Só é possível compreender a história do Partido Comunista do Brasil observando em profundidade a história do Brasil. Mas também não se pode entender a história brasileira sem levar em conta a ação dos comunistas. Assim, passamos a configurar a história do Partido, que completa 100 anos no próximo dia 25 de março, na dinâmica dos grandes ciclos da história republicana. A síntese da história do Partido Comunista do Brasil se rege por esse parâmetro de íntima ligação com a história geral, mas sem abrir mão de sua própria história e prática de construção.
Por Jandira Feghali e Renato Rabelo*
Um barbeiro, um jornalista, dois funcionários públicos, um eletricista, um gráfico, dois alfaiates, um operário. Esses foram os protagonistas da fundação do Partido Comunista do Brasil. As poucas linhas de um artigo não são suficientes para listar os nomes de todos os homens e mulheres que nos permitiram chegar até aqui e comemorar. Mas permitem lembrar e homenagear sua contribuição. Nossa história é a história da união de diversos setores que se aglutinaram em defesa das liberdades democráticas, do direito ao voto para as mulheres, dos direitos para os trabalhadores e trabalhadoras e de uma sociedade onde a classe social não fosse determinante do destino de seu povo.
O caminho defendido era o da organização do proletariado em partido político independente. E, em março de 1922, esse objetivo se concretizou. Este mesmo ano viu acontecer a Semana de Arte Moderna de São Paulo, o levante tenentista do Forte de Copacabana, as comemorações do centenário da independência, o avanço da luta pelo voto feminino. Um ano de celebrações e conquistas e que viu germinar a semente da luta pela regulamentação dos direitos sociais e trabalhistas.
Tivemos o primeiro operário negro, a se candidatar a presidente da República no Brasil. Honraram-nos a presença constante de mulheres, de artistas de todas as linguagens, de trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade, de estudantes. São motivo de inspiração os que tombaram na Guerrilha do Araguaia, dando suas vidas por um Brasil livre do arbítrio.
Um partido que nasce em 1922, reafirma-se em 1962 quando vê ameaçada sua existência como organização, que tem como base teórica o marxismo-leninismo e a defesa do socialismo, e manteve firme sua identidade, natureza revolucionária e definição programática, mesmo após o fim da União Soviética e toda a luta ideológica decorrente deste acontecimento histórico.
Nosso Partido manteve sempre a lucidez e a compreensão tática combativa e flexível, encarando a importância das alianças fundamentais e transitórias para os comunistas, para o avanço da nossa luta. E ser força protagonista, nos momentos de grande refluxo e de resistência, na defesa de uma frente ampla para isolar e derrotar o inimigo principal. Assim foi no Colégio Eleitoral, quando derrotamos a ditadura militar, na própria institucionalidade imposta por seu regime, como também na ação estratégica para evitar a fragmentação do campo popular e progressista, na aprovação da federação de partidos.
Esta proposta foi encabeçada pelo grande e saudoso líder e dirigente Haroldo Lima em 1999, e estava há tempos imobilizada em sua tramitação no Congresso Nacional. Foi aprovada em 2021, tendo a garantia da sua constitucionalidade dada pelo STF, e tornou-se importante instrumento da democracia brasileira. Mais uma vez contou com o decisivo e amplo apoio de muitos aliados.
O legado à Nação de uma organização como o PCdoB aos trabalhadores e ao povo é fruto da militância revolucionária de várias gerações, nas quais estão presentes muitos heróis e mártires do povo brasileiro. Em cada geração destacam-se grupos de dirigentes e, entre eles, lideranças que conquistaram prestígio e autoridade perante o coletivo militante e junto às forças democráticas e progressistas.
O Partido sempre defendeu a paz e a solidariedade entre os povos e rechaçou a guerra e a espoliação imperialista. Sua atuação parlamentar, desde as duas últimas Constituintes do período republicano até hoje, é marcada por muitas conquistas, fruto da combatividade, pela convivência democrática e defesa categórica dos interesses da Nação e direitos do povo. Indo além, sobretudo a partir de 2003, assumiu responsabilidades em diferentes esferas de governo e contribuiu para o avanço do Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento. Destacados expoentes da cultura das artes vincularam-se ao Partido e continuam a se congregar para fortalecer a cultura brasileira.
“Um Partido orientado por um Programa Socialista situado no contexto do mundo contemporâneo, condizente com a trajetória histórica do país e inserido no curso da luta política real. O processo histórico dessa formação foi doloroso, marcado pela escravidão e pela violência, condicionado pelos interesses de uma elite colonizada. Mas a síntese é grandiosa: um povo novo, uno, com um modo original de afirmar sua identidade”, como destacado no Programa Socialista/2009.
Astrojildo Pereira, que simboliza a fundação, os presidentes Luís Carlos Prestes, João Amazonas, Renato Rabelo e na atualidade Luciana Santos, vice-governadora de Pernambuco, primeira mulher a presidir o PCdoB. O Partido se encontra na linha de frente da oposição ao governo da extrema-direita. Foi o pioneiro a propor a constituição de uma frente ampla, impulsionada pelas forças progressistas, que derrote Bolsonaro e vença as eleições, elegendo um governo de amplas forças capaz de superar a crise e reconstruir o país. O Partido apresentou diretrizes para uma Plataforma Emergencial de Reconstrução Nacional.
Não sem razão, a celebração de um século de existência elegeu como lema “Floresce a Esperança”. Nesses cem anos, o partido se reorganizou, enfrentou a cassação de seu registro e a clandestinidade. Viu seus membros serem perseguidos, torturados e mortos. Chorou seus líderes assassinados na Chacina da Lapa. Mas nunca abandonou a bandeira da esperança. Essa bandeira estava hasteada e tremulante na campanha “O Petróleo é nosso”, na defesa da anistia ampla geral e irrestrita, contra a carestia, no movimento pelas Diretas Já, pelos direitos sociais e civis, pela ciência, educação e arte, pela saúde e pela vida, pela terra e pelo teto, pelo emprego e renda, em todas as campanhas de Lula, na luta contra o golpe que condenou a primeira presidenta de nossa história sem provas, sem crimes.
Temos esperança em dias melhores. Num país desenvolvido e livre de desigualdades, da opressão de classe, gênero e raça. Essa semente germinou há 100 anos e, ao longo de nossa trajetória, foi constantemente regada e adubada. Em momentos de dificuldades ela floresce e entrega seus frutos. Não será diferente em 2022. Vivemos sob constantes ameaças. A democracia é alvo de ataques orquestrados que visam enfraquecê-la. O país enfrenta uma pandemia na base de fake news, sabotagem e campanhas de desinformação. Não nos furtaremos a enfrentar os retrocessos e aglutinar forças para superá-los. Com a coragem e a determinação de Helenira Rezende, Maurício Grabois, Carlos Marighella, Luís Carlos Prestes, João Amazonas, Haroldo Lima, Elza Monnerat, Sérgio Rubens e tantos outros camaradas que entregaram suas vidas ao bem comum. Essa é a marca do PCdoB.
Viva o centenário do PCdoB!
Viva a democracia!
Viva o povo brasileiro!
*Jandira Feghali é deputada federal (PCdoB-RJ) e vice-presidenta do PCdoB. Renato Rabelo é presidente da Fundação Maurício Grabois e ex-presidente do PCdoB
Artigo originalmente publicado no site da revistaCartaCapital
(PL)
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