O Sindicato dos Bancários de Brasília lançou neste mês de novembro sua revista, Extratos, voltada aos trabalhadores do ramo financeiro.
Nela, o grande destaque é a entrevista de Adelino Cassis, primeiro presidente do Sindicato dos Bancários de Brasília, que era do PCB (Partido Comunista do Brasil) já antes da cisão de 1962, e que seguiu no PCB (Partido Comunista Brasileiro), acompanhando a direção prestista. Militante exemplar e pai de Paulo Cassis, um militante também exemplar que deixou muitas saudades no PC do B, Adelino Cassis conta histórias muito relevantes sobre o sindicato das nossa categoria, e inclusive resgata momentos da Federação Sindical Mundial.
Reproduzimos integralmente a entrevista e recomendamos que visitem e baixem a Revista Extratos na íntegra:
Nela, o grande destaque é a entrevista de Adelino Cassis, primeiro presidente do Sindicato dos Bancários de Brasília, que era do PCB (Partido Comunista do Brasil) já antes da cisão de 1962, e que seguiu no PCB (Partido Comunista Brasileiro), acompanhando a direção prestista. Militante exemplar e pai de Paulo Cassis, um militante também exemplar que deixou muitas saudades no PC do B, Adelino Cassis conta histórias muito relevantes sobre o sindicato das nossa categoria, e inclusive resgata momentos da Federação Sindical Mundial.
Reproduzimos integralmente a entrevista e recomendamos que visitem e baixem a Revista Extratos na íntegra:
Corria setembro de 1960, ano de fundação da capital federal, quando um grupo de bancários, reunidos em assembleia, lavrou a ata de fundação da Associação Profissional dos Empregados em estabelecimentos Bancários de Brasília. Um ano depois, mais precisamente no dia 23 de novembro de 1961, resultado direto do envolvimento dos cerca de 400 bancários que residiam em Brasília, nascia o Sindicato dos Bancários.
À frente do movimento, Adelino Cassis, seu primeiro presidente.
A trajetória de luta de Adelino, funcionário aposentado do Banco do Brasil, começou bem antes, 20 anos antes da fundação do Sindicato, ainda sob o governo de Getúlio Vargas, como dirigente do Partido Comunista - o chamado “Partidão”. Coleciona lutas e vitórias, como a conquista do direito à jornada de 6 horas na primeira greve organizada pelo Sindicato ainda em 1961, o fim do trabalho aos sábados, abonos semestrais nos salários e o anuênio.
O golpe de 64, contudo, atravessou o caminho do movimento sindical. E, como tantos outros, Adelino foi perseguido pelos militares, demitido e preso. “Um fato traumático”, nas palavras do ex-presidente do Sindicato.
Na entrevista a seguir, que foi realizada em duas etapas (a primeira em 2004 e a segunda no início de novembro de 2009), Adelino rememora toda a sua vida de dedicação à causa dos trabalhadores, os bons e os maus momentos. Agora, após 48 anos de fundação do Sindicato e com 87 anos de idade, Adelino afirma, orgulhoso:
“Faria tudo outra vez”.
Extratos: Como foi o início da suamilitância?
Adelino Cassis: Eu sou de São Paulo. Na realidade eu era dirigente do Partido Comunista já exercendo as funções sindicais correlatas. Eu era funcionário do Banco do Brasil, no Rio de Janeiro, e foi lá que eu comecei minha militância sindical, em 41, ainda sob Getúlio Vargas. Nessa condição eu fui cooptado pelo Sindicato dos Bancários para participar das lutas locais.
Nessa época eu também conduzia uma revista voltada do Sindicato dos Bancários, mas que trazia temas de interesse dos trabalhadores como um todo. Quando ainda estava no Rio eu participei de um congresso da Federação Sindical Mundial, em 47. Na realidade eu sempre fui sindicalista, fosse como simples militante, fosse ocupando posições de destaque dentro do movimento sindical.
Mas aí aconteceu um fato novo, um fato traumático, não só para mim, mas para todos que o viveram, que foi a ditadura militar.
Extratos: Que congresso foi esse? Onde aconteceu?
Cassis: Foi o 4º congresso da Federação Sindical Mundial foi em 1947, logo depois da Segunda Guerra Mundial. Aconteceu em Leipzig, na Alemanha, na parte da Alemanha que ti nha virado socialista durante a guerra. A minha militância era muito ostensiva, então eu logo comecei a fazer parte da Federação. Eu não me limitava à militância sindical bancária, era também militante político e militava no movimento sindical geral. Entre os que militavam comigo naquela época, existiam pessoas que se projetaram depois como pessoas importantes no meio sindical e algumas até que compõem hoje o governo Lula.
Extratos: O senhor se envolveu na Campanha “O petróleo é nosso”?
Cassis: “O petróleo é nosso” na verdade era o lema da Campanha do Petróleo, que lutava pela nacionalização das reservas de petróleo descobertas no nosso país em meados dos anos 30. Ela mobilizou vários setores da sociedade da época, e eu, que já era militante do Partido Comunista nessa época, participei também, pois essa era uma bandeira que nós levantávamos naquele tempo. A campanha foi muito bem sucedida, ganhou muit
a notoriedade, e resultou na criação da Petrobrás.
Extratos: Quando e como o senhor veio para Brasília?
Cassis: Vim pra Brasília em 61, transferido pelo Banco do Brasil. Vim para cumprir uma missão políticossindical. Tinha interesse em vir para cá por causa do movimento sindical. Quando eu cheguei aqui, o lugar era um enorme canteiro de obras. Apenas partes da Asa Sul já estavam concluídas.
Extratos: Como foi o movimento de fundação do sindicato dos bancários?
Cassis: Quando nós começamos o movimento de formação do Sindicato, havia cerca de 400 bancários aqui em Brasília. Havia pessoas de vários bancos, mas a maioria trabalhava no BB. O Sindicato foi fundado em 23 de Novembro de 1961, foi
quando nós conseguimos a Carta Sindical. Eu fazia parte daquele contexto, daquele grupo que deu origem ao Sindicato, e fui eleito, na primeira eleição que ocorreu, para presidente do Sindicato, em 1961. Meu mandato era de três anos. Mas houve vári
as personalidades envolvidas na criação do Sindicato, inclusive figuras que hoje têm destaque no governo Lula.
Extratos: Como era a participação do Sindicato dos Bancários na época do João Goulart?
Cassis: Para começo de conversa, o Jango era do Partido Comunista, do qual eu e várias outras militâncias do movimento sindical fazíamos parte. Foi um período de muito entusiasmo, de muita efervescência política. O Jango tinha um projeto ambicioso, das reformas de base, do qual nós participamos. Por isso, pode-se dizer que o Sindicato dos Bancários estava envolvido, trabalhando nesse projeto.
Também foi um período no qual nós gozamos de total liberdade para nossas atividades sindicais propriamente ditas.
Extratos: A greve de 61 foi a primeira organizada pelo Sindicato. Como foi esse momento?
Cassis: Foi uma luta sindical envolvendo sindicatos do país inteiro, uma grande mobilização. A conquista da jornada de trabalho de seis horas para os bancários foi obtida nessa greve, que aqui durou dezessete dias. Aconteciam grandes assembléias do movimento sindical. Foi uma grande greve, vitoriosa, que teve como ponto de partida onde hoje é o Conjunto Nacional. Já nessa época havia várias entidades e agentes pelegos infiltrados na greve, pessoas que vinham para desagregar a parte legítima da greve, atendendo a interesses de terceiros.
Extratos: E o golpe militar de 1964? O senhor foi demitido, preso?
Cassis: Sim, fui demitido sumariamente do Banco do Brasil. À época, o presidente era o Castelo Branco. Como eu era conhecido pela minha atuação dentro da luta política e da luta sindical, acabei sendo perseguido por aqueles fascistas.
No início da ditadura, a luta sindical era ostensiva, ou seja, ainda era feita na legalidade. Mas o Partido Comunista já era ilegal, clandestino, e foi por causa dele que eu fui preso. Eles me pegaram ali no Edifício Palácio do Comércio, no início da W3 Sul. Eu fiquei preso por cerca de dois meses. Fui mantido preso no Batalhão da Guarda Presidencial, o BGP.
Minha casa foi invadida várias vezes pelos militares. Eles levaram uma série de documentos meus. Em minha casa havia uma bíblia, em árabe, que os militares tomaram acreditando que era uma edição em árabe de O Capital.
Extratos: Demitido e perseguido, no período da ditadura, como ficaram as coisas?
Cassis: Na época da ditadura, desempregado, houve muito sofrimento material. Tanto para mim como para minha família. Os bancários de Brasília se cotizaram para permitir minha sobrevivência. Foi assim que eu mantive a família. Depois de um tempo eu acabei montando um restaurante. Ficava no Setor Comercial Sul e se chamava O Tabuleiro da Baiana.
Na verdade, eu consegui abrir esse restaurante graças a essa ajuda dos bancários. Não era apenas eu que estava nessa situação. Várias outras lideranças também foram afastadas de seus empregos, perseguidas pelo regime.
Nessa época, do restaurante, eu e minha família sofríamos ameaças o tempo inteiro.Os policiais iam lá, comiam, bebiam e saíam sem pagar a conta. Eles me ameaçavam, de forma sutil, mas ameaçavam.
Extratos: Houve resistência à ditadura por parte dos bancários de Brasília?
Cassis: Houve uma luta de resistência dos bancários contra o regime militar, mas ela foi relativa. Ninguém chegou a pegar em armas para enfrentar o regime. Nessa época, tudo o que se relacionava com o movimento sindical era proibido e perseguido pelo regime.
Aí veio o AI-5, em 1968, e as coisas pioraram bastante. Mesmo nessa época havia movimento sindical, ainda que ele fosse totalmente clandestino. Não podia ser ostensivo. Uma parte desse movimento se desenvolveu no edifício Arnaldo Villares, onde ficava nossa antiga sede.
Extratos: Como foi o movimento de reconstrução, ou melhor, retomada, do sindicato dos bancários?
Cassis: Os pelegos indicados pelo regime militar ficam no Sindicato de 64 até os anos 70. Além de perseguir as lideranças sindicais legítimas, históricas, os militares ainda nomearam interventores que geriram o Sindicato durante esse período. A retomada do sindicato da mão dos pelegos foi organizada nos bastidores, pelo Partido Comunista, o “Partidão”, que liderava não só a retomada dos sindicatos, mas também os movimentos pela anistia, pela reabertura etc. Eu participei da construção das lutas desse período.
Extratos: O senhor chegou a fundar uma comissão de anistiados do Banco do Brasil. Como foi esse período da sua reintegração ao Banco?
Cassis: Na verdade, nós não criamos oficialmente porque tal coisa era proibida pelo regime. Mas nós, junto com o Partido Comunista, organizamos um movimento para lutar pela anistia e para ajudar as lideranças que foram perseguidas. Havia também uma associação de luta pela anistia, que durou até 1979, quando a anistia foi concedida.
Eu não fui reintegrado, eu apenas voltei a trabalhar no BB. A reintegração propriamente dita envolve uma série de direitos e de benefícios que me foram negados.
Extratos: O senhor conheceu o Luís Carlos Prestes?
Cassis: Sim, durante um longo tempo, pois nós trabalhamos em várias iniciativas juntos. Eu também conheci Anita (Anita Leocádia) no movimento pela anistia política. Eu e o Prestes mantivemos correspondência durante muitos anos, praticamente até a morte dele. Tenho várias cartas dele guardadas aqui em casa.
Extratos: O senhor se lembra de um debate da CUT, do qual participaram você, o Lula e o Luís Carlos Prestes?
Cassis: Sim, isso aconteceu em 1987. Eu tinha uma ligação pessoal com o Lula, que nós construímos durante as várias iniciativas das quais participamos juntos. Nós trabalhamos no restabelecimento da democracia, tanto dentro quanto fora da CUT.
Extratos: Valeu a pena essa vida toda de lutas?
Cassis: Para mim valeu, apesar de todas as dificuldades. Esse período democrático que nós desfrutamos hoje se deve em parte aos nossos esforços, durante aqueles dias turbulentos.
Hoje eu vejo os frutos das nossas lutas e me sinto orgulhoso disso tudo. Não me arrependo, e se pudesse faria tudo outra vez.
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