o vê claramente qualquer comunista. Mas isso é insuficiente. Vós deveis edificar a sociedade comunista. A primeira metade do trabalho está já feita em muitos aspectos. O velho foi destruído, como devia ser destruído, constitui um monte de escombros, que é aquilo em que devia ser transformado. O terreno está já limpo e sobre esse terreno a nova geração comunista deve edificar a sociedade comunista. A vossa tarefa é edificar, e só podereis cumpri-la possuindo todos os conhecimentos modernos, sabendo transformar o comunismo de fórmulas, conselhos, receitas, prescrições e programas já feitos e aprendidos de cor em algo de vivo que dá unidade ao vosso trabalho imediato, transformar o comunismo em guia do vosso trabalho prático.

Esta é a vossa tarefa, pela qual deveis guiar-vos na obra de formação, educação, elevação de toda a jovem geração. Deveis ser os primeiros construtores da sociedade comunista entre os milhões de construtores que devem ser todos os rapazes, todas as raparigas. Se não incorporardes nessa edificação do comunismo toda a massa da juventude operária e camponesa, não construireis a sociedade comunista.

Aqui abordo, naturalmente, a questão de como devemos ensinar o comunismo e em que deve consistir a particularidade dos nossos métodos.

E aqui deter-me-ei antes de mais na questão da moral comunista.

Deveis educar-vos para serdes comunistas. A tarefa da União da Juventude consiste em formular a sua actividade prática de modo que, ao aprender, ao organizar-se, ao unir-se, ao lutar, esta juventude se eduque a si própria e a todos aqueles que a vêem como chefe, que eduque comunistas. É preciso que toda a obra de educação, de formação e de ensino da juventude contemporânea seja a educação nela da moral comunista.

Mas existe uma moral comunista? Existe uma ética comunista? Naturalmente que sim. Apresentam-se frequentemente as coisas de tal modo que nós não teríamos uma moral própria, e a burguesia acusa-nos frequentemente de que nós, os comunistas, rejeitamos toda a moral. Isto é um processo de confundir os conceitos e lançar areia aos olhos dos operários e camponeses.

Em que sentido rejeitamos nós a moral, rejeitamos a ética?

No sentido em que a pregava a burguesia, que deduzia esta ética de mandamentos de Deus. A este respeito dizemos, naturalmente, que não acreditamos em Deus, e sabemos muito bem que em nome de Deus falava o clero, falavam os latifundiários, falava a burguesia, para fazer passar os seus interesses de exploradores. Ou então, em vez de deduzir essa moral dos mandamentos da ética, dos mandamentos de Deus, deduziam-na de frases idealistas ou semi-idealistas, que sempre se reduziram também a algo de muito parecido com os mandamentos de Deus.

Nós rejeitamos toda essa ética, tomada de conceitos extra-humanos, fora das classes. Dizemos que isso é enganar, iludir e embrutecer a inteligência dos operários e camponeses no interesse dos latifundiários e capitalistas.

Dizemos que a nossa ética está por completo subordinada aos interesses da luta de classe do proletariado.

A velha sociedade baseava-se na opressão de todos os operários e camponeses pelos latifundiários e capitalistas. Precisávamos de destruí-la, precisávamos de os derrubar, mas para isso era necessário criar a união. E não era Deus que podia criar tal união.

Tal união só a podiam dar as fábricas, só um proletariado instruído, desperto da velha letargia. Só quando se constituiu esta classe começou o movimento de massas que conduziu àquilo que hoje vemos: à vitória da revolução proletária num dos países mais fracos, que se defende há três anos da investida da burguesia de todo o mundo. E vemos como a revolução proletária cresce em todo o mundo. Agora dizemos, baseando-nos na experiência, que só o proletariado pôde criar uma força tão coesa, que é seguida pelo campesinato disperso e fragmentado e que foi capaz de resistir a todas as investidas dos exploradores. Só esta classe pode ajudar as massas trabalhadoras a unirem-se, a ganhar coesão, a assentar definitivamente, a consolidar definitivamente a sociedade comunista, a edificá-la definitivamente.

Por isso dizemos: para nós a ética tomada fora da sociedade humana não existe; é um logro. Para nós, a ética está subordinada aos interesses da luta de classe do proletariado.

E em que consiste então essa luta de classe? Consiste em derrubar o tsar, em derrubar os capitalistas, em aniquilar a classe dos capitalistas.

E que são as classes em geral? São aquilo que permite a uma parte da sociedade apropriar-se do trabalho da outra. Se uma parte da sociedade se apropria de toda a terra, temos as classes dos latifundiários e dos camponeses. Se uma parte da sociedade tem as fábricas, tem as acções e os capitais, enquanto a outra trabalha nessas fábricas, temos as classes dos capitalistas e dos proletários.

Não foi difícil desembaraçarmo-nos do tsar - bastaram para isso alguns dias. Não foi muito difícil desembaraçarmo-nos dos latifundiários, pudemos fazê-lo em alguns meses, não foi muito difícil desembaraçarmo-nos também dos capitalistas. Mas suprimir as classes é incomparavelmente mais difícil; subsiste ainda a divisão em operários e camponeses. Se um camponês instalado numa parcela de terra se apropria do excedente de cereais, isto é, dos cereais que não são necessários para ele nem para o seu gado, e todos os outros ficam sem pão, esse camponês transforma-se já em explorador. Quanto mais cereais retém, mais ganha, e que os outros passem fome: «quanto mais fome passarem mais caro venderei estes cereais». É preciso que todos trabalhem de acordo com um plano comum numa terra comum, em fábricas comuns e de acordo com um regulamento comum. Será fácil fazê-lo? Vós vedes que aqui não é possível conseguir soluções com a mesma facilidade que quando nos desembaraçámos do tsar, dos latifundiários e dos capitalistas. Aqui é necessário que o proletariado transforme, reeduque uma parte dos camponeses e atraia aqueles que são camponeses trabalhadores, para liquidar a resistência dos camponeses que são ricos e enriquecem com a miséria dos restantes. Por conseguinte, a tarefa da luta do proletariado ainda não terminou com o facto de que derrubámos o tsar e nos desembaraçámos dos latifundiários e dos capitalistas, e é precisamente nisso que consiste a tarefa do regime a que chamamos ditadura do proletariado.

A luta de classe continua; apenas mudaram as suas formas. É a luta de classe do proletariado para que não possam voltar os velhos exploradores, para unir a massa dispersa do campesinato ignorante. A luta de classe continua, e a nossa tarefa é subordinar todos os interesses a essa luta. E nós subordinamos a esta tarefa a nossa ética comunista. Dizemos: a ética é aquilo que serve a destruição da antiga sociedade exploradora e a união de todos os trabalhadores em torno do proletariado, criador da nova sociedade dos comunistas.

A ética comunista é que serve esta luta, a que une os trabalhadores contra toda a exploração, contra toda a pequena propriedade, pois a pequena propriedade coloca nas mãos de uma pessoa aquilo que foi criado pelo trabalho de toda a sociedade. No nosso país, a terra é considerada propriedade comum.

Mas que acontecerá se me aproprio dum pedaço dessa propriedade comum, se cultivo nele duas vezes mais cereais do que necessito e especulo com o excedente dos cereais? Se penso que quanto mais famintos houver mais caro me pagarão, procederei como comunista? Não, como explorador, como proprietário. Temos de lutar contra isso. Se as coisas continuam assim, voltaremos atrás, ao poder dos capitalistas, ao poder da burguesia, como aconteceu mais de uma vez nas revoluções anteriores. E para não deixar que se restaure o poder dos capitalistas e da burguesia, para isto é necessário não permitir o mercantilismo à custa de outras, para isto é necessário que os trabalhadores se unam ao proletariado e constituam a sociedade comunista. Nisto consiste, precisamente, a principal particularidade da tarefa fundamental da união e da organização da juventude comunista.

A velha sociedade baseava-se no princípio de que ou tu roubas outro ou outro te rouba a ti, ou trabalhas para outro ou outro para ti, ou és escravista ou és escravo. E é compreensível que homens educados nesta sociedade assimilem, por assim dizer com o leite materno, a psicologia, o costume, a ideia de que ou se é escravista ou escravo, ou pequeno proprietário, pequeno empregado, pequeno funcionário, intelectual, numa palavra um homem que se preocupa apenas em ter o que é seu e não se importa com os outros. Se exploro esta parcela de terra, pouco me importam os outros; se o outro passa fome, tanto melhor, venderei os meus cereais mais caro. Se tenho o meu lugarzinho, como médico, como engenheiro, professor, empregado, pouco me importam os outros. E talvez sendo complacente, agradando aos poderosos, conserve o meu lugarzinho e possa mesmo fazer carreira e chegar a burguês. Tal psicologia e tal estado de espírito não podem existir num comunista. Quando os operários e camponeses demonstraram que somos capazes, com as nossas próprias forças, de nos defender e de criar uma nova sociedade, precisamente aqui começou a nova educação, a educação na luta contra os exploradores, a educação na aliança com o proletariado contra os egoístas e os pequenos proprietários, contra a psicologia e os hábitos que dizem: eu procuro o meu próprio benefício e o resto não me preocupa.

Eis em que consiste a resposta à pergunta de como deve a jovem geração aprender o comunismo.

Ela só pode aprender o comunismo se ligar cada passo do seu estudo, da sua educação e da sua formação à luta incessante dos proletários e dos trabalhadores contra a velha sociedade exploradora. Quando nos falam de ética, dizemos: para um comunista, toda a ética reside nessa disciplina solidária e unida e nessa luta consciente das massas contra os exploradores. Não acreditamos na ética eterna e desmascaramos a mentira de todas as fábulas acerca da ética. A ética serve para que a sociedade humana se eleve mais alto, se liberte da exploração do trabalho.

Para o realizar precisamos da geração dos jovens que começaram a tornar-se homens conscientes nas condições da luta disciplinada e encarniçada contra a burguesia. É nessa luta que ela educará verdadeiros comunistas, é a essa luta que ela deve subordinar e ligar a cada passo o seu estudo, formação e educação. A educação da juventude comunista não deve consistir em oferecer-lhe discursos adocicados de toda a espécie e regras de ética. Não é nisto que consiste a educação. Quando os homens viram como os seus pais e mães viveram sob o jugo dos latifundiários e capitalistas, quando eles próprios participaram nos sofrimentos que se abatiam sobre aqueles que iniciaram a luta contra os exploradores, quando viram que sacrifícios custou a continuação dessa luta para defender aquilo que foi conquistado e que inimigos furiosos são os latifundiários e os capitalistas, esses homens educam-se nesse ambiente como comunistas. A base da ética comunista está na luta pela consolidação e realização completa do comunismo. Eis em que consiste também a base da educação, da formação e do ensino comunistas. Eis em que consiste a resposta à questão de como se deve aprender o comunismo.

Não acreditaríamos no ensino, na educação e formação se estes estivessem encerrados apenas na escola e separados da vida tempestuosa. Enquanto os operários e os camponeses continuarem oprimidos pelos latifundiários e capitalistas, enquanto as escolas continuarem nas mãos dos latifundiários e capitalistas, a geração da juventude permanecerá cega e ignorante. Mas a nossa escola deve dar à juventude as bases do conhecimento, a capacidade de forjar por si mesmos concepções comunistas, deve fazer deles homens cultos. A escola deve, durante o tempo que os homens estudam nela, fazer deles participantes na luta pela libertação em relação aos exploradores. A União Comunista da Juventude só justificará o seu nome, só justificará que é a União da jovem geração comunista, se ligar cada passo da sua instrução, educação e formação à participação na luta comum de todos os trabalhadores contra os exploradores. Porque vós sabeis perfeitamente que enquanto a Rússia for a única república operária, e no resto do mundo existir a velha ordem burguesa, seremos mais fracos do que eles, que nos ameaça constantemente um novo ataque, e que só aprendendo a manter a coesão e a unidade venceremos na luta futura e, uma vez fortalecidos, tornar-nos-emos verdadeiramente invencíveis. Deste modo, ser comunista significa organizar e unir toda a jovem geração, dar o exemplo de educação e de disciplina nesta luta. Então podereis começar e levar até ao fim a construção do edifício da sociedade comunista.

Para vos tornar isto mais claro citarei um exemplo. Nós chamamo-nos comunistas. Que é um comunista? Comunista é uma palavra latina. Communis significa comum. A sociedade comunista significa que tudo é comum: a terra, as fábricas, o trabalho de todos - eis o que é o comunismo.

Poderá o trabalho ser comum se cada um dirige a sua exploração numa parcela separada? O trabalho comum não se cria de repente. Isso é impossível. Não cai do céu. É preciso ganhá-lo, obtê-lo com sacrifícios, criá-lo. E cria-se durante a luta. Não se trata aqui de um velho livro, livro em que ninguém acreditaria. Trata-se da própria experiência da vida. Quando Koltchak e Deníkine avançavam da Sibéria e do Sul, os camponeses estavam a seu lado. O bolchevismo não lhes agradava, porque os bolcheviques lhes tiravam os cereais a preços fixos. Mas quando os camponeses sofreram na Sibéria e na Ucrânia o poder de Koltchak e Deníkine, compreenderam que o camponês não tem alternativa: ou voltar ao capitalista, e ele entregar-te-á como escravo ao latifundiário, ou seguir o operário, que na verdade não promete mundos e fundos e exige uma férrea disciplina e firmeza na dura luta, mas que te tirará da escravidão dos capitalistas e latifundiários. Quando até os camponeses ignorantes viram isto por experiência própria, então tornaram-se partidários conscientes do comunismo formados numa dura escola. Esta mesma experiência deve ser colocada pela União Comunista da Juventude na base de toda a sua actividade.

Respondi às questões do que devemos aprender, do que precisamos de tomar da velha escola e da velha ciência. Procurarei responder também à questão de como é preciso apreendê-lo: só ligando indissoluvelmente cada passo da actividade na escola, cada passo da educação, da formação e do ensino à luta de todos os trabalhadores contra os exploradores.

Com alguns exemplos, extraídos da experiência do trabalho desta ou daquela organização da juventude, mostrar-vos-ei de modo evidente como se deve fazer esta educação do comunismo. Todos falam de liquidar o analfabetismo. Sabeis que num país analfabeto é impossível edificar a sociedade comunista. Não basta que o poder Soviético dê uma ordem, ou que se lance uma certa parte dos melhores militantes nessa tarefa. Para isto é necessário que a jovem geração deite ela mesmo mãos à obra. O comunismo consiste em que a juventude, os rapazes e raparigas que constituem a União da Juventude digam: essa é a nossa causa, unir-nos-emos e iremos para o campo para liquidar o analfabetismo, para que a nossa jovem geração não tenha analfabetos. Fazemos tudo para que a iniciativa da jovem geração seja consagrada a esta obra. Vós sabeis que é impossível transformar rapidamente a Rússia de um país ignorante e analfabeto num país instruído; mas se a União da Juventude se empenhar nisso, se toda a juventude trabalhar em proveito de todos, então esta União, que une 400 000 rapazes e raparigas, terá o direito de se chamar União Comunista da Juventude. A tarefa da União consiste ainda em, ao assimilar um ou outro conhecimento, ajudar a juventude que não pode libertar-se por si mesma das trevas do analfabetismo. Ser membro da União da Juventude significa consagrar o seu trabalho, as suas forças, à causa comum. Nisto é que consiste a educação comunista. Só neste trabalho um rapaz ou uma rapariga se converterá num verdadeiro comunista. Só se tornarão comunistas se conseguirem alcançar êxitos práticos com este trabalho.

Tomai, por exemplo, o trabalho nas hortas suburbanas. Não será esse um trabalho útil? Essa é uma das tarefas da União Comunista da Juventude. O povo passa fome, há fome nas fábricas. Para nos livrarmos da fome é preciso desenvolver as hortas, mas a agricultura continua a fazer-se à antiga. É preciso que os elementos mais conscientes ponham mãos à obra, e então vereis aumentar o número de hortas, aumentar a sua superfície e melhorar os resultados. A União Comunista da Juventude deve participar activamente. Cada união ou cada célula da União deve considerar esta tarefa como sua tarefa.

A União Comunista da Juventude deve ser um grupo de choque que em qualquer trabalho dá a sua ajuda e manifesta a sua iniciativa e espírito empreendedor. A União deve ser tal que qualquer operário veja nela pessoas cuja doutrina talvez lhe seja incompreensível, em cujas ideias talvez não acredite imediatamente, mas em cujo trabalho real e em cuja actuação veja que são realmente pessoas que lhe indicam o caminho certo.

Se a União Comunista da Juventude não souber organizar assim o seu trabalho em todos os domínios, isso significa que se desvia para o antigo caminho burguês. Precisamos de unir a nossa educação à luta dos trabalhadores contra os exploradores para ajudar os primeiros a cumprir as tarefas que decorrem da doutrina do comunismo.

Os membros da União devem consagrar todas as suas horas livres a melhorar as hortas, ou a organizar em qualquer fábrica a instrução da juventude, etc. Queremos transformar a Rússia de um país pobre e miserável num país rico. E é necessário que a União Comunista da Juventude una a sua formação, o seu ensino e a sua educação ao trabalho dos operários e dos camponeses, que não se feche nas suas escolas nem se limite a ler livros e brochuras comunistas. Só no trabalho com os operários e os camponeses se pode chegar a ser verdadeiro comunista. E é preciso que todos os que entram para a União da Juventude sejam instruídos e, ao mesmo tempo, saibam trabalhar. Quando todos virem como expulsámos da velha escola o velho amestramento, substituindo-o por uma disciplina consciente, como cada jovem participa nos sábados comunistas, como utiliza cada exploração suburbana para ajudar a população, o povo olhará o trabalho de modo diferente do que olhava antes.

É tarefa da União Comunista da Juventude organizar na sua aldeia ou no seu bairro a ajuda numa obra - tomarei um pequeno exemplo – como assegurar a limpeza ou a distribuição de comida. Como se fazia isto na velha sociedade capitalista? Cada qual trabalhava só para si, ninguém se preocupava se havia velhos ou doentes, ou se todos os trabalhos da casa recaíam sobre os ombros da mulher, que se encontrava por isso oprimida e escravizada. Quem tem o dever de lutar contra isto? As uniões da juventude, que devem dizer: nós transformaremos isto, organizaremos destacamentos de jovens que ajudarão a assegurar a limpeza ou a distribuição de comida, percorrendo sistematicamente as casas, que actuarão organizadamente para o bem de toda a sociedade, repartindo acertadamente as forças e mostrando que o trabalho deve ser um trabalho organizado.

A geração cujos membros têm agora cerca de 50 anos não pode esperar ver a sociedade comunista. Esta geração terá morrido antes. Mas a geração que tem hoje 15 anos verá a sociedade comunista e será ela que construirá ela própria esta sociedade. E deve saber que toda a tarefa da sua vida é a construção dessa sociedade. Na velha sociedade, o trabalho fazia-se por famílias isoladas e ninguém o unia a não ser os latifundiários e capitalistas, que oprimiam as massas do povo. Nós devemos organizar todos os trabalhos, por mais sujos ou difíceis que sejam, de modo que cada operário e camponês se veja a si próprio deste modo: sou uma parte do grande exército do trabalho livre e saberei organizar a minha vida sem latifundiários nem capitalistas, saberei estabelecer a ordem comunista. É preciso que a União Comunista da Juventude eduque todos, desde muito jovens(1*), no trabalho consciente e disciplinado. Eis de que modo podemos esperar que sejam realizadas as tarefas que hoje se colocam. Devemos ter em conta que serão necessários pelo menos 10 anos para electrificar o país, para que a nossa terra depauperada possa ter ao seu serviço as últimas conquistas da técnica. A geração que tem actualmente 15 anos e que dentro de 10-20 anos viverá na sociedade comunista deve organizar todas as tarefas da sua instrução de maneira que cada dia, em qualquer aldeia, em qualquer cidade, a juventude cumpra na prática uma ou outra tarefa do trabalho comum, por muito pequena, por muito simples que seja. À medida que isto se realize em cada aldeia, à medida que se desenvolva a emulação comunista, à medida que a juventude demonstre que sabe unir o seu trabalho, à medida que isso se verifique, ficará assegurado o êxito da edificação comunista. Só considerando cada um dos seus passos do ponto de vista de êxito dessa construção, só perguntando a si própria se fizemos tudo para sermos trabalhadores unidos e conscientes, a União Comunista da Juventude conseguirá agrupar o meio milhão dos seus membros num só exército do trabalho e granjear o respeito geral. (Uma tempestade de aplausos).

Início da página

Notas de rodapé:

(N206) Lénine refere-se a conceitos alheios ao marxismo, difundidos sob a denominação da «cultura proletária» pelos membros da organização cultural e educativa Proletkult. Tendo aparecido ainda em Setembro de 1917 como organização independente, a Proletkult continuava a defender a sua «independência» mesmo depois da Revolução de Outubro, opondo-se desta maneira ao Estado proletário. Os membros da Proletkult negavam de facto a herança cultural do passado, tentavam isolar-se das tarefas do trabalho cultural e educativo entre as massas e procuravam criar, desligados da realidade por «via laboratorial» uma «cultura proletária» especial. Reconhecendo em palavras o marxismo, o ideólogo principal da Proletkult, A. A. Bogdánov, defendia de facto uma filosofia idealista subjectivista machista. A Proletkult não era uma organização homogénea, pois incluía, além de intelectuais burgueses que ocupavam posições dirigentes em muitas das suas organizações, também jovens operários que desejavam sinceramente promover o desenvolvimento cultural no Estado Soviético. As organizações da Proletkult tiveram o seu maior desenvolvimento em 1919, tendo entrado em decadência no princípio da década de 1920; em 1932 a Proletkult deixou de existir. (retornar ao texto)

(1*) No Pravda nº 223, de 7 de Outubro de 1920, em vez das palavras «desde muito jovens» aparecem as palavras «desde os doze anos». (N. Ed.) (retornar ao texto)
Fonte