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sábado, 8 de março de 2014
A Alemanha e a restauração dos oligarcas na Ucrânia - Coletivo Vila Vudu
http://www.german-foreign-policy.com/de/fulltext/58816 (alemão)
7/3/2014, Tlaxcala Rede Internacional de Tradutores (Trad. de Fausto Giudice, do alemão ao francês)
http://www.tlaxcala-int.org/article.asp?reference=11642
KIEV/BERLIN – O governo instalado em Kiev por um golpe de estado encorajado por Berlim amplia sua cooperação com os oligarcas ucranianos.
Dois deles foram nomeados governadores das grandes regiões de Donetsk e de Dnipropetrovsk, e um terceiro, até aqui tido como partidário do presidente deposto Viktor Yanoukovitch, manifesta-se agora como aliado do governo, contra as forças pró-Rússia.
O que se vê cada vez mais claramente é uma restauração dos centros de poder contra os quais foi dirigida a rebelião da praça Maidan, no início do movimento, antes de ser instrumentalizada pela Alemanha e outros estados ocidentais, com o objetivo de levar ao poder em Kiev um governo pró-ocidente – com vistas a integrar a Ucrânia aos seus próprios sistemas de aliança.
A luta pela influência em Kiev trava-se mais uma vez entre a Alemanha e a Rússia: no início da 1ª Guerra Mundial, Berlim começou a tentar arrancar a Ucrânia da esfera de influência russa, para enfraquecer o inimigo. Em 1918, Berlim conseguiu por alguns meses ter Kiev sob seu controle. Antes, o reino fizera campanha para libertar a Ucrânia do jugo opressivo do czar; mas os alemães rapidamente levaram ao poder em Kiev um representante dos grandes proprietários de terras ucranianos, o que levou partes da população a novas revoltas.
O governo putschista de Kiev apoiado por Berlim coopera cada vez mais abertamente com os oligarcas ucranianos detestados pela população. Já durante as manifestações populares na praça Maidan, os dirigentes de oposição foram empossados pelos milhardários.
Petro Porochenko, conhecido como “rei do chocolate”, porque é proprietário de uma rede de lojas que vale bilhões de dólares, declarou-se abertamente ao lado de Vitali Klitchko. Os órgãos da imprensa-empresa pertencentes ao oligarca Victor Pinchuk sempre informaram com simpatia, sobre as manifestações. Klitshko confirmou que mantinha contato também com outros oligarcas. [1]
Arseni Yatseniouk , atual primeiro-ministro, já pertencia, de fato, ao partido da oligarca Yulia Timochenko. Entrementes, o governo putschista também começou a empossar outros oligarcas em altos cargos do estado: Sergueï Taruta e Ihor Kolomoisky, por exemplo, apareceram com destaque.
A questão é que parte considerável da população falante de russo rejeita firmemente o governo putschista de Kiev; teme-se que, depois dos eventos na Crimeia, outras secessões virão, ou dificuldades duradouras, para os ucranianos falantes de russo.
A maior parte dos oligarcas são vistos como uma espécie de garantia contra esses perigos, porque eles têm massivo interesse em manter o estado ucraniano: não querem que o país seja integrado mais estreitamente à Rússia, porque temem ser engolidos pelos oligarcas russos, mais poderosos.
É o que explica que o magnata do aço, Taruta, tenha sido nomeado governador da região de Donetsk, onde Kiev enfrenta a reivindicação de secessão, pela população falante de russo, majoritária, que deseja separar-se da Ucrânia.
Logo depois de nomeado, Taruta falou aos habitantes de Donetsk: “Caros compatriotas. Dirijo-me a vocês, como presidente da Associação Industrial da Bacia [rio] Donetz e como cidadão falante de russo, com sangue ucraniano [sic]. Convoco todos aqueles para quem a Ucrânia e seu futuro são importantes, a unir esforços para preservar a integridade territorial de nosso país” [2].
Declaração semelhante fez Rinat Akhmetov, aliado de longa data de Viktor Yanoukovitch , mas que também teme influência mais forte da Rússia. O fato de que a União Europeia não impôs qualquer sanção contra ele, faz sentido: como defensor do estado ucraniano, Akhmetov tem vantagens notáveis, aos olhos do ocidente.
Deve-se dar atenção especial também à nomeação de Ihor Kolomoisky como governador de Dnipropetrovsk. Os motivos da nomeação são os mesmos que levaram à nomeação de Taruta: os interesses comerciais de Kolomoisky excluem qualquer aproximação entre Ucrânia e Rússia e qualquer aproximação com a esfera de influência direta de oligarcas russos, seus concorrentes.
Além disso, Kolomoisky, uma das maiores fortunas da Ucrânia, desentendeu-se com seu ex-amigo Yanoukovitch e mudou-se para a Suíça, onde é sensível à pressão ocidental. Sua popularidade na Ucrânia não aumentou pelo fato de ele, cujo banco controla quase 1/5 de todas as transações do país, ter assumido, por meios duvidosos, o controle da maior refinaria da Ucrânia nos anos 2008-2010 – quando, em Kiev, reinava a “coalizão laranja”, pró-ocidente. Depois da vitória eleitoral de Viktor Yanoukovitch em 2010, Kolomoisky, mesmo assim, conseguiu estabelecer boas relações com o novo governo.
Sua nomeação, agora, como governador de Dnipropetrovsk, é uma nova etapa na direção da restauração dos círculos de poder contra os quais se fez a rebelião da praça Maidan, antes de que Berlim a capturasse para sua própria luta contra a influência de Moscou.
Laranja russa
Mais uma vez, a luta por maior influência em Kiev, trava-se entre Alemanha e Rússia: Berlim engajou-se na luta aberta pela primeira vez, há 100 anos, no início da 1ª Guerra Mundial.
O objetivo, então, do plano alemão, era enfraquecer o adversário russo, atiçando questões internas, até a secessão de algumas áreas. Uma das figuras mais influentes na política da Alemanha para a Ucrânia, o jornalista Paul Rohrbach, depois funcionário do ministérios de Negócios Exteriores, muitas vezes recorreu a uma imagem depreciativa, comparando a Rússia a uma laranja: “Como a laranja é composta de gomos destacáveis, assim também o Império russo e seus diferentes territórios, as províncias do Báltico, a Ucrânia, a Polônia, etc.”
Rohrbach estava convencido de que bastaria “destacar essas partes do território (...) umas das outras e dar-lhes certo grau de autonomia”, para “pôr fim ao Império russo”[3]. Essas suas ideias foram muitas vezes designadas como “teoria da decomposição”.
A arma da insurreição
O plano formulado concisamente por Rohrbach entrou na fase operacional nas primeiras semanas da 1ª Guerra Mundial. Em documento datado de 11/8/1914, o chanceler Theobald von Bethmann-Hollweg declarava o desejo de recorrer, como “arma contra a Rússia”, à insurreição (Insurgierung), dentre outras “partes”, da Ucrânia. Pouco mais tarde, o ministro de Negócios Estrangeiros do Império dos Habsburgos confirmava que “nosso principal objetivo, como o da Alemanha, é o maior enfraquecimento possível da Rússia. Esperamos portanto obter a libertação da Ucrânia e dos demais povos que a Rússia oprime nas nossas fronteiras” [4].
O projeto de dividir a Rússia oferecia, principalmente, oportunidades políticas internas. De um lado, permitia alimentar ressentimentos tradicionais anti-Rússia, no seio da população alemã; de outro lado, permitira rotular a agressão militar como luta contra o despotismo do império czarista e, assim, ganhar, para os combates, os círculos que mais resistiam contra a aventura militar”.
“O efeito anti-czar da social-democracia” foi “elemento essencial para facilitar a tomada de posição a favor da guerra” – constatava em 1961 o historiador Fritz Fischer, em seu estudo pioneiro Griff nach der Weltmacht [Aposta na potência mundial] [5].
Libertados e controlados
Nas memórias e manifestos, selecionaram-se algumas formulações adequadas, para falar sobre os objetivos alemães naquela guerra. Assim, por exemplo, Matthias Erzberger, do Partido do Centro, falava, em setembro de 1914, a favor de combater para a “libertação” dos povos não russos, submetidos ao jugo moscovita” e pela criação de uma “autonomia” “no interior de cada vila”. Mas não esquecia de destacar que “tudo isso” tinha de ser feito “sob a supremacia militar da Alemanha”.
Erzberger não escondia que a “libertação” e a “autonomia” sob controle armado alemão não visavam apenas a penetrar economicamente na Ucrânia; também serviam a um objetivo geoestratégico claramente definido: tratava-se, escreveu ele, “de separar a Rússia, ao mesmo tempo, do Mar Báltico e do Mar Negro” [6].
A valsa das marionetes
No início de 1918, Berlim conseguiu pela primeira vez alcançar seu objetivo estratégico. Dia 9/2/1918, o Reich [império] alemão assina acordo com o Parlamento central [Rada] ucraniano, que acabava de proclamar a soberania da Ucrânia e rapidamente pedira ajuda a Berlim, contra a Rússia. O Império alemão então assumiu o controle de facto em Kiev: mas se “manteria a ficção” de que o Parlamento continuava a governar, como anunciou o general Wilhelm Groener, verdadeiro detentor do poder na Ucrânia de fins de março a fins de outubro de 1918 [7].
Mas, no instante em que perceberam que o Parlamente central ucraniano – dominado por liberais e sociais-democratas – não tinha condições para pôr em prática os planos de Berlim para a Ucrânia, os alemães instalaram no poder, pela força, um grande proprietário de terras, muito impopular entre a população camponesa empobrecida, Pavlo Skoropadsky, representante dos meios mais ricos. Houve revoltas imediatas, como antes já houvera, contra o regime czarista. Berlim reprimiu todas, com extrema brutalidade.
Quer dizer: antes, os alemães já demonstraram amplamente sua total indiferença às condições internas da Ucrânia, como se diz, “a ser libertada”; antes de perderem a 1ª Guerra Mundial e, com ela, o controle sobre Kiev.
Notas
[1] Cf. Oligarchen-Schach.
[2] Kiew ruft die Oligarchen. www.n-tv.de 05.03.2014.
[3] Walter Mogk: Paul Rohrbach und das "Größere Deutschland". Ethischer Imperialismus im Wilhelminischen Zeitalter. München 1972.
[4] Apud Fritz Fischer: Griff nach der Weltmacht. Die Kriegszielpolitik des kaiserlichen Deutschland 1914/18. Düsseldorf 1961.
[5] Fritz Fischer: Griff nach der Weltmacht. Die Kriegszielpolitik des kaiserlichen Deutschland 1914/18. Düsseldorf 1961.
[6] Apud Fritz Fischer: Griff nach der Weltmacht. Die Kriegszielpolitik des kaiserlichen Deutschland 1914/18. Düsseldorf 1961.
[7] Winfried Baumgart: General Groener und die deutsche Besatzungspolitik in der Ucrânia 1918. In: Geschichte 6/1970, S. 325-340.
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