Ser comunista é uma opção cotidiana.
Diógenes Arruda
Em meio a tantas tristezas, precisamos sim celebrar nossas alegrias. Por isso, parabéns, queridos e queridas camaradas comunistas do Brasil que compartilhamos nosso 99o. aniversário.
O ano que inicia com o aniversário dos 99 anos do PCdoB coincide com meus 30 anos de Partido, em que ingressei por iniciativa própria com apenas 14 anos, filiação interna, em maio de1991. Eu era um adolescente, fui à sede para fazer um trabalho escolar sobre a Ditadura, pedido pelo meu professor Cícero, do Salomé Bastos.
Página que sobrou do meu trabalho de Geografia no Salomé Bastos em maio de 1991, quando entrei no Partido. Entrevista com Cabo Chico.Naquela tarde, em que eu saía todo pabo da Barra do Ceará "pru centru", fui recebido pelo Silvinho, pela Meire Costa, aqueles que foram os primeiros militantes do PCdoB que conheci. Eram, sim funcionários do Partido, mas eram sobretudo militantes de corpo e alma, e me receberam com atenção, abrindo-me as portas da compreensão política e do nosso país e da democracia. Deram-me as teses do 8o. Congresso, que ocorreria em fevereiro de 1992, e marcaram com um dos mais experientes quadros do Partido, Cabo Chico, agrimensor, organizador de sertanejos, ex-cabo, fino articulador. Ele me recebeu uns dias depois na sede que ficava então na Rua São Paulo, no Centro de Fortaleza.
E o Cabo Chico me contou o sentido da Ditadura, a violência, o arbítrio, o que vivera jovem ainda. Eu achei a sede legal, achei o pessoal massa e achei o papo bom. Os textos, achei bem embasados, passei a entender umas coisas que não entendia, mas queria entender e me filiei. Mas, naquela oportunidade mesmo, disseram-me:
- Você precisa conhecer a UJS.
- UJS?
- É, a UJS, vou te passar um contato.
Eu achei estranho. Por que o Partido era Comunista e a Juventude Socialista? Naquele momento mesmo o Partido me dava uma aula pela boca do Silvinho: pela minha juventude, pela escola que era, o meu lugar era a UJS. E lá fui eu.
Liguei num telefone público de ficha na Mozart Lucena, Nova Assunção. Falei com o Huston, (fiquei impressionado, o "diretor de Imprensa" da UJS) e soube por ele de um debate no Auditório Castelo Branco, da Reitoria da UFC sobre a crise do Socialismo e o 8o. Congresso. Cada lugar novo ampliava o horizonte do secundarista, e foi lá que tomei a palavra pela primeira vez no Partido, nervoso, guiado um papelzinho com minha pergunta/resposta anotada - já dei minha opinião sobre se aquela União Soviética era mesmo socialista. Na mesa estava a Gilse Cosenza e lá conheci meu amigo Flávio Arruda, que me apresentou a UJS e o movimento estudantil cearense.
Naqueles tempos tormentosos, vi o Partido reafirmar a bandeira do socialismo quando a União Soviética e o campo socialista ruíam. No ano seguinte, e depois com o Fora Collor, aprendi o que era fazer história, e entendi o poder do coletivo e a responsabilidade do indivíduo. Foi assim que tudo começou para mim.
Havia desde então forte campanha contra a China. Mesmo assim, resistimos ao anticomunismo e já éramos tachados de dinossauros. E avançamos na luta contra o neoliberalismo e contra o anticomunismo. Conheci uma galera, jovens como eu, que sabia que o capitalismo presente é um regime do passado. Com Cazuza ouvíamos, O Tempo Não Para, cantávamos Saudações a Quem Tem Coragem e dizíamos: O Socialismo Vive. Com Legião Urbana cantamos Fábrica, Quem é o Inimigo, Quem é Você?, Eduardo e Mônica, Que País é Esse?, Tempo Perdido e Geração Coca-cola. Mas também era comum sentarmos sob a luz da noite alencarina e ouvirmos os violões de Paulo Renato, ou de Marquinhos, recitando poemas, dando beijos de amor, conversando sobre a vida, fazendo a luta, e tomando uma cachacinha entre amigos cujo carinho e confiança jamais me faltaram. Naquelas noites mornas e cheias de brisa da capital cearense, aprendemos as canções de Paulinho Pedra Azul, Clube da Esquina, Chico, Ednardo, Alceu, Belchior e Zé Ramalho, uma trilha musical que acompanhou nossas vidas, os versos, canções, lágrimas, gritos e lutas que foram se acumulando até deixarmos de ser jovens. Assim a gente se formou para libertar o Brasil da Ditadura, da Desigualdade e do Imperialismo.
E somava-se a luta dos(as) estudantes à luta das operárias castanheiras e do Distrital da Barra, aonde conheci gente como Rubão, Toinha, Aparecida, Aguinaldo, Antonio, Edson, Eliana, e Sílvia, que seria minha primeira namorada. Rubão, Rodrigues e Gilse e Ana Lúcia eram e são até hoje as principais referências militantes para mim.
Eu encontraria minha turma de
movimento secundarista, do Liceu e da Escola Técnica, Andréa, Zizia,
Viviane, Flávio, Marcelo, Fátima, Eduardo, Houston, Cristóvão, Bisqui,
Juliana, Neyla, Neidinha, Paulo Rogério, Aírton, Gorete, Wagner e meu
irmão Roberto dos Santos seria o líder estudantil do Hilza Diogo e da Barra do Ceará, com Mário, Gerson uma nova geração à época.
Eu conheci pessoas muito boas no Partido que, como toda coletividade sã, é diversa, tem gente real. Mas logo no começo, minha mãe, Dona Lourdes, perguntou:
- Meu filho, esse negócio de comunismo não é perigoso não?
E eu, do alto do que vira e com meus 14 anos completos, disse mais ou menos a mesma resposta que trago ainda hoje no peito, quase 30 anos depois.
- É um pessoal honesto, do povo, que não faz coisas
erradas, mas lutam pelo que é certo, pelo Brasil, e com fundamento. E eu
acho que vou ajudar as pessoas muito mais nesse Partido, que indo numa
igreja, porque eu posso ajudar a organizar o povo para lutar.
Mãe começou a conhecer o povo do Partido. Foi ver quem era. E começou a conhecer não apenas os camaradas, mas também as mães dos jovens da UJS e monitorava nossas andanças por aí. Na sede, Dona Geralda cuidava da sede e de nós, matava a fome secundarista com bolacha e café doce, e com um pouquinho da comida dela mesma. Era uma convivência intergeracional rica, conflituosa, estimulante.
Mãe respeitou minha opção, que me impulsionava tanto e até hoje me molda. Ela dizia, ao falar de uma notícia que falaram "do nosso Partido". E Dona Lourdes conhecia o Inácio, tornou-se amiga da Dra. Teresinha, "meu anjo", ela o dizia. Quando minha mãe chegava na sede era acolhida por todos com cheiros, abraços, fez-se mãe de muito comunista cearense.
Meu pai votara no Collor em 1989 (eu simpatizava com o Covas). Ao longo
dos anos, ele foi vendo não apenas o que era o Partido através de mim,
mas a nossa inserção no Esporte e no Ceará. Quando coordenei com Cássia
Damiani a sistematização da 3a. Conferência Nacional do Esporte, fui à
etapa do Ceará (eu já morava em Brasília) e meu pai estava lá,
participando. Louro Massagista, Goleiro, Árbitro, Bom Conselho, do Campo
do Quintino Cunha, ele é uma lenda do futebol cearense, trabalhador,
boleiro que jamais fez outra coisa que não o futebol. E foi lá naquele
espaço democrático conquistado na luta que ele pôde estar comigo. Algum tempo depois, quando ele partiu, vi uma coroa de flores do Partido, e soube que meu pai se filiara ao PCdoB, o "Camarada Louro".
Jamais
quisemos ganhar nada do Partido, e no entanto, ele me deu tudo que eu
sou. Desde então tenho essa convicção, essa prática, esse pensamento,
essa ética e esses camaradas. E embora tenha visitado 18 países, amado,
sofrido, lutado sempre, jamais me perdi, sempre soube pelo que lutava,
qual meu lado, quais minhas bandeiras, e estava com as pessoas que
quero, amo e respeito. Eu conheci o valor dos e das camaradas e dele
não me afasto, acredito muito na nossa capacidade de mudar o Brasil.
Por
isso eu tenho essa alegria de ser comunista, de lutar pelo Brasil, pela
democracia, pelo socialismo, pelos direitos do nosso povo, em defesa da
Ciência, da vida, do amor. É na carne, é na alma, é na vida que se
sente a alegria de ser comunista. Amazonas, Grabois, Elza Monerat,
Haroldo Lima, Helenira eram pessoas comuns e nisso residia seu heroísmo
que se achou no Partido Comunista.
E
quando eu olho o que o capitalismo faz com o mundo e com as pessoas,
como ameaça o futuro da vida, eu só reafirmo a convicção de que o
socialismo não é mero ato de vontade, mas necessidade histórica, é saída
para os dilemas atuais da Humanidade, é submeter a condução da vida à
Ciência, ao progresso e não deixar o mundo ser conduzido por
meia dúzia de rentistas degenerados numa nau sem rumo. Em meio à
tragédia e ao genocídio brasileiro, vejo a China, Cuba, Venezuela,
Coréia Popular, Vietnã, cuidando de sua gente, mostrando o caminho de paz e
cooperação num mundo ameaçado pela loucura e pela ganância capitalista. E
na ampla maioria dos casos, a vitória só veio porque havia um Partido
Comunista e camaradas à altura. Eu me sinto grato, sim, mas incompleto.
Precisamos da vitória, precisamos salvar o Brasil. Se nos armamos com a
Frente Ampla e ainda tivermos um Lula, poderemos, sim, escrever outra
História. Minha geração ainda não cumpriu sua missão, mas estamos
prontos, Manuela o prova.
É a partir desta ciência, desta vivência e desta história,
que me deparo com o ano do Centenário do PCdoB, e faço-o mais animado e
convicto que nunca. Nós venceremos esses tempos de trevas, abrindo
largas avenidas para o povo trabalhador, à juventude, às mulheres, à
cultura e ao saber, para sermos outra vez felizes e livres no Brasil que
retomaremos. E para isso precisamos de Frente Ampla, união do povo e
precisamos de um forte e influente PCdoB!
Essa foto eu não tirei, eu agitei, coordenando a agitação e com a turma da Bateria da UJS
Dona Lourdes se emocionou quando conheceu Dona Maria Prestes
A Federação Mundial das Juventudes Democráticas é levada pela UJS ao então prestigiado Itamaraty com Celso Amorim
Meu irmão e camarada, emocionante ler este relado, me faz pensar como o partido muda a vida de muitos jovens corajosos e que estão aí esperando a mudança. A opção cotidiana, é a maior demonstração de que ainda é possível um outro mundo. Parabéns
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