"Segundo dados do IBGE e projeções do IPEA, temos hoje a maior população jovem da nossa história em termos absolutos. Algo em torno de 50 milhões de brasileiros(as) entre 15 e 29 anos. Por outro lado, temos, neste momento histórico, um número proporcionalmente reduzido de crianças e idosos, em relação à população em idade ativa, o que proporciona uma baixa taxa de dependência econômica. Os especialistas chamam esta situação especial de bônus demográfico. Ou seja, os próximos 20 anos serão cruciais, se quisermos aproveitar este bônus demográfico e explorar cada vez mais o nosso potencial de crescimento. Por isso, cada ação voltada para a formação educacional e científica, de inclusão econômica e cidadã da juventude, hoje, não está simplesmente relacionada aos direitos individuais de uma parcela da população. Tal investimento está umbilicalmente ligado ao desenvolvimento do país”.(1) Danilo Moreira (2011)
Eu estive ontem na manifestação de Brasília em apoio ao projeto da Dep. Érika Hilton (PSOL), com vários sindicalistas e militantes de esquerda, além da deputada Érka Kokai (PT -DF) e do deputado distrital, Gabriel Magno (PT). Foi uma boa manifestação, majoritariamente estudantil e juvenil, o que me traz lembranças muito fortes, pois eu me formei na luta da juventude e tenho "serviços à prestados causa", digamos assim. Então, eu já participei de vários cumes e vales do movimento social e da conjuntura no Brasil nas últimas três décadas. Comecei no Fora Collor, com 15 anos, já organizado na UJS e no PCdoB, no Distrital da Barra. Lutei contra FHC e a imposição das bases neoliberais que vigem - e se aprofundam até os dias de hoje. Do ponto de vista da forma, a manifestação seguiu o mesmo formato das que fazemos, com os mesmos erros. O fato inovador é a juventude ter vindo. Naquele espaço, para mim ficou evidente a força desaproveitada da juventude trabalhadora e do próprio movimento estudantil. Isso exige lançar pontes para o diálogo e a ação conjunta para a juventude e a classe trabalhadora.
Não existe essa de "criador" do movimento. Não existe tampouco isso, de movimento "espontâneo" em tempos de guerra híbrida, redes sociais e ascensão do fascismo. Nós perdemos o direito a esse tipo de inocência. Saúdo com alegria o ingresso da nova geração na luta da classe trabalhadora pela redução da jornada de trabalho, pois é uma luta de gerações. bicentenária, com história, com milhares de mártires e que jamais foi secundada pela luta dos trabalhadores. Nessa batalha, eu entrei na última década do milênio passado, na luta pelo projeto das 40 Horas semanais, do Deputado Inácio Arruda e do Senador Paulo Paim.
Quero reconhecer a legitimidade da juventude se preocupar, assumir e liderar o tema. O projeto do Capital é aprovar o trabalho por hora e sem limites; é destruir as organizações dos trabalhadores e seus direitos. Então, ou a juventude assume, lidera e renova o movimento sindical, ou seremos derrotados. A classe trabalhadora reúne em si mesma a marca da universalidade e da representatividade, sendo ela mesma diversa, e vida é trabalho. O debate atual em torno da Redução da Jornada pela proposta do fim da Escala 6X1 tem, no entanto, um defeito de fábrica. Junto com a viralização, vem um outro vírus: "um movimento de trabalhadores sem a organização dos trabalhadores", o que é simplesmente impossível. Por isso, o fato de a Deputada e o conjunto da esquerda e do movimento sindical assumirem a bandeira é um acerto. Mas, sem ilusões com esse Congresso. "Laranja madura, na beira da estrada... Tá bichada, Zé. Ou tem maribondo no pé." (Ataulfo Alves)
Eu trabalho muito a internet e as redes sociais, vocês sabem. Quisera eu que os conteúdos progressistas tivessem livre passagem pela muralha dos algoritmos e do big data. A referência "viralizou nas redes sociais" não é para mim um argumento legítimo para a adesão acrítica ao que quer que seja. O fato é que não somente a esquerda sente as dores do nosso povo. A direita tem, através do big data, o mapa das nossas almas. Tem também os ambientes moldados para que exerçamos a nossa "liberdade". Por que os conteúdos fascistas mais viralizam nas redes e não os conteúdos progressistas, a exemplo da própria luta histórica pela redução da jornada de trabalho?
Ué, não pode não?! Não. Não existe nenhum direito da classe trabalhadora que foi conquistado sem a organização da classe trabalhadora. Mais que isso. Para a conquista de qualquer desses direitos, foi necessário ganhar os trabalhadores, ganhar a sociedade, fazer alianças políticas e aprovar o texto, e depois aplicar e disputar a aplicação da lei. Todas. Ou seja, é preciso que a classe trabalhadora se organize e faça política, fale à sociedade e ganhe a batalha política.
Mas acontece também o inverso. Um movimento pode favorecer um ataque do inimigo de classes, em especial se não valoriza a unidade e não tem expressão política clara.
Então, a primeira coisa é observar a distância do movimento sindical e mesmo estudantil da juventude trabalhadora. A expressão juvenil desse movimento repousa por uma realidade objetiva e é um fato extremamente positivo, que é o debate da redução da jornada de trabalho, a unidade da juventude e da classe trabalhadora, dos estudantes e trabalhadores. Por isso, é um defeito de fábrica, por um lado, essa posição que visa a separar a luta pela redução da jornada do movimento que criou essa luta e que conseguiu todas as conquistas no decurso do tempo.
Vargas não teria feito a CLT, se não tivesse sintetizado a luta mais avançada so movimento sindical, absorvendo na legislação brasileira a compilação de inúmeras lutas isoladas, de categorias, de partidos, inclusive abrangendo o movimento sindical classista, anarquista,socialdemocrata amarelo, católico, recebendo contribuições e fazendo a coluna do ciclo civilizatório de reconhecimento da classe trabalhadora brasileira. Seu defeito é a dependência do Estado, por um lado, é certo. Mas, por outro, isso ilustra um dos passos que Getúlio deu em direção à defesa da democracia e da classe trabalhadora, em que desde o chão da fábrica, passando pelos jangadeiros cearenses que foram ao Rio falar com Getúlio, passando pelos canaviais, chegou ao centro da política e virando lei. Pela primeira vez, todos os brasileiros e brasileiras puderam ser trabalhadores, dando um passo adiante no salto civilizatório da Abolição da Escravidão. É a utopia de todos sermos iguais e com direitos, à família, ao descanso e ao trabalho, hoje definido como decente.
O movimento sindical perdeu diversas batalhas recentes, decisivas. É decisivo que reveja seus erros para não os repetir. Parte dessa derrota se deveu à incapacidade da própria Nação Brasileira integrar a juventude do Bônus Demográfico de 2012 ao projeto nacional de desenvolvimento, através do trabalho com direitos e da educação. Nossa classe dominante, diante da oportunidade única de uma geração nova em pleno século XXI, preferiu seguir o curso normal da burguesia, classe parasitária e anacrônica, rentista, exploradora. Esse caráter se expressou nos sucessivos superávits primários aplicados ao longo dos anos, comprometendo o potencial de inclusão produtiva, industrialização, educação e políticas públicas. A fome tem pressa, a juventude, também. Não falta dinheiro, ele só foi usado a conta gotas para o povo e em baldes para burguesia financista. O dinheiro não desce para a produção, mas sobe de nós para a especulação e para os oligopólios. O capitalismo não é o regime dos livres mercados, o capitalismo é o regime do imperialismo, dos oligopólios e da guerra.
Por isso, e não por qualquer outra razão, a burguesia prosseguiu no movimento inclemente de centralização financeirizada das empresas de comunicação rumo aos oligopólios, por um lado, e por outro, pelo domínio das big techs e do big data. E deram o Golpe contra a Dilma, desregularam o mercado de trabalho e o sistema financeiro. Ou seja, eles agiram para arrebentar uma geração, e estão vencendo.
O movimento sindical menosprezou a importância de atrair aqueles jovens, promovendo a renovação de suas fileiras, pautas, lideranças. O movimento estudantil tampouco tem essa ponte que o integre ao mundo do trabalho. A pirâmide invertida é a realidade na maioria dos sindicatos: direções grandes, pequena força organizada nas bases. A disputa no campo das ideias mudou completamente, com instrumentos novos, derivados da revolução tecnológica que une cibernética, big data e redes sociais, exatamente nesse ínterim. Juntou a saciedade com o empachamento, o fastio. E aquela parcela de 2/3 da população ocupada, majoritariamente de jovens, foi cortejada e ganha pelas ideias das classes dominantes, ao mesmo tempo em que se lhes negou a incorporação ao mundo do trabalho com direitos, pois esse processo aconteceu em paralelo com a destruição das possibilidades do Estado e da Economia brasileiros, no curso do golpe de Estado de 2016, iniciado precisamente nas jornadas de junho de 2013 e na Operação Lava Jato. A sociabilização pelo trabalho foi duramente golpeada, sendo substituída por um individualismo em rede (curioso) e pela teologia da prosperidade, além dos laços de solidariedade que o povo sempre teve de criar e com que devemos aprender.
Em 2013, no Brasil, a esquerda e os setores progressistas viram surgir algo inédito desde a redemocratização: a direita nas ruas, impulsionada pela mídia golpista e por uma vasta rede de mobilização pela internet e smartphones de fora e de dentro do Brasil. Mas, claro, sob o elogio da independência e da espontaneidade, só que não. E com o mesmo vírus de "contra tudo que está aí", incluindo a luta de resistência, popular, sindical e estudantil. Em política não existe espaço vazio, se não agimos, o fascismo fará o que é seu mister, seu motivo de ser, fazer que a classe trabalhadora mesma apoie a sua derrota e o poder absoluto do capital financeiro.
Foi um grave erro não ter feito a passagem geracional para a turma que chegou no novo milênio, a Turma da Xuxa, digamos assim. De um lado, a militância estudantil mais consequente e de luta. Do outro, a liberdade e o fortalecimento do mercado interno, da economia formal e do movimento sindical com as centrais sindicais. Mas ficou sozinha uma imensa parcela da juventude em 2012, que tinha de 15 a 29 anos de idade e não tinha trabalho, ou não tinha estudo, ou nem trabalho ou estudo. Nem o movimento estudantil se fundiu com os trabalhadores, nem o movimento sindical recebeu aquela geração, apesar da nossa luta pela juventude trabalhadora. Foi a união da saciedade com as conquistas de nossos movimentos, com o empachamento, o fastio de enfrentar nossos defeitos, especialmente o continuísmo, o cupulismo, a falta de renovação geracional e o machismo.
A juventude estudantil ainda se recupera da COVID 19, que parou as escolas e universidades por dois anos. Isso tudo nos deixou de costas uns para os outros, a juventude e os trabalhadores. As consequências vivemos todos os dias. Uma delas é o sequestro das pautas populares para impedir a unidade do povo, tornando bandeiras progressistas em resultados de retrocesso, em reação. É uma nova chance, e a juventude está certa em se levantar contra a superexploração do trabalho. Por isso, não vamos olhar de longe. Nós vamos pra dentro: aproveitar o debate da redução da jornada de trabalho para chamar a juventude para o diálogo em todos os níveis. A classe trabalhadora se rebela justamente contra a superexploração do trabalho. Isso é maravilhoso. E não existe movimento da classe trabalhadora, sem as suas organizações.
Essa é uma batalha decisiva. O avanço tecnológico foi completamente apropriado pela burguesia, como Marx pontuou.
A lei segundo a qual uma massa sempre crescente de meios de produção, graças ao progresso na produtividade do trabalho social, pode ser posta em movimento com um dispêndio progressivamente decrescente de força de trabalho humana — esta lei exprime-se em base capitalista, onde não é o operário que emprega os meios de trabalho, mas os meios de trabalho que empregam o operário, em que quanto mais elevada for a força produtiva do trabalho tanto maior será a pressão dos operários sobre os seus meios de ocupação, tanto mais precária, portanto, será a sua condição de existência: venda da força própria para multiplicação da riqueza alheia ou para autovalorização do capital. Crescimento mais rápido dos meios de produção, e da produtividade do trabalho, do que da população produtiva exprime-se capitalisticamente, portanto, de modo inverso: em que a população de operários cresce sempre mais rapidamente do que a necessidade de valorização do capital. Marx, setembro de 1867
O incremento exponencial da produtividade do trabalho é gritante, mas não houve a consequente paga, nem em dinheiro, nem em tempo livre. Muito ao contrário, se a informática, as redes, a IA, se tudo isso aumentou a riqueza, não aumentou o tempo livre, mas aumentou e desregulou a jornada e o mercado de trabalho.
Apoiar a PEC foi muito acertado e somos parte dessa primeira vitória, - que é ela poder seguir - mas o caminho é longo e arriscado e não se esgota na PEC. A bandeira da redução da jornada de trabalho é central para toda a classe trabalhadora, não apenas para os trabalhadores formais. Os 17 setores que custam centenas de bilhões de isenções tributárias não têm qualquer contrapartida?
Senhoras e senhores...
— ivan ☭ 🚩🇵🇸 (@ivantuita) November 16, 2024
Simplesmente, Fernando Haddad esfregando a cara da grande mídia no asfalto. 💥
👏👏👏 pic.twitter.com/aZv3vZvecf
Na categoria bancária, temos a oportunidade de ir para cima da Escala 5X1 e defender a Escala 4X3, e o home office em favor dos trabalhadores. Assim, temos muito o que fazer junto com a juventude bancária. E o mesmo vale para a juventude comerciária, professores, operária e que trabalha nas agroindústria. Esse é um grande filão dessa luta. Pautar centralmente em todas as negociações coletivas, e com força, a redução da jornada e o direito ao fim de semana de descanso é um caminho importantíssimo da luta contra a superexploração da tecnologia contra os trabalhadores, trazendo de volta a escravidão.
Outro filão incontornável é o debate sobre a superexploração de quem não tem sequer o direito à Escala 6X1. Muitos saímos das manifestações de 15/11 e tomamos um UBER. Em vários desses casos, podemos ter encontrado um trabalhador da nossa geração ou mais jovem, e ele ou ela estaria trabalhando numa jornada 7X0. Às vezes, pressionado por dívidas que crescem velozmente graças aos juros do Banco Central, esses trabalhadores vinculados a uma empresa multinacional trabalharão 12, 14 horas. Isso é possível pela junção de Deforma Trabalhista e Trabalho em Plataforma, tudo para os patrões. Mais da metade da população ocupada não tem qualquer regulação da jornada de trabalho.
Chamemos a juventude para a luta pela redução da jornada de trabalho. Organizemos de modo decidido a juventude trabalhadora, reconhecendo sua autonomia, sua liderança, sua diversidade, tudo que pode nos ensinar. Não é apenas o departamento de juventude, a a diretora de juventude, mas a juventude em nossas categorias que cumpre organizar. Cadê as plenárias da juventude trabalhadora? Bora organizar?
Não tenhamos ilusões com esse congresso, nem com as big techs, mas tenhamos sim a esperança na construção de uma Unidade Popular que tenha como base a juventude e a classe trabalhadora. Nós temos uma juventude de ouro, só precisamos apostar nela. O coração apaixonado da juventude tem sempre a nos ensinar sobre os verdadeiros motivos de nossa luta. Talvez não se tenha apostado na minha geração, mas eu vivo para que as lições que aprendi não se percam, meus compromissos de vida com a classe trabalhadora, com a juventude, a manifestação pulsante das molas mestras para a libertação do Brasil. Precisamos da valorização do trabalho. Precisamos de redução da jornada, fim da escala 6X1, 40 horas semanais, escala 4x3, precisamos unir a nossa luta.
Não haverá movimento vitorioso dos trabalhadores sem a participação das suas organizações. O sequestro de pauta é uma tática fascista exercitada com primor pelas big techs, mas nós acreditamos no coletivo, na classe, na juventude do campo e da cidade, no povo brasileiro. Tampouco haverá futuro para o movimento sindical e de juventude se não unirem suas organizações para construírem a Unidade Popular, e se não chamarem a juventude e as bases para essa luta. Vamos pra dentro, vamos pra cima, vamos unidos, construir os espaços de diálogo e ação unitária da juventude e da classe trabalhadora.
Tiozinhos e Tiazinhas (entre os quais me incluo), vamos chamar a meninada, ensinar e aprender, pois a passagem do bastão é a única forma de salvar o Brasil, a classe trabalhadora e assegurar a democracia. É nóis por nóis, desde sempre, e sempre foi para eles, a juventude, tudo que fizemos. Proletariado é isso, a força dos braços e as crias para criar, e eles crescem.
Já escrevi e repito, citando o Che: dizendo “O alicerce fundamental de nossa obra é a juventude. Nela depositamos nossa esperança e a preparamos para tomar a bandeira de nossas mãos”.
REFERÊNCIAS:
1) Juventude e desenvolvimento: uma nova agenda para um novo tempo - por Danilo Moreira (2011)
2) Karl Marx. O Capital. Crítica da Economia Política. Livro Primeiro: O processo de produção do capital. Sétima Seção: O processo de acumulação do capital. Vigésimo terceiro capítulo: A lei geral da acumulação capitalista. Diversas formas de existência da sobrepopulação relativa. A lei geral da acumulação capitalista. Disponível em Marxist Internet Archive, em O Capital: 4. Diversas formas de existência da sobrepopulação relativa. A lei geral da acumulação capitalista
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