“Uma coalizão anti dólar será o primeiro passo para criar-se uma coalizão antiguerra capaz de deter a agressão norte-americana.”
Já faz algum tempo que tanto a Ucrânia como a resposta russa às sanções (que puseram em movimento o grande eixo eurasiano, aproximando China e Rússia e acelerando o negócio “Santo Graal” de gás entre os dois países) deixaram as manchetes. Mas ainda não se entendeu por que a imprensa-empresa ucraniana largou a cobertura da Ucrânia como se fosse batata quente, sobretudo porque a guerra civil prossegue no Donbass ucraniano e continua a fazer dúzias de mortos dos dois lados.
O mais provável é que o público tenha-se cansado de ouvir metáforas sobre jogos de xadrez ou de damas entre Putin e Obama, e tenha sido despachado para ler a propaganda que cerca as metáforas ‘analíticas’ e os eventos mortais da 3ª guerra do Iraque, como há tantas décadas.
Mas é provável que ‘sair do foco’ seja exatamente o que mais deseja a elite política russa. De fato – como noticia Valentin Mândrăşescu, editor de Voice of Russia –, enquanto a grande máquina norte-americana de distrair a atenção popular foca-se em outros temas, a Rússia já se prepara para os passos seguintes.
Assim se chega a um conselheiro de Putin, Sergey Glazyev – o homem que, no início de março, foi o primeiro a sugerir que a Rússia se livrasse dos títulos dos EUA e abandonasse o sistema do dólar, como retaliação contra as sanções – estratégia que funcionou naquele momento, porque, apesar de o Kremlin ter conservado integralmente o controle sobre a Crimeia, as sanções ocidentais pararam como por passe de mágica. (E não só isso como, também, como acaba de informar o banco central da Rússia, o superávit do país em conta corrente de 2014 pode alcançar $35 bilhões, bem superior aos $33 bilhões de 2013, e distantíssimo dos inventados “mais de $200 bilhões” de capitais que fugiriam da Rússia e sobre os quais muito falava recentemente Mario Draghi).
Glazyev foi também quem empurrou o Kremlin a aproximar-se da China e forçou que os russos assinassem o acordo de gás com Pequim (mesmo que não tenha sido assinado nos termos que mais interessariam à Rússia naquele momento).
É esse o Glazyev que publicou artigo na revista russa Argumenty Nedeli,[1] no qual delineou um plano para “minar a força econômica dos EUA” e, assim, forçar os EUA a pôr fim à guerra civil na Ucrânia. Glazyev entende que o único meio para impedir que os EUA iniciem uma nova guerra fria é pôr abaixo o sistema do dólar.
Como Voice of Russia resume o artigo publicado em Argumenty Nedeli,[2] o conselheiro econômico de Putin e homem que concebeu a União Econômica Eurasiana argumenta que Washington está tentando provocar uma intervenção militar da Rússia na Ucrânia, usando a Junta de Kiev como isca. Se desse certo, o plano daria a Washington várias importantes vantagens.
Primeiro, permitiria que os EUA introduzissem novas sanções contra a Rússia, riscando as posições russas em papéis do Tesouro dos EUA. Mais importante: uma nova onda de sanções criará uma situação na qual empresas russas não terão como honrar os juros de suas dívidas com bancos europeus.
Nas palavras de Glazyev, a chamada “terceira fase” de sanções contra a Rússia terá custo tremendo para a União Europeia. O total da perda estimada será superior a 1 trilhão de euros. Essas perdas ferirão gravemente a economia europeia, convertendo os EUA em único “paraíso seguro” do planeta. Sanções fortes contra a Rússia também deslocarão dos mercados europeus de energia a empresa russa Gazprom, o que deixará aqueles mercados abertos à entrada do gás natural liquefeito – muito mais caro – que os EUA têm para vender.
Co-optar os países europeus para uma nova corrida armamentista e de operação militar contra a Rússia fará aumentar também a influência política dos EUA na Europa, e ajudará os EUA a forçar a União Europeia a engolir a versão norte-americana do Tratado TTIP [Transatlantic Trade and Investment Partnership] – acordo comercial que, basicamente, converterá a União Europeia em grande colônia econômica dos EUA.
Glazyev entende que iniciar uma nova guerra na Europa trará só benefícios para os EUA e só problemas para a União Europeia. Em inúmeras vezes, Washington já usou guerras globais e regionais como ferramentas para favorecer a economia norte-americana; agora, a Casa Branca tenta usar a guerra civil na Ucrânia como pretexto para repetir o velho truque.
Glazyev: “Só nos resta atacar a máquina de imprimir dinheiro do FED”
O conjunto de contramedidas que Glazyev propõe toma por alvo, especificamente, o coração que bombeia ‘energia’ para a máquina de guerra dos EUA: as impressoras que imprimem dinheiro no FED.
O conselheiro de Putin propõe que se crie uma “ampla aliança antidólar” de países que desejem e possam extrair o dólar de seu comércio internacional. Membros da aliança também têm de abandonar instrumentos de reservas denominados em dólares.
Glazyev aconselha tratar os instrumentos denominados em dólares como papeis-lixo[3] e que os reguladores devem exigir colateralização total desses papeis. Uma coalizão antidólar será o primeiro passo para a criação de uma coalizão antiguerra capaz de deter a agressão norte-americana.
Não surpreendentemente, Sergey Glazyev entende que o papel principal para que se crie essa coalizão política deve caber à comunidade empresarial e de negócios da Europa, porque as tentativas dos EUA para iniciar grande guerra na Europa e guerra fria contra a Rússia ameaçam, em primeiro lugar, o big business europeu.
A julgar pelos recentes esforços para deter as sanções contra a Rússia empreendidos por líderes empresariais alemães, franceses, italianos e austríacos, o conselheiro de Putin está correto em sua avaliação. Washington não parece ter previsto que a guerra pela Ucrânia pode, em pouco tempo, converter-se em guerra pela independência da Europa – que pode interessar-se por livrar-se do do mínimo pelos EUA – e guerra contra o dólar.
[1] http://argumenti.ru/toptheme/n441/344574?fb_action_ids=767921596586455&fb_action_types=og.recommends
[2] http://voiceofrussia.com/2014_06_18/Putins-aide-proposes-anti-dollar-alliance-to-force-US-to-end-Ukraines-civil-war-8030/
[3] Orig. Junk Bond – Expressão coloquial que designa papeis de alto risco ou não recomendados para investimento. São instrumentos de renda fixa que recebem grau “BB” ou inferior da agência de avaliação de risco Standard & Poor's, ou “Ba”, da Moody's. Junk bonds são chamados assim por causa do mais alto grau de risco de não serem pagos em relação aos papeis com boa avaliação para investimento [de http://www.investopedia.com/terms/j/junkbond.asp].
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