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sábado, 16 de maio de 2020
NAKBA: a pandemia sionista que dura 72 anos na Palestina - Por Sayid Ahmed (Marcos Tenório)
Por Sayid Marcos Tenório
O mundo está passando por um momento crucial de enfrentamento da pandemia da Covid-19, que afeta indistintamente todos os países do planeta, provocando milhares de mortes todos os dias. Neste 15 de maio queremos nos referir a uma pandemia sionista que afeta a Nação e o povo palestino há 72 anos, desde que a Organização das Nações Unidas decidiu adotar um Plano de Partilha em 1947, que dividiu a Palestina em dois Estados, dando origem ao vírus Covid-1948, também conhecido como o estado judeu de Israel.
Após a partilha ilegal e injusta ser aprovada pela ONU, o estado judeu ficou com aproximadamente 55% das melhores terras da Palestina, embora os sionistas possuíssem apenas 7% da terra privada na Palestina. E mais: os judeus azkenazes representassem apenas cerca de 33% da população, sendo uma grande porcentagem deles imigrante transferidos em levas da Europa. Com a fundação do Estado de Israel, em 14 de maio de 1948, o povo palestino foi atingido pela Nakba, palavra árabe que significa catástrofe, através da destruição de mais de 400 aldeias e a expulsão deliberada de cerca de 800 mil palestinos – mais do que toda população judaica existente naquela época – que perderam suas casas e seus bens e tornaram-se refugiados dentro do seu próprio território e nos países vizinhos, que hoje somam uma população de cerca de cinco milhões de pessoas.
Os vilarejos palestinos foram ocupados, destruídos e saqueados e seus moradores expulsos ou mortos antes que um único soldado das forças regulares dos países árabes entrasse na Palestina em socorro do seu povo, o que põe por terra a falácia israelense de que os palestinos “fugiram” assim que a invasão dos árabes começou. Quando, finalmente, os países árabes decidiram enviar suas tropas, os vilarejos já haviam sido destruídos e seus moradores expulsos ou mortos.
Diante daquele episódio catastrófico, a maioria dos governantes árabes postergaram tanto quanto puderam a inevitável intervenção militar sionista, e então preferiram encerrá-la prematuramente: eles sabiam que não apenas os palestinos já estavam derrotados, mas também que seus exércitos não teriam chance diante das forças judaicas, muito bem armadas depois de um acordo realizado entre o representante sionista em Nova Iorque, Moshe Sherlak, e o chanceler soviético Andrei Gromyko, que permitiu o envio de moderno armamento, que foi entregue às milícias sionistas pela Checoslováquia, que estava sob ocupação do exército soviético.
Quando, enfim, os países da Liga Árabe resolveram enviar suas tropas em socorro dos palestinos, no final de abril de 1948, mais de 250 mil palestinos já haviam sido expulsos, mais de 200 vilarejos destruídos e inúmeras cidades esvaziadas. Todos os países receberam o pedido do Conselho da Liga Árabe para enviar armas e voluntários, mas nem todos atenderam ao pedido. A inanição dos governos árabes mereceu o protesto de milhares de jovens, em vários dos países da região que se dispuseram a sacrificar suas vidas nos combates pelos palestinos. A luta anticolonial na Palestina, valente e feroz, fez incendiar o fervor nacionalista da juventude árabe por todo o Oriente Médio. No entanto, tudo o que as forças estrangeiras e locais tentaram, mas não conseguiram, foi proteger a população local palestina contra a agressão sionista.
Mesmo com o elevado número de palestinos expulsos e mortos, cerca de 100 mil conseguiram permanecer no território ao longo da guerra de 1948 e cerca de 40 mil voltaram para suas terras e casas durante a implementação do acordo de paz. Porém, da noite para o dia, aqueles palestinos se tornaram minoria em seu próprio país, recebendo a cidadania israelense conforme definido na partilha das Nações Unidas, e condenados a viver sob um regime militar até o final de 1966.
Os palestinos que conseguiram permanecer nos seus territórios foram isolados em uma zona de assentamento da qual só era permitido que saíssem após receber autorização dos militares. Seus movimentos foram restringidos, e as chances de encontrar emprego longe de casa tornaram-se ínfimas. Esse estado de coisas, somado à legislação israelense, que proíbe especificamente casamentos civis entre pessoas classificadas como judias e não judias, permitiu ao Estado sionista sua bem-sucedida implantação da política de colonização ‘étnica’ pura.
Os líderes sionistas que ocuparam postos de destaque no poder israelense sempre trataram os donos da terra com arrogância e desprezo. A ucraniana Golda Mabovitch Meir, que migrou para a Palestina na onda sionista de ocupação na década de 1920, e que mais tarde se tornaria primeira-ministra de Israel, disse, em 1969, que não existiam palestinos; Yitzhak Rabin, o quinto primeiro-ministro de Israel, no cargo entre 1974 e 1977, sempre se referia a eles como os “chamados palestinos”; e o imigrante da Bielorrússia, Menachem Begin, que foi primeiro-ministro entre 1977 e 1983, referia-se aos palestinos como os “negros” de Israel.
Inúmeros episódios abomináveis da limpeza étnica levada a cabo pelo Estado judaico ocorreram por meio de atos terroristas das milícias sionistas que tomaram a forma de massacres, como o de Deir Yassin, ocorrido na manhã de 9 de abril de 1948. Deir Yassin era um vilarejo nas cercanias de Jerusalém habitado por cerca de 700 pessoas. Os moradores haviam conseguido um pacto de não agressão com a Haganah , a principal milícia clandestina sionista na Palestina, que tinha como objetivo garantir e expandir as fronteiras de Israel e forçar a total e sistemática expulsão dos palestinos, por meio da limpeza étnica, destruição das aldeias, cidades e urbanizações, a fim de alcançar uma maioria judaica no novo Estado de Israel, com o máximo da terra palestina e o mínimo possível de palestinos vivendo nela.
Centenas de corpos de palestinos mortos pelas milícias sionistas foram estendidos pelo chão, como resultado do covarde massacre de Deir Yassin, praticado pelos terroristas israelenses entre 9 e 11 de abril de 1948.
O massacre de Deir Yassin teve um elevado número de vítimas, numa ação que a direção judaica orgulhosamente anunciou como o epicentro da catástrofe e serviria como aviso para todos os palestinos de que se se recusassem a abandonar seus lares e fugir, teriam destino semelhante. A carnificina foi friamente perpetrada por uma milícia de 120 judeus sionistas e custou a vida de 254 árabes, entre anciões, e crianças degoladas (30 bebês estavam entre os chacinados), mulheres grávidas estripadas por armas branca, com vários casos documentados de estupro, mutilação e humilhação, em que as vítimas eram, principalmente, mulheres palestinas cujos corpos depois foram queimados e jogados num poço.
Quando essa etapa da Nakba foi concluída pelas forças sionistas, o novo estado de Israel compreendia 78% da Palestina histórica, restando apenas a Cisjordânia, incluindo Jerusalém Oriental e a Faixa de Gaza, que estavam sob o controle da Jordânia e do Egito, respectivamente. Na guerra de 1967, Israel ocupou os 22% restantes e a colonização começou logo em seguida e não parou mais.
A pandemia da Nakba não terminou em 1948 e nem com o massacre perpetrado durante a chamada Guerra dos Seis Dias, a agressão terrorista das forças israelenses ocorrida entre 5 e 10 de junho de 1967, que ocupou a Faixa de Gaza, o Sinal (Egito) e as Colinas de Golã (Síria). Mas continua até hoje, com os sionistas se apressando em executar o processo de judaização completa da Palestina. Esse processo se dá em todos os campos, como o militar, administrativo, legislativo (como a Lei do Estado-Nação aprovada pelo Knesset em 2018), demográfico, religioso, histórico e cultural. O objetivo final é a completa desenraização e destruição da Palestina, que adquire novos contornos com o anúncio por parte do presidente Donald Trump de um unilateral “Acordo do Século”, que beneficia exclusivamente os sionistas, visando reconhecer o Estado de Israel no território da Palestina histórica, sem fronteiras definidas e em permanente expansão, tornando o que sobrar da Palestina em pequenas ilhas de terra como se fosse um mini Estado, pulverizado, cercado e sufocado pelo ocupante por todos os lados.
A pandemia da #Covid1948 continua na forma do roubo contínuo de terras palestinas para a criação de assentamentos e comunidades judaicas nos territórios ocupados. Também não cessou a destruição de casas e terras agrícolas palestinas, a revogação do direito de residência, deportações, brutais ataques militares periódicos, causando baixas civis em massa, como a que ocorreu em Gaza no verão de 2014, quando Israel assassinou 1.890 palestinos, sendo 550 crianças e 87 homens e mulheres com idades acima de 60 anos e deixando cerca de 100 mil residentes desabrigados, segundo o relatório “Vidas Fragmentadas” do Gabinete para a Coordenação dos Assuntos Humanitários das Nações Unidas (OCHA, da sigla em inglês).
O povo palestino tem o direito legítimo de existir e de resistir à pandemia da ocupação sionista, ao apartheid e à limpeza ética, com todas as medidas e métodos. É um ato de autodefesa e uma expressão do direito natural de todos os povos à autodeterminação. A libertação da Palestina é o tema que tem a maior dimensão internacional, humanitária e civilizacional em nossos dias. É uma necessidade da afirmação e do cumprimento do Direito Internacional, da verdade e justiça.
O respeito à justiça exige que se cumpra com o direito ao Estado palestino totalmente soberano e independente, com Jerusalém sua capital eterna e ecumênica. Os palestinos lutam para que seus direitos sejam assegurados em concordância com a democracia, com o Direito Internacional e a justiça. Que seja respeitado o direito de regresso dos refugiados, a compensação e a permanência de todos na terra palestina, pondo fim à pandemia da #Covid1948 e a doença do sionismo que ceifou a vida, as terras, as casas e os sonhos de milhões de homens e mulheres na Palestina.
Sayid Marcos Tenório é historiador e Secretário-Geral do Instituto Brasil-Palestina (IBRASPAL). É autor do livro Palestina: do mito da terra prometida à terra da resistência.
1 Askenaze ou asquenazim são os judeus provenientes da Europa Central e Europa Oriental. O termo provém do termo do hebraico medieval para a Alemanha, chamado Ashkenaz.
2 O Haganah foi uma organização paramilitar judaica de caráter sionista, atuante no território do que era então o Mandato Britânico da Palestina, entre 1920 e 1948. Lutou contra a população de etnia árabe. Viria a se constituir na base do exército israelense, as Forças de Defesa de Israel - IDF, da sigla em inglês.
3 Ocha: “2014 foi arrasador para palestinos nos territórios ocupados” - Disponível em https://news.un.org/pt/story/2015/03/1506391-ocha-2014-foi-arrasador-para-palestinos-nos-territorios-ocupados.
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