O dia 2 de outubro de 2012 assinala a passagem dos cem anos de nascimento de Maurício Grabois, um dos principais pilares da história do Partido Comunista do Brasil. Nascido na cidade paulista de Campinas e acidentalmente registrado pela segunda vez em Salvador (BA), ele era filho de judeus vindos da Ucrânia fugindo das perseguições antissemitas e dos castigos da guerra do Império Russo com o Japão.
Em 1930, Maurício Grabois desembarcou no Rio de Janeiro para fazer o “Curso Anexo” da Escola Militar do Realengo, onde ingressou em 1931. Mandado para o 1º Regimento de Infantaria em 1932, neste mesmo ano integrou-se à Federação da Juventude Comunista e logo assumiu a direção nacional de comunicação da organização. Por esta porta, Maurício Grabois entrou para o Partido Comunista do Brasil, à época com a sigla PCB.No levante da Aliança nacional Libertadora (ANL) de 1935, Maurício Grabois estava no olho do furacão. Em seguida, mergulhou fundo na clandestinidade para ajudar a manter o fio que sustentaria o mínimo de organização do Partido Comunista do Brasil — o jornal A Classe Operária. Mesmo nos tempos mais duros da repressão do Estado Novo, ele e mais alguns jovens intrépidos — entre eles, Amarílio Vasconcelos — mantiveram na ativa o órgão central do Partido.
Com a prisão de todo o Comitê Central, Maurício Grabois e Amarílio Vasconcelos começaram a articular a Comissão Nacional de Organização Provisória (CNOP), que seria integrada, mais tarde, por João Amazonas e Pedro Pomar, vindos do Pará; Diógenes Arruda Câmara, vindo da Bahia; e Luis Carlos Prestes, que estava na prisão. O objetivo era reorganizar o Partido Comunista do Brasil, meta alcançada com a realização da Conferência da Mantiqueira, em 1943.
A vitória da democracia na Segunda Guerra Mundial criou as condições para o fim da estrutura do Estado Novo. Maurício Grabois e seus camaradas organizaram um fantástico movimento de massas que conquistou a anistia aos presos políticos — entre eles, Prestes —, a convocação da Assembleia Nacional Constituinte e a realização de eleições em 2 de dezembro de 1945. Em 1º de fevereiro, ele e mais quatorze deputados, além do senador Luis Carlos Prestes, entraram no Palácio Tiradentes, no Distrito Federal — Rio de Janeiro, à época —, para tomar posse como constituintes eleitos. Quase oito meses depois, o país recebeu a Constituição que enterrou os entulhos do Estado Novo.
Imediatamente depois, Maurício Garbois assumiu a liderança da bancada comunista na Câmara dos Deputados, onde liderou uma batalha gigantesca contra o que ele chamava de “restos fascistas”.
Nesse período, escreveu intensamente para desmascarar as manobras anticomunistas. Além da Tribuna Popular, propôs o relançamento d’A Classe Operária, o que ocorreu em 9 de março de 1946.
Ao final da refrega iniciada logo nos primeiros dias de 1946, o Partido Comunista do Brasil perdeu seu registro legal no Tribunal Superior Eleitoral e todos os comunistas eleitos foram cassados. Em meados de 1955, Maurício Grabois chefiou o terceiro grupo, de 51 integrantes, que fez um curso de duração de mais de um ano em Moscou, ministrado pela Escola Superior do Comitê Central do Partido Comunista da União Soviética (PCUS).
Em 1960, no processo do V Congresso, ele iniciou a série de artigos de um grupo que recusou a revisão da linha revolucionária do Partido Comunista do Brasil, iniciada com a publicação da Declaração de Março, em 1958. Maurício Grabois foi o primeiro a escrever e deixou bem claro que havia no Partido “Duas Concepções, Duas Orientações Políticas” — título do seu artigo inicial.
Na “Tribuna de debates”, publicada no jornal Novos Rumos, cristalizaram-se duas posições antagônicas: de um lado ficaram, além de Maurício Grabois, entre outros, João Amazonas, Pedro Pomar, Carlos Nicolau Danielli e Ângelo Arroyo; de outro, estavam nomes como Luis Carlos Prestes, Mário Alves e Jacob Gorender. A polêmica evoluiu para a criação do Partido Comunista Brasileiro e a reorganização do Partido Comunista do Brasil — agora um PCB e outro PCdoB.
A chegada do golpe de Estado em 1964 fez com que o PCdoB optasse pelo caminho da luta armada. Maurício Grabois, João Amazonas, Ângelo Arroyo e Elza Monnerat foram para a selva do Araguaia, no Sul do estado do Pará, preparar a implantação de um núcleo do que seria a guerra popular. Além das tarefas práticas, Maurício Grabois e João Amazonas escreveram os estratégicos textos Atualidade do pensamento de Lênin e Cinquenta anos de Luta — o primeiro uma crítica à tese do “Pensamento de Mao Tse-tung” como “nova etapa do marxismo” e o segundo um retrospecto das atividades ininterruptas do Partido Comunista do Brasil.
Para João Amazonas, Maurício Grabois foi o grande amigo, o grande camarada. “O Maurício Grabois foi um dos maiores propagandistas que o Partido já teve, um homem de muitas ideias”, afirmou. Em sua sala, na velha sede nacional do PCdoB na Rua Major Diogo, em São Paulo, João Amazonas conservava um quadro com a foto de Maurício Grabois em posição mais destacada entre outras referências comunistas. Ele também lembrou da constituinte de 1946, “na qual Maurício Grabois teve uma presença de espírito muito grande”.
Nas entrevistas que fiz para o livro Maurício Grabois — uma vida de combates, a admiração por ele foi unânime. Segundo Renato Rabelo, atual presidente nacional do PCdoB, João Amazonas lembrava do Maurício Grabois em tudo. “Era, na opinião dele, talvez o maior dirigente que o Partido teve”, disse. “Eles deviam ter uma ligação de amizade muito forte”, afirmou.
Edíria Carneiro, a companheira de João Amazonas, ao buscar na memória lembranças de Maurício Grabois estampava no rosto um semblante de carinho e bom humor. “Ele era muito engraçado”, disse ela, com o pensamento longe. Armênio Guedes, que morou com ele nos tempos da revista Continental, lembrou: “Era de um temperamento afável no trato com as pessoas, um sujeito de muita compreensão com o lado humano do militante. O Grabois e o Amarílio eram educados, não eram mandonistas.”
Do mesmo modo, Jacob Gorender lembrou de Maurício Grabois com reverência. “Tenho dele as melhores recordações. Era afável, fácil de se conversar. Foi um grande camarada, isso é fora de dúvida”, disse. Na sala de sua residência repleta de livros, de pé na porta, com a entrevista já encerrada, Gorender disse: “Não esqueça de registrar minha grande admiração por Maurício Grabois. Foi uma pessoa distinta. Estivemos em campos diferentes, mas isso nada tem a ver com sua integridade, simpatia e camaradagem.”
Diógenes Arruda Câmara, em artigo publicado no jornal A Classe Operária de setembro/outubro de 1978, disse que “considerável foi sua atividade, tanto político-ideológica como prática, no trabalho de reorganização marxista-leninista do Partido de 1961 a 1962, contribuindo de forma destacada, juntamente com o camarada Amazonas, para o esclarecimento de importantes problemas da revolução brasileira e na elaboração do Programa do Partido, aprovado na Conferência Nacional Extraordinária de fevereiro de 1962”.
Sobre a atuação de Maurício Grabois na Guerrilha do Araguaia, Arruda afirmou: “Ali esteve desde os primeiros momentos, ali conviveu com as massas exploradas e oprimidas e sentiu sua grande revolta, ali atuou abnegadamente ombro a ombro com todos os camaradas, ali colaborou na elaboração de valiosos documentos políticos e militares, ali comandou as Forças Guerrilheiras do Araguaia, ali tombou como um bravo. Caiu com glória, caiu de arma na mão naquele campo de batalha da luta de classes, no Araguaia — ponto alto da referência da luta revolucionária e libertadora de nosso povo.”
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