Karen Fernandez Costa
As instituições políticas e a mediação
por elas realizada entre as tendências da economia internacional e o
cenário político-econômico doméstico constituem aspecto fundamental para
a compreensão das potencialidades, desafios e impasses da trajetória de
desenvolvimento dos países. No caso brasileiro, algumas instituições
cumprem papel notável neste processo. Destaca-se no país o Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), instituição que,
em 2011, concedeu R$ 139,7 bilhões em empréstimos e que neste ano
chegou ao seu sexagésimo aniversário.
Fundado em 1952, a criação do BNDES ocorreu num contexto em que a tendência era fundar bancos de desenvolvimento para viabilizar a industrialização dos países periféricos. No entanto, ele se diferenciou por, ao contrário das instituições análogas, ter resistido às mudanças no contexto internacional e nacional, especialmente às reformas liberalizantes.
Em seu nascimento, a função do BNDE (à época sem o S, de Social) era a de realizar um programa de reaparelhamento e fomento das atividades de infraestrutura do país e de promover o desenvolvimento econômico. No governo JK, o BNDES foi o grande agente financeiro e o órgão chave do Plano de Metas, além de ter antecipado muitas das medidas que compuseram este plano. No pós-1964, foi reconhecido como principal instrumento de execução da política de investimento do Governo Federal e direcionou-se, já em 1968, para o setor privado nacional. No II PND, quando o Governo Geisel pretendeu intensificar o programa de substituição de importações e a empresa privada nacional passa a ser vista como prioritária pelo governo, o BNDES promovia a industrialização pesada e concebia a empresa privada nacional como foco de sua atuação.
Na década de 1980, quando estouraram no Brasil a crise da dívida e o problema da inflação, o BNDES viveu momentos de ausência de orientação política na concessão de financiamentos. No entanto, o Banco formulou uma estratégia (a Integração Competitiva) independente do Governo Federal, antecipando muitas medidas que posteriormente compuseram os Planos de Governo de Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso.
A Integração Competitiva tinha como pressupostos: a abertura da economia, com o objetivo de estimular a competitividade, o fim da proteção tecnológica, da reserva de mercado e da diferenciação entre capital nacional e capital estrangeiro; as privatizações, para melhorar a eficiência e liberar recursos para outros setores e a competitividade dos serviços. Havia, por trás desta plataforma, uma estratégia de desenvolvimento de médio e longo prazo.
Não foi esta a linha implementada nos governos Collor e Itamar e no primeiro mandato de FHC. Nesse último período, a instituição foi pouco capaz de pautar a agenda governamental, agiu de forma compensatória à política macroeconômica e não buscou viabilizar ou redefinir uma estratégia de desenvolvimento de médio e longo prazo.
Na segunda gestão de FHC, o BNDES instituiu fundos para incentivar pequenas empresas de base tecnológica, mas as iniciativas foram limitadas tanto do ponto de vista dos recursos despendidos como da importância e visibilidade que obtiveram no interior e fora da instituição. Nos anos 1990, o banco foi incapaz de impulsionar, junto a outros atores relevantes como, por exemplo, o Ministério do Planejamento e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, a priorização de temas relacionados à política industrial e aos investimentos em infraestrutura na agenda governamental. De modo geral, agiu a reboque das prioridades da Fazenda/Banco Central e foi “estratégico” para viabilizar o que era emergencial ao governo (o ajuste fiscal, por exemplo).
A partir de 2003 e, especialmente da gestão de Luciano Coutinho no BNDES, foram retomados aspectos que permaneciam na sua agenda interna. Foi recuperada a perspectiva de formular e implementar políticas de desenvolvimento e foram elaborados planos de política industrial (Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior – PITCE e a Política de Desenvolvimento Produtivo) que traziam a perspectiva de se investir em setores estratégicos e de priorizar a inovação. Assim, o Banco, além do papel anticíclico fundamental na crise de 2008, passou a protagonizar iniciativas de incentivo à inovação, ao desenvolvimento tecnológico e a setores estratégicos.
A trajetória do BNDES permite a elucidação de aspectos fundamentais do percurso do desenvolvimento brasileiro e mostra que ele continuará a ser peça chave nos rumos do país.
___________________________________________________________________________________Fundado em 1952, a criação do BNDES ocorreu num contexto em que a tendência era fundar bancos de desenvolvimento para viabilizar a industrialização dos países periféricos. No entanto, ele se diferenciou por, ao contrário das instituições análogas, ter resistido às mudanças no contexto internacional e nacional, especialmente às reformas liberalizantes.
Em seu nascimento, a função do BNDE (à época sem o S, de Social) era a de realizar um programa de reaparelhamento e fomento das atividades de infraestrutura do país e de promover o desenvolvimento econômico. No governo JK, o BNDES foi o grande agente financeiro e o órgão chave do Plano de Metas, além de ter antecipado muitas das medidas que compuseram este plano. No pós-1964, foi reconhecido como principal instrumento de execução da política de investimento do Governo Federal e direcionou-se, já em 1968, para o setor privado nacional. No II PND, quando o Governo Geisel pretendeu intensificar o programa de substituição de importações e a empresa privada nacional passa a ser vista como prioritária pelo governo, o BNDES promovia a industrialização pesada e concebia a empresa privada nacional como foco de sua atuação.
Na década de 1980, quando estouraram no Brasil a crise da dívida e o problema da inflação, o BNDES viveu momentos de ausência de orientação política na concessão de financiamentos. No entanto, o Banco formulou uma estratégia (a Integração Competitiva) independente do Governo Federal, antecipando muitas medidas que posteriormente compuseram os Planos de Governo de Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso.
A Integração Competitiva tinha como pressupostos: a abertura da economia, com o objetivo de estimular a competitividade, o fim da proteção tecnológica, da reserva de mercado e da diferenciação entre capital nacional e capital estrangeiro; as privatizações, para melhorar a eficiência e liberar recursos para outros setores e a competitividade dos serviços. Havia, por trás desta plataforma, uma estratégia de desenvolvimento de médio e longo prazo.
Não foi esta a linha implementada nos governos Collor e Itamar e no primeiro mandato de FHC. Nesse último período, a instituição foi pouco capaz de pautar a agenda governamental, agiu de forma compensatória à política macroeconômica e não buscou viabilizar ou redefinir uma estratégia de desenvolvimento de médio e longo prazo.
Na segunda gestão de FHC, o BNDES instituiu fundos para incentivar pequenas empresas de base tecnológica, mas as iniciativas foram limitadas tanto do ponto de vista dos recursos despendidos como da importância e visibilidade que obtiveram no interior e fora da instituição. Nos anos 1990, o banco foi incapaz de impulsionar, junto a outros atores relevantes como, por exemplo, o Ministério do Planejamento e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, a priorização de temas relacionados à política industrial e aos investimentos em infraestrutura na agenda governamental. De modo geral, agiu a reboque das prioridades da Fazenda/Banco Central e foi “estratégico” para viabilizar o que era emergencial ao governo (o ajuste fiscal, por exemplo).
A partir de 2003 e, especialmente da gestão de Luciano Coutinho no BNDES, foram retomados aspectos que permaneciam na sua agenda interna. Foi recuperada a perspectiva de formular e implementar políticas de desenvolvimento e foram elaborados planos de política industrial (Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior – PITCE e a Política de Desenvolvimento Produtivo) que traziam a perspectiva de se investir em setores estratégicos e de priorizar a inovação. Assim, o Banco, além do papel anticíclico fundamental na crise de 2008, passou a protagonizar iniciativas de incentivo à inovação, ao desenvolvimento tecnológico e a setores estratégicos.
A trajetória do BNDES permite a elucidação de aspectos fundamentais do percurso do desenvolvimento brasileiro e mostra que ele continuará a ser peça chave nos rumos do país.
Karen Fernandez Costa é Doutora em Ciência Política pela Unicamp, pesquisadora do INCT-Ineu e professora da Escola Paulista de Política, Economia e Negócios (EPPEN) da Unifesp.
*http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=2877:catid=28&Itemid=23