Na minha escola tem uma colega de trabalho que todos gostam muito. O apelido dela é Favela. Não vou dizer o nome real para protegê-la. Terceirizada, Favela faz de tudo um pouco: limpeza, cozinha, lanche dos alunos, o cafezinho. Basta ela aparecer na porta da sala com o lanche na bandeja, e os alunos gritam "colé, Favela!". Ela responde com um "é nós". Bem-humorada, vive fazendo piadas, imitando as pessoas e contangiando o ambiente com boas gargalhadas.
Favela se queixou comigo na semana retrasada que estava sem receber salário. Que não tinha dinheiro de transporte e para fazer as compras no supermercado. Favela recebe salário mínimo. Mesmo assim, atrasado. Favela está puta da vida porque muitas vezes ela precisa mudar de empresa terceirizada porque não pagam seus benefícios direito, como INSS e FGTS. Acaba ficando sem férias por causa dessa artimanha de mudanças constantes de empregador.
Favela veio conversar comigo também sobre a greve geral, ou melhor, paralisação geral que fizemos no dia 15 de março. Ela queria ir, estava sem receber salário, mas estava com medo de ser demitida e deixar o neto - sim, Favela é avó - sem ajuda. Favela é chefe de família, negra, os filhos e o neto dependem dela.
Falei pra Favela que eu iria participar, juntamente com a minha categoria de professores, não somente da paralisação do dia 15, mas de dez dias de greve geral aprovada em assembleia, pois a reforma da previdência vai acabar com nossos direitos até de se aposentar. Ela desejou boa sorte a todos nós. Olhar de cumplicidade, de solidariedade de classe.
Ontem, dia 22 de março de 2017, Rodrigo Maia, o presidente da Câmara dos Deputados, desengavetou um projeto já aprovado no Senado em 1998, que estabelece terceirização geral e irrestrita, articulou com a base do governo Temer, encaminhou, votou e aprovou o retrocesso das leis trabalhistas no Brasil. O horizonte é devastador: diminuição de salários, fim dos concursos públicos, precarização das leis trabalhistas, muita pobreza e miséria.
Eu só consigo me lembrar de Favela. Das suas dificuldades de ser uma funcionária terceirizada, que recebe um salário baixo, acumula diversas funções, não tem recolhimento regular de INSS, FGTS, raramente tira férias e precisa de indicação para conseguir e se manter no emprego. Que corre o risco de morrer sem se aposentar. Favela se revolta e quer lutar, mas a necessidade fala mais alto. Mas Favela não desiste e continua trabalhando.
Agora, com a nova lei de terceirização aprovada, seremos todos Favela. Professores, profissionais de saúde, concursados, toda e qualquer profissão. E, sendo Favela, vamos nos unir. Quando a Favela descer, não aguentar mais tanta opressão, vamos partir pra cima e lutar. Esse dia vai chegar.
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