O Sr. Temer é um político muito limitado. Sobressaiu-se porque a média do mundo político tem baixíssima estatura. Seus valores e objetivos são rasteiros. Contudo, é capaz de organizar um pequeno grupo (muito coeso) que lidera centenas de parlamentares.
Por João Sicsú*
Foto: Beto Barata/PR
Há uma enorme equivalência: qualquer um dos seus liderados poderia ser o Sr. Temer e o Sr. Temer poderia ser um dos seus. São todos absolutamente idênticos. Essa horizontalidade é um grande facilitador na relação entre todos eles.
O Sr. Temer, o seu grupo e seus liderados nunca tiveram um projeto para o Brasil. Podemos imaginar uma pergunta sobre o que desejaria para a sociedade brasileira feita ao Sr. Rodrigo Rocha Loures. A resposta seria a mudez do entrevistado por avaliar que o tema é irrelevante ou extemporâneo.
O Sr. Temer e os seus foram presas fáceis de quem tem projeto. Quem tem projeto para o Brasil é o sistema financeiro, as multinacionais e os rentistas. Os materializadores desse projeto para o mundo político são os economistas ligados ao PSDB. Não é um projeto do PSDB, esse partido dito da social-democracia acabou faz anos.
O Sr. Temer e os seus estão aprovando no Congresso propostas que visam a uma profunda transformação econômica e social do País. Não avaliam que o desemprego de mais de 14 milhões de trabalhadores deve ser combatido com ampla política de estímulo ao consumo e de gastos públicos.
A única política econômica que fazem é a das altas taxas de juro que dizem visar ao controle da inflação. Não acreditam em políticas macroeconômicas voltadas para o desenvolvimento. Não acreditam em desenvolvimento de países chamados, preconceituosamente, de periféricos. Seu grande modelo econômico e social é a austeridade.
Temer e seus liderados avançam em várias propostas pontuais (ou microeconômicas). São as reformas trabalhista e da Previdência e a Lei da Terceirização. Desmontam programas sociais: o Minha Casa Minha Vida, o Farmácia Popular, o Mais Médicos... Desmontam os bancos públicos. Elevam as taxas de juro dos financiamentos da Caixa e do Banco do Brasil. Definham o BNDES, reduzindo seu fundo de empréstimos, e querem elevar a taxa de juros dos seus financiamentos. Privatizam partes da Petrobras e entregam o controle da exploração do petróleo a multinacionais. Possibilitam a estrangeiros a aquisição de terras e a exploração de todos os seus recursos naturais.
O Brasil está quase de volta ao passado colonial, só não voltamos de verdade porque há uma impossibilidade físico-temporal. Mas a arquitetura é a mesma: o Brasil será uma colônia de exploração e os países desenvolvidos, especialmente os Estados Unidos, serão a Coroa. Hoje, a dominação não é político-administrativa e bélica. O que existe é uma dominação cultural e uma relação de subordinação aceita, valorizada e defendida pela elite econômica e financeira brasileira.
O sonho de banqueiros brasileiros é financiar a exploração da colônia para aumentar seus lucros. O desejo das empresas multinacionais é explorar, transportar, beneficiar e comercializar o que é extraído da colônia. O sonho do Sr. Temer e de seus liderados é serem tais como eram donatários de capitanias hereditárias. Os donatários faziam a justiça, organizavam a exploração e roubavam a Coroa. E o sonho de um economista ligado ao PSDB é morar na Coroa dando aula numa universidade americana e ser reconhecido pelo sistema financeiro que tem base nos EUA.
Seremos um país com Estado fraco, sem interesses sociais e nacionais. Aos brasileiros restará trabalhar sob escravização moderna – não racializada, com baixos salários e sem qualquer sistema de seguridade social. Não haverá mais aposentadoria. O Estado não empregará recursos para reduzir a vulnerabilidade social. Os rentistas abocanharão os superávits orçamentários e endividarão ainda mais o Estado. Teremos um pequeno mercado doméstico de consumo com produtos manufaturados importados da Coroa.
A economia brasileira adormecerá na depressão que se encontra. Mas isso não é considerado relevante pelos ideólogos da austeridade. Afinal, a economia brasileira estará voltada para o mercado externo.
Vamos exportar cada vez mais produtos com baixo valor agregado: petróleo bruto, madeira, milho em grãos, carnes bovina e suína, açúcar bruto, soja e minério de ferro. É necessário lembrar que o trabalho compulsório não remunerado, o latifúndio, a monocultura e a produção para o mercado externo eram as características da economia do Brasil colonial do passado.
Por ironia da história, enquanto o Brasil está caminhando em direção ao passado colonial, sua antiga Coroa, Portugal, tenta se libertar dos programas de austeridade impostos em 2011 pelo FMI, Banco Central Europeu e Comissão Europeia. Em Portugal, houve redução dos direitos trabalhistas, diminuição dos salários dos funcionários públicos, subtração de direitos sociais, diminuição do valor dos benefícios sociais e privatizações.
A austeridade fez Portugal aumentar as exportações, reforçando a competitividade através da redução salarial. A estratégia de especialização econômica intensificou o modelo tradicionalmente dominante da economia portuguesa – baixos salários para produção de bens de consumo com pouco valor agregado. A austeridade portuguesa foi muito parecida com o programa atual que o Brasil está mergulhando.
Em Portugal, desde 2016 com o governo do Partido Socialista e partidos de esquerda, já houve recomposição dos salários dos funcionários públicos, redução da jornada de trabalho do funcionalismo e aumento do valor das aposentarias e pensões. E o desemprego está em queda. O Sr. Temer faz o Brasil caminhar para onde Portugal chegou e já está voltando.
A reação de Portugal é um exemplo a ser seguido tanto do ponto de vista das suas alianças políticas quanto em relação às propostas econômicas e de recomposição do Estado de Bem-Estar Social.
Fonte: Carta Capital
Nenhum comentário:
Postar um comentário