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segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Ratzinger e o legado conservador que barrou o Concílio Vaticano II - Paulo Vinícius Silva

Inicia-se a santificação em vida de Joseph Ratzinger e seu gesto de abandonar o papado nos seus provectos 85 anos. Incensado será ao cúmulo por parte da imprensa bandida e de direita.

Para além do que ensaia a imprensa, de equiparar o conclave a uma eleição. Empresta a Estados teologicamente fundamentados- como Israel e o Vaticano - uma legitimidade que não concede jamais a quem não componha o bloco conservador que representa. A notícia ocorrer em pleno carnaval empresta-lhe certo quê de momice, quando vemos desfilar na sapucaí das telas a folia docemente pagã e o olhar contrito, religioso, de uma imprensa venal que troca de fantasia de um quadro a outro, com a mesma versatilidade com que usa conceitos como eleição e papado. Ademais depois do percurso de Ratzinger, feito para concentrar imensamente o poder na Igreja em torno do papa. Então, é preciso entender, para além da ficção do gesto "corajoso" e "desprendido", o que ocorre na Igreja e que legado deixará Bento XVI.

Por isso mesmo, longe de mim cair na análise tosca pura e simplesmente movida por qualquer antipatia ao papa, ou faltar com o respeito devido aos católicos e católicas em sua fé. Há que avaliá-lo como o brilhante político conservador, um dos, senão o maior inimigo da contribuição que João XXIII trouxe à humanidade, a proposta generosa de reforma do catolicismo que visava a abri-lo aos pobres, ao terceiro mundo, ao laicato, o Concílio Vaticano II, que malogrou exatamente graças à reversão laboriosa e persistentemente promovida por figuras como o atual papa, que a isso dedicou nada menos que os últimos 45 anos.

Duvi-de-o-dó que sua saída tenha qualquer razão pastoral desvinculada desse objetivo entranhado que só pôde realizar graças às alianças e à grande perseguição contra todos aqueles ideais de abertura e renovação que embalaram o surgimento da Teologia da Libertação.

A despeito do escândalo de ter sido da juventude hitlerista é, para mim, muito menos grave que tudo que se seguiu. Há que se reconhecer-lhe o legado de ser o extremo oposto de todos a que considero admiráveis no catolicismo, como Dom Hélder Câmara e Dom Pedro Casaldáliga; de lhes ter combatido de todas as formas, numa cruzada quase totalmente exitosa para destruir a Teologia da Libertação. Há que valorar o despudor com que trouxe de volta à Igreja o culto Tridentino - a missa em latim - e, com ela aqueles que acusaram João XXIII de ser nada menos que o anticristo, os seguidores de Dom Marcel Lefebvre e suas sólidas ligações com a direita mais obscura.

Mais que isso, o freio à renovação litúrgica no que ela poderia incorporar das tradições nacionais. Mas não todas, posto que até uma contribuição pentecostal foi aceita, vinda dos EUA, mas com a sólida ressalva de seu caráter conservador para além de qualquer forma.

Nesse zelo seletivo o pontífice não economizou. Uma longa trajetória de expurgo da estrutura eclesiástica de todos aqueles que não defendiam a sua contrarreforma e de promoção das forças obscurantistas que conformaram uma sólida maioria, revertendo as possibilidades de maior participação e colegialidade no interior da Igreja. Ou seja, a reversão de um Concílio - e nunca mais houve outro. E, em seu lugar, o reforço da autoridade máxima do papado, fazendo retroceder qualquer esperança de colegialidade renovadora. Sua idade avançada foi de inteira dedicação à recomposição a dedo e por décadas do cardinalato e do colégio de bispos - no que a longa duração e o conservadorismo de João Paulo II em muito contribuiu.

Em vez do ecumenismo que, no Concílio Vaticano II, predicava serem variados os caminhos à salvação, sob o exemplo do Cristo, mesmo que se o não conhecesse, a reafirmação da Igreja como "o" caminho. O aferrar-se ao celibato e à negação da sexualidade, da diversidade e até da anticoncepção protetora, mesmo ao custo do ignorar a situação epidêmica da AIDS em grandes regiões, em especial as da África.

E o ocultamento - para o que concorreu por décadas - das sevícias que envergonharam fiéis enganados, padres e religiosos vocacionados, e que destruíram inúmeras vidas e famílias sob a complacência criminosa dos Pilatos contemporâneos, que lavaram as mãos como o romano. E já disse Jesus que quem mal fizesse aos pequeninos, a ele fazia.

Mas não há o que conceder ao sumo pontífice? Sim, claro. Seu conservadorismo ilustrado e a determinação férrea de reunir as forças que varreram para as catacumbas os intensos e renovadores ventos que sopravam do Concílio Vaticano II, e a habilidade com que se afasta, em plena potência de sua autoridade, para definir com plena influência o seu sucessor, marcando indelevelmente a face da Igreja por mais de 50 anos, dentro e fora do papado. Ratzinger não é ingênuo. Habilíssimo, assegurará no Conclave o seu legado antirreformista, conservador e de direita, infelizmente.

Mas nem só de Ratzinger vive a Igreja Católica, pois todo credo contém as forças do povo e as da reação. E há muitos que lutam sinceramente sob a cruz. Por isso, sem conceder a quem não merece, é preciso ser-lhes solidário. E lançar a vista sobre o corajoso relato que nos traz o teólogo Hans Küng - perseguido por aquele que fora seu colega no Concílio Vaticano II - e que bem aquilata o real significado de Ratzinger, sob uma mirada católica profunda e crítica:

Coletivizando: Quem é Bento XVI - Epístola da Desobediência - Hans Küng

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